A leitura que a Igreja propõe neste domingo é o Evangelho de Jesus Cristo segundo Evangelho de João 14,23-29, que corresponde ao 6º Domingo de Páscoa, ciclo C do Ano Litúrgico. O comentário é elaborado por Ana Maria Casarotti, Missionária de Cristo Ressuscitado.
Naquele tempo, disse Jesus a seus discípulos: "Se alguém me ama, guardará a minha palavra, e o meu Pai o amará, e nós viremos e faremos nele a nossa morada. Quem não me ama, não guarda a minha palavra. E a palavra que escutais não é minha, mas do Pai que me enviou. Isso é o que vos disse enquanto estava convosco. Mas o Defensor, o Espírito Santo, que o Pai enviará em meu nome, ele vos ensinará tudo e vos recordará tudo o que eu vos tenho dito. Deixo-vos a paz, a minha paz vos dou; mas não a dou como o mundo. Não se perturbe nem se intimide o vosso coração. Ouvistes que eu vos disse: 'Vou, mas voltarei a vós`. Se me amásseis, ficaríeis alegres porque vou para o Pai, pois o Pai é maior do que eu. Disse-vos isto, agora, antes que aconteça, para que, quando acontecer, vós acrediteis.
Celebramos o 6º Domingo do Tempo Pascal com este texto do Evangelho de João, no qual Jesus nos diz claramente: “Se alguém me ama, guardará a minha palavra, e o meu Pai o amará, e nós viremos e faremos nele a nossa morada”. Nessa frase, encontramos o centro de nossa fé cristã: Deus se torna presente em meio à comunidade reunida no amor fraterno e guiada por sua Palavra. Esse é o grande legado que Jesus deixa para a comunidade que deseja segui-lo: o amor mútuo, como ele o demonstrou no serviço fraterno e no amor a ele, que se expressa em “guardar a sua Palavra”.
Uma palavra que vai além dos textos escritos em um livro, ou dos modos de vida e ação moral, social e religiosa. Guardar sua palavra é acolher sua vida em nossa vida pessoal e comunitária. Jesus não oferece um caminho seguro e já trilhado, mas nos convida a acolher sua palavra dia a dia, nas diversas situações em que cada comunidade se encontra. Essa realidade traz consigo o desafio de tornar presente a novidade de sua Palavra, tanto pessoal quanto comunitariamente, levando em conta a diversidade de lugares onde estamos presentes.
Jesus reforça o convite para amá-lo: um amor que é expresso pelo cumprimento de sua palavra. É um amor pessoal e, ao mesmo tempo, um amor compartilhado. O Evangelho de João estava nos transmitindo as palavras de Jesus que meditamos durante este período de Páscoa: o amor de Maria que unge Jesus com o perfume de nardo puro muito caro, o amor como serviço mútuo, amando uns aos outros “como Ele nos amou” e assim Jesus estava revelando esse amor, com gestos e palavras.
Suas palavras não são frases isoladas ou textos que são deixados abertos a interpretações aleatórias. Sua palavra se reflete em sua vida e em suas ações, portanto, cumprir sua palavra é viver e agir como ele agiu, movido, antes de tudo, pelo amor. Em meio a essa comunidade, onde o amor reina como serviço e doação mútua, o amor do Pai está presente e faz sua morada.
E a palavra que escutais não é minha, mas do Pai que me enviou. Isso é o que vos disse enquanto estava convosco. Mas o Defensor, o Espírito Santo, que o Pai enviará em meu nome, ele vos ensinará tudo e vos recordará tudo o que eu vos tenho dito.
Jesus descreve que a palavra para amar e guardar vem do Pai, aludindo assim à sua presença em nosso meio. Em meio à perplexidade de uma comunidade que estava ciente da rejeição e do ódio que as atitudes e as palavras de Jesus geravam, especialmente entre os judeus - fariseus e doutores da lei -, Jesus promete a presença do Espírito Santo como o mestre, a presença viva de sua palavra em nosso meio e, fundamentalmente, aquele que nos dá a sua paz: Deixo-vos a paz, a minha paz vos dou; mas não a dou como o mundo. Não se perturbe nem se intimide o vosso coração.
Nesses dias, recebemos o novo Papa Leão XIV que, desde o início, tornou presentes as palavras de Jesus: “A paz esteja com todos vocês. Caríssimos irmãos e irmãs, esta é a primeira saudação de Cristo ressuscitado, o Bom Pastor que deu a vida pelo rebanho de Deus. Eu também gostaria que esta saudação de paz entrasse em seus corações, alcançasse suas famílias e todos os povos da Terra. A paz esteja com vocês”. Primeiro discurso de Prevost, Papa Leão XIV: "O mal não prevalecerá, construamos pontes de paz". Ele também disse aos jornalistas reunidos após o conclave que “bem-aventurados que trabalham pela paz” e continuou dizendo: “A paz começa dentro de cada um de nós, na maneira como nos olhamos, na maneira como falamos uns dos outros. A maneira como nos comunicamos é de fundamental importância. Devemos dizer não à guerra das palavras, das imagens; devemos rejeitar o paradigma da guerra. "Leão XIV aos jornalistas: "Desarmemos a comunicação de todo preconceito, ressentimento, fanatismo e ódio, purifiquemo-la"
A Igreja é a portadora dessa paz que Jesus deu às primeiras comunidades. Em primeiro lugar, recebê-la e permitir que sejamos transformados por ela, e também denunciar tudo o que a ameaça. É a paz daqueles que não permitem a violência, a guerra, a discriminação, o desprezo. Não é a paz dos cemitérios, é uma paz inquieta que brota do Espírito e que leva à construção de pontes, como diz Leão XIV.
Neste tempo de pascoa façamos nossa a oração de Pedro Casaldáliga
Dá-nos, Senhor aquela Paz inquieta que denuncia
a Paz dos cemitérios e a Paz dos lucros fartos.
Dá-nos a Paz que luta pela Paz!
A Paz que nos sacode com a urgência do Reino.
A Paz que nos invade, com o vento do Espírito,
a rotina e o medo, o sossego das praias
e a oração de refúgio.
A Paz das armas rotas na derrota das armas.
A Paz da fome de Justiça,
a paz da Liberdade conquistada,
a Paz que se faz “nossa” sem cercas nem fronteiras,
Que tanto é “Shalom” como “Salam”, perdão, retorno, abraço...
Dá-nos a tua Paz, essa Paz marginal que soletra
Em Belém e agoniza na Cruz e triunfa na Páscoa.
Dá-nos, Senhor, aquela Paz inquieta,
que não nos deixa em paz!
Pedro Casaldáliga