27 Mai 2025
"Recuperar a estrutura processual do sacramento, devolver à elaboração da pena o seu próprio espaço intransponível e reabrir o diálogo com a longa tradição do sacramento beneficiaria a discussão sobre a obrigação do segredo. Assim como a abertura ao 'terceiro rito', felizmente experimentado durante a Covid, seria benéfica", escreve Lorenzo Prezzi, teólogo italiano e padre dehoniano, em artigo publicado por Settimana News, 26-05-2025.
A questão do segredo a que está obrigado o confessor volta a inquietar as consciências dos fiéis e dos legisladores. Após o discurso da Comissão Real, alguns estados australianos deslegitimaram o sigilo da confissão diante da emergência do abuso infantil. O debate foi aberto na Irlanda, França e Espanha.
Alguns estados dos EUA tentaram legislar sobre o assunto. A legislação sobre essa questão chegou à legislatura estadual em Washington. No início de maio, foi aprovado o projeto de lei 5.375, que prevê a ausência de reconhecimento legal do segredo sacramental. Aprovado por 64 votos a 31, o texto, segundo seu proponente, o democrata Bob Ferguson, pretende proteger em primeiro lugar as crianças e, de forma mais geral, toda a cidadania.
A controvérsia surgiu imediatamente. Reconhece-se na lei uma contradição intolerável porque, ao mesmo tempo que garante o sigilo a outras figuras profissionais, nega-o aos sacerdotes católicos, únicas figuras eclesiásticas que estão vinculadas ao dever de silêncio no contexto das religiões.
Segundo, a lei violaria um artigo fundamental da Constituição dos EUA que garante a liberdade de religião. Há uma longa tradição jurídica a esse respeito que remonta a 1813. O Departamento de Justiça federal já expressou sua preocupação, e Harmeet Dhillon, procurador-geral assistente de direitos civis da agência federal, fala de um "conflito direto com o livre exercício de uma religião estabelecida".
A reação dos bispos das dioceses envolvidas foi preocupada e dura. Dom Paul Etienne observou: “O clero católico não pode violar o segredo do confessionário, sob pena de excomunhão da Igreja […] Todos os católicos devem saber e ter certeza de que suas confissões permanecem sagradas, seguras, confidenciais e protegidas pela lei da Igreja”.
O bispo de Spokane, dom Thomas Daly, também compartilhou a mesma conclusão com outros bispos do estado.
Os hierarcas ressaltam que desde o início do século a Igreja Católica impôs normas severas para proteger crianças e jovens que frequentam paróquias, que os párocos têm a obrigação de denunciar quando sabem de abusos fora da confissão, que todos os agentes pastorais e ambientes educativos têm protocolos rígidos, que as denúncias diminuíram nessas duas décadas e que, na prática, os casos de confissões de abusadores são muito raros. Entretanto, há sempre a indicação de que o pecador abusador deve se entregar à justiça civil.
De Roma a indicação é decisiva e ancorada no direito e na teologia. Em 2021, o Cardeal Piacenza, então penitenciário-mor, recordava que "o segredo da confissão não é uma obrigação imposta de fora, mas uma exigência intrínseca do sacramento e, como tal, não pode ser dissolvido nem mesmo pelo próprio penitente. O penitente não fala com o confessor humano, mas com Deus. Portanto, tomar posse do que pertence a Deus seria um sacrilégio".
No campo, as soluções práticas para a norma são diferentes.
No caso australiano, alguns padres disseram que estavam desistindo de celebrar a confissão para não se verem em uma situação difícil. Outros se propuseram a condicionar a absolvição à repetição da admissão de culpa fora da confissão, de modo a ficarem isentos da obrigação de silêncio.
Algumas questões também são colocadas à Igreja pela Comissão Francesa (Ciase), criada pelos bispos que levantaram a questão do abuso. Na recomendação n.º 8 que acompanha o substancial dossiê convida as autoridades eclesiásticas a garantir aos confessores e aos fiéis que "o segredo da confissão não pode derrogar a obrigação prevista pelo código penal e em conformidade, segundo a comissão, com o imperativo do direito natural de proteger a vida e a dignidade da pessoa, de denunciar às autoridades judiciais e administrativas os casos de violência sexual contra menores ou pessoas vulneráveis".
Questionada sobre isso, a Irmã Véronique Margron, presidente dos religiosos da França, nos disse que a questão não é esconder um segredo, mas evitar um crime: "Trata-se de um perigo iminente, portanto diferente do caso da confissão de um adulto de violência sofrida na infância. Além disso, uma criança que conta a um padre na confissão que seu pai — ou um padre — a machucou não está confessando um pecado, mas está fazendo uma confidência terrível. Consequentemente, do ponto de vista moral, a questão do segredo não se coloca, pois não se trata do pecado da criança, mas do crime de um adulto contra ela. Em casos como este e somente em relação a uma situação de perigo iminente, creio que hoje na França todos concordam em afirmar que a proteção da criança em perigo é primordial".
Quanto à questão do segredo, é bom alargar o nosso olhar para abranger todo o sacramento da confissão. Há mais a ser salvo do que um segredo, mas o próprio sacramento.
Sua compressão em um contexto judicial e canônico retirou a dimensão do processo da confissão, reduzindo-a a um evento único. Reduzir o sacramento à simples soma de confissão e absolvição significa ignorar o "espaço de elaboração da dor do coração, de expressão e de 'trabalho sobre o corpo' que hoje se resolve facilmente com o carácter absoluto de uma palavra de absolvição" (A. Grillo).
Recuperar a estrutura processual do sacramento, devolver à elaboração da pena o seu próprio espaço intransponível e reabrir o diálogo com a longa tradição do sacramento beneficiaria a discussão sobre a obrigação do segredo. Assim como a abertura ao “terceiro rito”, felizmente experimentado durante a Covid, seria benéfica. Independentemente das possíveis limitações, "onde quer que tenha sido implementado registrou – não sem surpresa – um eco significativo. Recebeu uma ampla resposta dos fiéis, uma participação consciente e uma resposta marcada pela gratidão. Entre os crentes surgiu uma necessidade de reconciliação, um desejo de perdão e uma exigência de comunidades mais amplas do que o acesso limitado à confissão individual sugeriria".