01 Outubro 2025
"Algo que une arte e ciência, contra qualquer pretensão normativa de autonomia, e que talvez poderia ajudar a tirar a política do abismo em que caiu?", escreve Alberto Leiss, jornalista, em artigo publicado por Il Manifesto, 30-09-2025. A tradução é de Luisa Rabolini.
Eis o artigo.
As férias há muito planejadas em Creta chegam em um momento em que é difícil se entregar a qualquer ausência consoladora dos múltiplos contextos emocionais, afetivos e políticos.
De repente, no fantástico mar azul, apareceram barcos no porto. Não eram velejadores mais ou menos abastados em busca de praias acolhedoras e fundos marinhos encantados. Eram um grupo de barcos de ativistas prestes a se juntar à Flotilha Global Sumud.
Aconteça o que acontecer nas próximas horas — leio que entre amanhã e depois de amanhã, quinta-feira, poderia ser alcançado o ponto de encontro com o bloqueio israelense—, já é um tremendo resultado a contribuição que deu a decisão e a capacidade de formar essa frota internacional (internacionalista?) e pacifista ao se multiplicar, quase em todo o mundo, de uma ampla reação popular ao horror da violência desencadeada pelo governo de Netanyahu em Gaza. E acredito que o mesmo possa ser dito das absurdas carnificinas em curso em tantas outras guerras, da Ucrânia ao Sudão, para citar apenas duas das mais sangrentas.
Como velho genovês, fique sabendo com emoção da convergência para a minha cidade de portuários de outras capitais europeias para impedir, junto com os "estivadores" do porto da Ligúria, a partida de navios com cargas militares com destino a Israel. Reações semelhantes ocorreram em Trieste e Ravena. E o movimento, especialmente juvenil e sindical, mas não só, que despontou em 22 de setembro passado, continua inabalável. Quantas vezes nos questionamos sobre a insatisfatória reação às escolhas bélicas que se multiplicam, à linguagem militarizada que permeia as mídias e a política? Agora parece que pelo menos algumas áreas da informação mainstream e até mesmo setores dos governos e dos partidos políticos, não apenas aqueles de oposição aqui na Itália, entendem que existe uma ativação muito forte da opinião pública e que não convém ignorá-la.
Mas não nego minha preocupação com o que poderia acontecer quando os barcos a vela se encontrarem diante de navios de guerra e de outras armas mortíferas. Acredito que foi correto não aceitar as propostas de compromisso que surgiram nos últimos dias, incluindo um apelo significativo do Presidente Mattarella. No entanto, não posso deixar de me perguntar até que ponto é justo arriscar a própria vida, mesmo para travar coerentemente uma batalha justíssima.
Talvez até possa ser errado levantar essa pergunta por qualquer um que não faça diretamente parte na partida iniciada pela Flotilha. A escolha de quem está a bordo daquelas embarcações será aquela justa.
Só posso fantasiar que será encontrada uma alternativa de última hora, simbolicamente tão poderosa quanto o desafio direto contra uma proibição ilegal, contra um poder tão forte quanto cego. Não recuar, mas não se deixar encontrar onde o adversário te aguarda? Uma espécie de razão alternativa pronta a desmarcar o adversário?
Talvez seja a sugestão de uma leitura e releitura — graças às férias — de um antigo ensaio de um autor amado na juventude, Paul Feyerabend: sua crítica anárquica à pretensa indiscutibilidade do "método científico" empírico, ou da verdade religiosa das Escrituras no protestantismo. E o uso dos recursos da pesquisa e da expressão artística para criar aquelas alternativas indispensáveis, no confronto das ideias, à escolha dos caminhos mais eficazes. Caminhos para "a melhoria de toda a humanidade", uma "melhoria das condições materiais, bem como da subjetividade do ser humano".
Algo que une arte e ciência, contra qualquer pretensão normativa de autonomia, e que talvez poderia ajudar a tirar a política do abismo em que caiu? (Paul K. Feyerabend, Contro l’autonomia. Il cammino comune delle scienze e delle arti. Mimesis, 201).
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