30 Mai 2025
Do governo Bolsonaro no Brasil ao partido Alternativa para a Alemanha (AfD), passando por Viktor Orbán na Hungria e movimentos similares nos Estados Unidos, a estratégia é a mesma: deslegitimar a produção acadêmica independente e transformar as instituições de ensino superior em aparelhos ideológicos.
O artigo é de Henrique Cortez, jornalista, ambientalista e editor do portal EcoDebate, publicado por EcoDebate, 30-05-2025.
O ataque às universidades não é casual nem espontâneo. Faz parte de um projeto político deliberado da extrema-direita internacional, que identifica nas instituições acadêmicas um obstáculo aos seus projetos autoritários.
Universidades produzem conhecimento baseado em evidências, formam pensadores críticos e servem como espaços de debate plural – tudo isso incompatível com o discurso populista e autoritário que caracteriza esses movimentos.
Na Hungria, Orbán fechou a Universidade Centro Europeia e restringiu drasticamente os estudos de gênero. Nos Estados Unidos, governadores republicanos de extrema-direita têm promovido leis que proíbem discussões sobre diversidade racial nas universidades públicas.
No Brasil, durante o governo Bolsonaro, vimos cortes brutais no orçamento das universidades federais, ataques diretos à autonomia universitária e a perseguição sistemática a pesquisadores.
Os cortes orçamentários promovidos por governos de extrema-direita não são medidas de austeridade, mas instrumentos de controle político.
O congelamento de recursos e a ameaça constante de cortes são utilizados para forçar universidades a adequarem suas práticas a agendas políticas específicas.
Quando a extrema-direita condiciona o financiamento da pesquisa científica ao alinhamento ideológico, está atacando a essência da produção acadêmica independente.
Partidos de extrema-direita promovem sistematicamente a desconfiança na ciência e na expertise acadêmica. Seja negando as mudanças climáticas, questionando a eficácia de vacinas ou atacando pesquisas sobre desigualdades sociais, esses movimentos constroem uma narrativa anti-intelectual que visa deslegitimar qualquer conhecimento que contradiga suas pautas políticas.
No Brasil, vimos isso claramente durante a pandemia, quando a extrema-direita atacou sistematicamente as universidades que produziam pesquisas sobre a Covid-19, os institutos que defendiam medidas sanitárias e os cientistas que contradiziam o negacionismo oficial.
A extrema-direita mundial tem promovido tentativas sistemáticas de controlar o que se ensina nas universidades. Nos Estados Unidos, legisladores republicanos têm aprovado leis que proíbem discussões sobre racismo estrutural. Na Polônia, o governo de extrema-direita restringiu os estudos de gênero.
No Brasil, projetos como o “Escola sem Partido” visavam censurar debates sobre diversidade e direitos humanos.
Essa interferência direta no currículo acadêmico representa uma violação fundamental da autonomia universitária e um ataque direto à liberdade de cátedra.
Políticos de extrema-direita em todo o mundo utilizam o mesmo discurso para atacar as universidades: a teoria conspiratória do “marxismo cultural” ou “doutrinação esquerdista”.
Essa narrativa, que retrata as universidades como centros de propaganda ideológica, serve para justificar ataques à autonomia acadêmica e à liberdade de pesquisa.
No Brasil, essa retórica foi amplamente utilizada durante o governo Bolsonaro, que chegou a propor a filmagem de aulas universitárias para “combater a doutrinação”.
Trata-se de uma estratégia internacional da extrema-direita para deslegitimar o conhecimento acadêmico independente.
Governos e movimentos de extrema-direita promovem sistematicamente a intimidação de professores, pesquisadores e estudantes.
No Brasil, durante o governo Bolsonaro, docentes foram perseguidos por suas pesquisas, estudantes foram vigiados e denunciados, e o próprio debate acadêmico ficou comprometido pelo clima de medo.
Essa estratégia de intimidação é comum a todos os movimentos de extrema-direita: criar um ambiente de medo que iniba a produção acadêmica crítica e o debate plural.
A extrema-direita promove uma visão estreitamente utilitária da educação superior, defendendo que as universidades devem se concentrar exclusivamente em programas “práticos” voltados aos interesses do mercado.
Essa perspectiva ignora o papel fundamental das universidades na produção de conhecimento básico, na formação de pensadores críticos e na preservação cultural.
Mais importante: essa visão serve aos interesses autoritários, pois universidades focadas apenas na formação técnica são menos propensas a questionar o poder político. E econômico
A defesa das universidades é, fundamentalmente, a defesa da democracia. Universidades livres e autônomas são incompatíveis com projetos autoritários, razão pela qual a extrema-direita as ataca sistematicamente.
É fundamental que a sociedade brasileira compreenda que os ataques às universidades não são uma questão setorial, mas parte de um projeto político mais amplo de enfraquecimento das instituições democráticas.
A experiência internacional mostra que países onde a extrema-direita conseguiu subordinar as universidades aos seus interesses políticos experimentaram um rápido processo de deterioração democrática.
O momento exige que todos os setores democráticos da sociedade se mobilizem em defesa das universidades públicas. Não se trata de defender privilégios corporativos, mas de proteger instituições fundamentais para a manutenção da democracia.
A autonomia universitária não é um luxo acadêmico, mas uma necessidade democrática. Quando a extrema-direita ataca as universidades, está atacando a própria capacidade da sociedade de produzir conhecimento independente e formar cidadãos críticos.