13 Novembro 2019
‘Eu bato meta todos os dias’ é mais uma enganação liberal. Daquelas que mentem para as pessoas de que tudo é possível apenas a partir do esforço pessoal. Uma perversidade em tempos degradantes do mercado de trabalho, de informalidade e subocupação, escreve Cesar Sanson, professor da área da sociologia do trabalho, da Universidade Federal do Rio Grande do Norte – UFRN.
Eis o artigo.
É cada vez mais comum encontrar pessoas vestindo camisetas com a estampa ‘Eu bato meta todos os dias’. São, sobretudo, jovens que circulam pelas esquinas, praças e praias vendendo produtos ou serviços. No caso do litoral, pacotes turísticos.
São trabalhadores contratados por empreita diária, por algumas horas, ou apenas para o final de semana. Em sua maioria, não possuem nenhum vínculo empregatício e sequer ganham um valor diário pré-definido. A maioria ganha apenas proporcionalmente ao que consiga ‘vender’, algo como uma percentagem por produto ou serviço vendido.
‘Eu bato meta todos os dias’ que vemos nas ruas é uma versão piorada das equipes de vendas de grandes empresas. A origem vem daí, das equipes – times - de vendedores de empresas. No começo, a maioria tinha vínculo empregatício e conforme atingissem picos de venda recebiam bonificações, no melhor método produtivista taylorista.
No caso clássico do vendedor de produtos de determinada empresa, era comum receberem formação, dicas e estratégias de venda. Com o tempo, esses ‘times’ saíram do espaço das lojas e ganharam as ruas. A versão mais ‘modernizadora’ de métodos de metas, encontra-se hoje em muitos call center.
Agora, o que vemos é muito pior. A maioria vai para as ruas sem meta nenhuma. O objetivo é tentar vender o que for possível. Logo se trata de uma tapeação, não há metas a ser batida porque sequer resultados foram estipulados. É uma perversão para os tempos degradantes do mercado de trabalho, de informalidade e de subocupação.
Porém, o ‘eu bato meto todos os dias’ independente de existir ou não metas é uma ideia poderosa. A ideia liberal de que tudo depende apenas e tão somente dos seus esforços, de sua perfomance. A camiseta com as letras garrafais ‘eu bato meto todos os dias’ sobre o corpo é uma capa de um pretenso herói que em sua batalha anuncia para si e para os outros que sairá vencedor.
Não interessa se você está indo para a rua com fome, se o seu produto ou serviço é difícil de vender, se as pessoas te tratam mal, se você tem que competir com outro colega a duzentos metros de distância. Tudo isso será pulverizado se você for esforçado, se você acreditar em você mesmo. E se não der certo? Bem aí é porque você não é bom o suficiente, o problema está em você e não na capa.
‘Eu bato meta todos os dias’ é mais uma enganação liberal. Daquelas que mentem para as pessoas de que tudo é possível apenas a partir do esforço pessoal. Uma perversidade em tempos de desemprego violento, de degradação das condições de trabalho e da ideia mentirosa que o problema da sua condição social está em você e não na sociedade.
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