24 Mai 2025
"Negar a um ser humano o fato de ter pertencido à história e, portanto, de ter vivido, parece-me um dos crimes mais atrozes de que somos capazes. E para as vítimas, se elas se deram conta, um sofrimento insuportável", escreve Anne Soupa, biblista, em artigo publicado por Garrigues et Sentiers, 21-05-2025. A tradução é de Luisa Rabolini.
Haveria tantas coisas para falar neste mês! Falar do Papa, de Francisco que nos deixou e de Leão que o sucedeu, evocar o 1.700º aniversário do Concílio de Niceia, em 20 de maio, que nos deu o Credo, aquela oração proclamada durante a missa, hoje objeto de discussão... Sim, gostaria de falar sobre tudo isso, e sem dúvida o farei em breve.
Mas hoje eu gostaria de levá-los “para outro lugar”, onde ninguém está indo neste momento. De fato, diante da atual exaltação de "pessoas fora do comum" e celebridades, duradouras ou efêmeras, diante do culto do eu que Trump impõe ao mundo todos os dias, talvez eu tenha me sentido levada, como por um pêndulo interior, para o oposto do que nossa sociedade muitas vezes, de forma irracional, coloca em evidência: todos aqueles que foram apagados da história e dos quais nunca soubemos nada.
É preciso dizer que a atual celebração do 80º aniversário da libertação dos campos de extermínio me incentivou a esse trabalho de memória. Famílias e associações judaicas estão fazendo o seu melhor para preservar a memória de seus entes queridos, e isso é necessário e positivo. Necessário porque esses 6 milhões de pessoas existiram, encontraram uma morte atroz por causa da loucura de uma pessoa e dos muitos que a seguiram, não tiveram sepultura e correm o risco de desaparecer uma segunda vez por causa da privação da memória. Positivo porque o trabalho das associações judaicas é valioso. Traz esses homens, mulheres e crianças de volta ao centro da história mundial, ao nosso patrimônio comum, aquilo que nos torna o que somos. Todos eles — e nós com eles — sofreram uma exclusão insuportável. Suas mortes amputaram a humanidade.
Mas essa tragédia da exclusão não é a única na história. Houve inúmeras outras, tanto individuais quanto coletivas. Entre elas, posso identificar duas categorias.
A primeira é daqueles que morreram sozinhos, mas cuja memória sobreviveu. Aqueles que morreram em circunstâncias trágicas, vítimas dos Gulags, de Pol Pot ou do Covid, que desapareceram no mar ou nas montanhas, que foram atingidos pela lava em Pompéia ou arrastados por um terremoto...
Nenhuma mão para segurar suas mãos, nenhum diálogo, nenhuma relação... Intenso sentimento de abandono pelos desaparecidos, intenso sentimento de culpa pelos sobreviventes... Podemos ver que o que faltava era a relação. E a relação é a vida. Mesmo que não sejam exatamente os esquecidos absolutos de que quero falar, em parte eles o são, porque sua morte terá deixado aquela sensação de esquecimento tão difícil de dissipar. Para seus entes queridos, o luto é mais difícil e o trabalho de lembrá-los mais frágil. Compreendo o desejo expresso por Paul Ricoeur ao falar de sua morte iminente, de ter uma mão amiga ao seu lado!
Mas há outro tipo de tragédias que são mais difíceis de tornar presentes. São aquelas que os olhos nunca viram, que os ouvidos nunca ouviram, aquelas em que nem mesmo a memória foi possível. Nessas circunstâncias, toda a existência de uma ou mais pessoas afunda no mais absoluto esquecimento.
Dessa forma, civilizações morreram sem que soubéssemos de nada, escritores foram queimados na fogueira, líderes talentosos com projetos que teriam sido úteis ao mundo ou que defenderam causas de todos os tipos, perigosas para o poder, pessoas que queriam ser livres ou mostrar solidariedade com o próximo maltratado, foram perseguidas.
Para que se calassem, para que fossem apagadas da memória dos vivos. Negar a um ser humano o fato de ter pertencido à história e, portanto, de ter vivido, parece-me um dos crimes mais atrozes de que somos capazes. E para as vítimas, se elas se deram conta, um sofrimento insuportável. Às vezes, o cancelamento da memória coletiva pode ter sido resultado do acaso, do azar ou do ódio pessoal, outras vezes foi tão banal a ponto de envergonhar aqueles que cometeram tal crime.
Como nos comportamos em relação a esses esquecidos da história, relativos ou absolutos? Dois exemplos me ocorrem. O primeiro é o do coletivo "Les morts de la rue" (Os mortos da rua). Ao devolver seus nomes aos mortos da rua e escrever sobre eles nos jornais que os publicam regularmente, eles os "salvam do esquecimento". Dessa forma, sua história se reflete no simples ato de lhes dar um nome.
O outro exemplo mostra a dificuldade que todos enfrentamos para "tornar viva” essa memória esquecida. Uma história longa e muito francesa levou à criação de um lugar de memória para o soldado desconhecido após a guerra de 1914-18. Tudo começou em 1916 com um pedido do presidente do Souvenir Français, uma associação nascida após a guerra de 1870 para depositar flores nos túmulos daqueles que haviam "morrido pela França". Ele queria que um combatente desconhecido entrasse no Panteão. No final, em 1920, o Parlamento votou que o local deveria ser sob o Arco do Triunfo.
Esses dois exemplos nos mostram que a motivação dominante da causa estava em outro lugar. O termo "desconhecido" é secundário em relação ao de "soldados mortos", assim como "mortos" é secundário ao "da rua". Relutamos em encarar o caráter absoluto do cancelamento. Os historiadores frequentemente enfrentam esses problemas. Conseguiram se acostumar com a ideia de que a história que nos chega é sempre parcial e infiel. Sim, o esquecimento pode ser total e, portanto, insuperável; nunca saberemos... E como cada um de nós pode enfrentar a realidade do esquecimento? É claro que podemos nos convencer da realidade dessas vidas vividas e esquecidas, e nos sentir em dívida com elas, não por dívida, mas pela convicção de uma perda. É claro que podemos deixar páginas em branco em nossas mentes, um pouco como o prato para o pobre nas mesas de antigamente... "Não sem o outro", dizia Michel de Certeau. O outro de hoje, mas também o outro de ontem.
Mas uma pergunta permanece: para onde vão essas pessoas esquecidas? Minha resposta não lhes surpreenderá: vem de Deus, pela voz do profeta Isaías: "Não me esquecerei de ti (...). Eis que te gravei nas palmas das minhas mãos" (Is 49,15-16). Sim, os esquecidos da história estão em Deus, acolhidos como o Bom Ladrão, e é diante da Cruz que os honramos.
Jesus, cuja primeira e mais forte luta foi a recusa da exclusão, morreu como pária, como rejeitado. Se José de Arimateia e Nicodemos não tivessem ido a Pilatos pedir seu corpo para sepultá-lo – para manter viva sua memória – e se o Pai não o tivesse tirado do sepulcro, Jesus poderia ter sido um dos excluídos de que estamos falando.
É um dos aspectos da fé na Ressurreição a que raramente prestamos atenção: reintegra, abole toda exclusão e reconstitui o corpo da humanidade quebrada.
Se é justamente no crer que podemos considerar todos aqueles que foram esquecidos pela história, isso não significa que a questão termine aí. A Cruz é uma provocação para o hoje; ela nos impele a não excluir, nos impele ao dever de nos relacionar, no espaço como no tempo. Esse é um dos fundamentos do cristianismo.