02 Junho 2025
"Marina venceu com a solidariedade que recebeu pelo pais afora, mas os três senadores Amazônicos também venceram. E lá na Amazônia, são eles que escolhem a música", escreve José Luis Fevereiro, economista formado pela UFRJ e membro da Direção Nacional do PSOL desde 2007, em comentário publicado no Facebook, 30-05-2025.
O Brasil assistiu estarrecido o deplorável espetáculo protagonizado por três senadores da região Amazônica contra Marina Silva. Baixaria, machismo toxico, negacionismo climático, ofensas ostensivas.
Não lembro de ter visto uma reação tão extensa e contundente como a rede de solidariedade que se formou em defesa de Marina. Não obstante, os 3 senadores alcançaram seus objetivos. Infelizmente a agenda ambiental não é popular na região Amazônica. É a região mais pobre do país e ainda é prevalecente a ideia de que o progresso e a luta contra a pobreza passam pela predação ambiental. Não é à toa que Bolsonaro venceu em todo o arco de devastação ambiental amazônico: Acre, Rondônia, sul do Pará e a sua maior vitória, com 74% dos votos em Roraima.
Em Roraima a principal atividade econômica é o garimpo ilegal. Ocupando estimadas 30 mil pessoas em 2022 só na Terra Yanomami, envolvendo muito mais gente na cadeia de suprimentos e investindo seus lucros no mercado imobiliário de Boa Vista, as promessas cumpridas de Bolsonaro de "tirar a Funai e o IBAMA das costas de vocês" são populares. No Acre, criar 30 cabeças de gado na reserva extrativista Chico Mendes rende mais que a coleta da castanha e a seringa.
Lula ainda venceu no Pará e no Amazonas e praticamente empatou a eleição no Amapá. Mas com a polêmica sobre a prospecção de petróleo na Bacia da Foz do Amazonas dificilmente repetirá o resultado.
Omar Azziz é candidato ao governo do Amazonas contra o bloco bolsonarista ligado ao governador Wilson Lima. Para as suas pretensões, quanto maior seu antagonismo público com Marina Silva, melhor. No Amazonas a eleição será disputada por duas frentes de predadores ambientais. A esquerda é muito frágil, embora Lula tenha peso. No Amapá ninguém tem coragem de se contrapor à exploração de petróleo na margem equatorial. O senador Randolfe Rodrigues líder do governo no Senado, saiu da Rede no dia que o IBAMA anunciou a rejeição à licença de exploração exigindo novos estudos de impacto. Randolfe também quis se distanciar de Marina. Na sua declaração de solidariedade à ministra esta semana, o que mais chamou a atenção foi a ressalva de que discorda de Marina. Afinal, ele tem um mandato a disputar em 2026.
Não é barato e demanda tempo transformar a economia da região para a lógica de que a floresta em pé rende mais riqueza que a sua derrubada. Seria justo que uma decisão do Brasil de abrir mão de explorar petróleo na Margem Equatorial fosse recompensada por fundos dos países ricos do Norte Global que construíram sua riqueza predando seus próprios biomas e os nossos. Não vivemos exatamente numa conjuntura onde isso pareça fácil, com Trump presidindo os EUA e os governos da União Europeia pressionados por oposições neo fascistas ambientalmente negacionistas.
A onda de indignação centrada nas metrópoles do Sul e Sudeste não comove as elites predadoras do Norte nem suas representações políticas. E na falta de um projeto amplo, rápido, de fácil percepção social que viabilize uma nova economia baseada na preservação, a maioria das classes trabalhadoras amazônicas seguirão apoiando a lógica da predação ambiental das suas elites porque até as migalhas que caem da mesa dos poderosos serão mais tentadoras que o discurso abstrato das potenciais riquezas da biodiversidade. Esse projeto não existe, as universidades públicas que deveriam ser protagonistas nisso sequer recebem recursos suficientes para pagar a conta de luz.
Sou solidário a Marina, sou contrário a produzir petróleo na margem equatorial, mas esse barco já partiu. Sem um projeto econômico alternativo para a região que demandará recursos e tempo, a batalha está perdida. Alguns argumentam que os lucros do petróleo da região podem financiar a transição energética e um novo modelo econômico. Com 42% das ações da Petrobras em mãos estrangeiras, mais de 65% em mãos privadas, com a atomização da distribuição de royalties e participações pelas prefeituras, só acredita nisso quem quer ou quem não conhece o Estado do Rio de Janeiro onde o Petróleo da Bacia de Campos despejou recursos no estado e nos municípios sem alterar efetivamente a realidade estrutural do estado.
Marina venceu com a solidariedade que recebeu pelo pais afora, mas os 3 senadores Amazônicos também venceram. E lá são eles que escolhem a música.