06 Junho 2025
Entre os inúmeros problemas no licenciamento do poço de petróleo que a Petrobras quer perfurar no bloco FZA-M-59, na foz do Amazonas, está a falta de consulta livre, prévia e informada a Comunidades Tradicionais. A consulta foi estabelecida pela Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), da qual o Brasil é signatário, mas a petroleira ignorou o procedimento. No entanto, são esses povos que já sofrem os efeitos da exploração de petróleo na região, mesmo antes dela ser autorizada.
A reportagem é publicada por ClimaInfo, 05-06-2025.
O Território Quilombola de Kulumbu do Patuazinho, em Oiapoque (AP), cidade que será a base das atividades da Petrobras no bloco 59, foi alvo de invasores no último fim de semana. Os moradores denunciaram a derrubada de árvores com motosserras e a destruição de Áreas Sagradas, além do avanço da degradação ambiental em suas terras, detalha O Globo.
A comunidade de Patuazinho possui certificação da Fundação Cultural Palmares desde 2010 e está em processo de titulação junto ao INCRA. No entanto, invasões têm sido recorrentes. O agravamento das invasões está relacionado à crescente especulação imobiliária provocada pela expectativa de exploração de petróleo no litoral do Amapá, avalia a Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (CONAQ).
A situação fez com que Comunidades Quilombolas do Amapá recorressem à Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) em busca de apoio contra a exploração de petróleo na Margem Equatorial, que inclui a foz do Amazonas e outras quatro bacias na costa das regiões Norte e Nordeste. Na representação, pediram a suspensão do licenciamento do bloco 59 até que sejam consultados.
Em outra frente, a Campanha Mar de Luta lançou a “Carta dos Pescadores e Pescadoras Atingidos pelo Petróleo”. Um posicionamento contundente que denuncia os riscos da exploração de petróleo na foz do Amazonas e em toda a Margem Equatorial, informam Combate Racismo Ambiental e CPP.
Assinada por lideranças comunitárias, pescadores, agentes pastorais, pesquisadores e defensores dos Direitos Humanos e da Natureza, a carta é um marco de resistência frente ao avanço do licenciamento do bloco 59 e à tentativa de consolidar a região amazônica como uma nova fronteira petrolífera, como pretende o próximo leilão da Agência Nacional do Petróleo (ANP), marcado para 17 de junho, que ofertará 47 blocos na foz do Amazonas. Sem falar na insistência do presidente Lula em explorar mais combustíveis fósseis no país com a duvidosa desculpa de “desenvolvimento”.
“Enquanto Povos e Comunidades Tradicionais seguem alertando para os riscos e os impactos que já enfrentam em seus territórios, o governo insiste em promover um discurso de desenvolvimento que desconsidera a realidade dos povos das águas. A tentativa recente de substituir o nome ‘Foz do Amazonas’, carregado de força simbólica e ligação direta com a Amazônia, por ‘Margem Equatorial’, não é apenas uma manobra de jogo de palavras e marqueteira. Trata-se de uma estratégia política deliberada para diluir a importância ecológica, cultural e simbólica de uma das regiões mais biodiversas do planeta, e assim afastar o olhar crítico da sociedade brasileira e da comunidade internacional sobre o que está em curso: a abertura de uma nova fronteira de exploração petrolífera em pleno território amazônico”, destaca a carta.
A Associação Nacional dos Petroleiros Acionistas Minoritários da Petrobras (ANAPETRO) também assina a ação judicial da Federação Única dos Petroleiros (FUP) e sindicatos filiados que pede a retirada dos 47 blocos da foz do Amazonas do leilão que a ANP pretende realizar dia 17 de junho, informam Valor e Monitor Mercantil. A ação destaca que, além de ferir o interesse público, a soberania energética e o patrimônio nacional, o leilão ocorre sem as mínimas garantias ambientais nem consulta às Comunidades Tradicionais, o que viola a Convenção 169 da OIT. E que o certame desrespeita pareceres técnicos do Ibama e recomendações do Ministério Público Federal.
A tríade segurança energética, desenvolvimento e exploração de petróleo na foz do Amazonas carece de avaliações fundamentadas em critérios técnicos e evidências que a sustentem, aponta Alessandra Cardoso, assessora política do Instituto de Estudos Socioeconômicos (INESC). “As decisões nacionais de ampliar a produção e a exportação [de petróleo] serão cobradas na conta global de emissões de carbono. Mas o atual governo se esquiva desse debate tentando justificar, de forma frágil, a expansão da fronteira de exploração em nome da segurança energética nacional. Perdemos, assim, a oportunidade de, como país anfitrião da COP30, liderar pelo exemplo no cenário multilateral, promovendo um debate de alto nível que represente um marco de maturidade para o chamado ‘Direito ao Desenvolvimento’, que precisa evoluir rapidamente para o debate acerca de que desenvolvimento precisamos diante da emergência climática global”, argumenta no Valor.