30 Abril 2025
”Um papa firme na fé. Com autoridade, firme, respeitoso. Forte na doutrina, independente das pressões. Determinado em se opor aos lobbies ideológicos e de poder, incluindo o lobby gay”.
Isso é o que espera o cardeal alemão Gerhard Ludwig Müller, de 77 anos. Teólogo, aluno de Bento XVI e seu sucessor à frente da Congregação [atual Dicastério] para a Doutrina da Fé, ele recebeu a nomeação a cardeal de Francisco, que depois, em 2017, não renovou seu mandato como prefeito. Poucos dias antes de entrar na Capela Sistina, afirma que “a força da Igreja está na verdade, não nos compromissos”.
A entrevista é de Domenico Agasso, publicada por La Stampa, 28-04-2025. A tradução é de Luisa Rabolini.
Eminência, como deve ser buscado o novo pontífice?
Devemos partir da definição que o próprio Jesus deu ao nomear Simão de Cafarnaum: 'Tu és Pedro e sobre esta pedra edificarei a minha Igreja', e lhe confiou a tarefa de confortar os irmãos na fé e pastorear as ovelhas. O papa é o pastor universal da Igreja. Essa é a base para identificar a pessoa certa.
Qual é o perfil que espera?
O papa deve ter uma sólida formação teológica e doutrinária, ser equilibrado, nem autoritário nem fraco, firme, mas capaz de respeitar os outros. Ele não deve ser autoritário demais: ele faz parte do colégio de bispos, continua sendo um bispo, o bispo de Roma. Os bispos não são seus delegados, mas seus irmãos no apostolado. O papa deve agir de acordo com a definição dada pelo Concílio Vaticano I e reiterada e enfatizada pelo Vaticano II: não é um solitário que comanda a Igreja, ele tem a especificidade de ser o princípio da unidade entre bispos, sacerdotes e fiéis.
O senhor criticou abertamente Francisco algumas vezes, por exemplo, sobre a abertura para a bênção de casais homossexuais. Que mudanças propõe ao caminho trilhado por Bergoglio?
É sempre uma interpretação errônea afirmar que eu critiquei o Papa Francisco. Eu simplesmente respondi a algumas perguntas dos fiéis sobre esses temas. A doutrina não é propriedade do papa, dos bispos ou dos fiéis: ela deve estar em conformidade com a Palavra de Jesus, ninguém pode modificá-la.
Pode explicar?
Se Jesus diz que o casamento é entre um homem e uma mulher e é indissolúvel, nenhum papa pode mudar essa doutrina. Os lobbies homossexuais querem equiparar as uniões entre pessoas do mesmo sexo ao casamento, mas isso contradiz totalmente a doutrina da Bíblia. Pode-se discutir a pastoral concreta e individual, direcionada para as pessoas individualmente, para guiá-las à vida cristã, mas não aceitar a ideologia de gênero, que é contrária à doutrina da Igreja.
Então espera um papa conservador?
A missão da Igreja é conduzir cada pessoa à existência cristã e à salvação eterna, e não se perder em batalhas ideológicas entre conservadores e progressistas. Temos a Bíblia, a tradição apostólica, o magistério autêntico e infalível dos concílios e dos papas ex cathedra: essa é a linha a ser seguida e compartilhada, ou a ser aceita. A força da Igreja está na verdade, não nos compromissos.
Mas, em sua opinião, foi louvável o fato de Francisco ter colocado os pobres no centro do pontificado?
O grande interesse do Papa Francisco pelos marginalizados deve ser colocado em sua fé, caso contrário, será feita uma descrição parcial e instrumental. Deve-se lembrar que ele sempre manteve uma espiritualidade inaciana, centrada em Cristo. Em suas homilias e pregações, ele sempre começou por Jesus: o fundamento e o conteúdo de nossa fé. Por outro lado, não se pode ser chefe da Igreja Católica sem confessar diariamente a fé católica.
Haverá fortes tensões antes e durante o Conclave?
Não espero grandes confrontos. Os cardeais têm a tarefa de ouvir o Espírito Santo e eleger o novo papa de acordo com a consciência, avaliando as competências dos candidatos. O Conclave não deve se tornar um confronto entre grupos ideológicos: categorias políticas como esquerda e direita não se aplicam à Igreja.
Mas na galáxia eclesiástica, visões diferentes, se não opostas, são evidentes.
As categorias teológicas corretas são aquelas que se enquadram na ortodoxia, na sã doutrina baseada nas Escrituras, na tradição apostólica e no Magistério. E elas se opõem à heresia.
O que é herético?
No Concílio de Niceia, a questão fundamental era se Jesus era realmente o Filho de Deus. Essa pergunta não pode ser respondida com simplificações políticas como 'tradicionalista' ou 'liberal': ou é verdade ou não é. Essa é a dimensão teológica essencial. Nós acreditamos em uma única Igreja, santa, católica e apostólica. A Igreja não é um partido político: é a união do Filho com o Pai no Espírito Santo. O Concílio Vaticano II afirma isso claramente: a Igreja está unida na comunhão trinitária, e esse deve ser o guia para cardeais, bispos e padres. O resto não importa. Não somos representantes de facções ideológicas ou de algum lobby, não devemos ceder a pressões externas e midiáticas, somos de toda a Igreja.
O diálogo com líderes mundiais, a começar pelo presidente dos EUA: Bergoglio teve fortes atritos com Trump. Que atitude o novo papa deverá ter?
A Igreja, e em particular o papa, deve praticar a dimensão moral na política, e não entrar na política partidária. Ele deve advertir os políticos a respeitar os princípios da antropologia natural, da razão e da lei moral. Se líderes como Putin ou Trump se declaram cristãos, é preciso lembrá-los dos princípios do cristianismo. O papa é hoje praticamente a única autoridade moral em nível internacional. Assim como Leão XIII, Pio XII e João Paulo II, deve erguer sua voz em favor da humanidade, contra as guerras e contra o sacrifício de vidas humanas por interesses políticos ou financeiros. O pontífice é chamado para ser a voz da consciência moral da humanidade: essa é a fé católica.