20 Janeiro 2025
A nomeação da primeira mulher, uma religiosa, irmã Simona Brambilla, à frente do dicastério dos Institutos de Vida Consagrada e Sociedades de Vida Apostólica (órgão do qual era secretária desde 2023), ocorre em um momento de grave crise para muitas congregações religiosas. De fato, são dezenas os comissionamentos decididos pelo Vaticano nos últimos anos, bem como as investigações sobre muitos “fundadores”.
A reportagem é de Francesco Peloso, publicada por Domani, 16-01-2025. A tradução é de Luisa Rabolini.
Não é coincidência, portanto, que a recém-nomeada Prefeita (a escolha do feminino foi feita pela própria Irmã Brambilla) tenha enviado dois delegados pontifícios para dois institutos - masculino e feminino - pertencentes à família do Verbo Encarnado, para acompanhá-los na formação, na disciplina religiosa, no apostolado e no governo.
Trata-se de dois institutos da congregação religiosa fundada na Argentina na década de 1980 pelo padre Carlos Miguel Buela, que morreu em Gênova em 2023. Este último havia sido acusado no passado pelo Vaticano de ter cometido abusos sexuais de jovens seminaristas.
Com relação à congregação feminina, um decreto datado de 8 de dezembro de 2024 revelou, conforme relatado pelo portal católico Acistampa, “uma grave deficiência com relação ao discernimento vocacional, à formação de candidatos e religiosos, à grande inexperiência e ao número demasiado pequeno de formadores, ao estilo de vida, ao serviço de governo, confiado a religiosos inexperientes, às vezes ainda não incorporados definitivamente, e ao apostolado”.
Além disso, afirmou, “apesar das repetidas e graves medidas tomadas pela Sé Apostólica, tanto administrativas quanto penais, que ao longo dos anos reconheceram o fundador, padre Carlos Buela, como culpado dos crimes dos quais era acusado”, ou seja, os abusos cometidos contra jovens seminaristas, ainda hoje é apresentado em sua congregação “como um sacerdote injustamente perseguido pela Santa Sé, e as vítimas são consideradas falsas e insinceras”. Não só: “Os dois institutos organizam peregrinações ao seu túmulo e seus escritos foram republicados e divulgados”.
Na verdade, os casos estão se multiplicando; no último dia 5 de novembro, por exemplo, conforme noticiado pelo semanário Adista, foi condenado pelo Vaticano (o decreto é do Dicastério para o Clero), o padre Gebhard Paul Maria Sigl, cofundador, ex-superior e diretor espiritual por mais de 30 anos da Família de Maria, fundada em 1990 (nesse interim, sob intervenção do Vaticano).
O padre Sigl havia sido acusado de supostos abusos psicológicos e espirituais e manipulação mental.
Entre outras coisas, a Família de Maria está sendo acusada de uso inescrupuloso de supostas aparições marianas, cuja credibilidade é questionada pela própria Santa Sé.
Na verdade, o que está em curso é uma espécie de tsunami silencioso que afeta não tanto as ordens religiosas históricas - que também tiveram seus problemas com o escândalo dos abusos, mas cujo carisma resiste à passagem do tempo - quanto as novas comunidades nascidas durante o século XX e, em especial, após o Concílio Vaticano II, quando o florescimento de tantas realidades carismáticas deu origem a um movimento dentro da Igreja no qual ganharam espaço personalidades muitas vezes inescrupulosas, capazes de criar consenso e agregação em torno de si mesma. Por algumas décadas, e particularmente sob o pontificado de João Paulo II, essas comunidades ganharam terreno, pois pareciam ser uma resposta adequada à crise de vocações e ao recuo da fé no Ocidente. O percurso era o de uma fé vivida de forma integral, livre de dúvidas e fortemente identitária. Alguns aspectos comuns caracterizam muitos desses movimentos: abusos de poder, espirituais e sexuais, culto à personalidade do fundador, não raro uma exasperação do culto mariano em função tradicionalista, formação insuficiente dos religiosos e religiosas (as vocações duvidosas se multiplicam), uma gestão opaca dos recursos financeiros em alguns casos com o apoio de bispos locais. Comissionamentos
Não em todos os casos, é preciso dizer, os resultados foram tão negativos, mas o problema existe. A própria irmã Brambilla, entrevistada pela Civiltà Cattolica em julho passado, observou como, em alguns casos, a intervenção do Vaticano “também assume a forma de visitas apostólicas, comissionamentos ou outras formas de assistência que são, precisamente, instâncias e percursos de discernimento e transformação, no caso de se verificar situações críticas que exijam apoio e ajuda da Santa Sé”.
“A diminuição de forças”, acrescentou, raciocinando sobre as causas da crise, “o aumento da idade média, a crise econômica, a perda de uma imagem prestigiosa e poderosa, o repensamento da missão e, às vezes, a confusão sobre a identidade e o sentido da vida consagrada constituem ocasiões críticas e abençoadas para aprofundar o significado da vocação e da missão, de retorno não ao passado, mas às origens, ao centro humilde e ardente do nosso chamado”.
E o fato de a crise nas vocações ter sido um impulso para fechar um olho, e às vezes os dois, por parte dos bispos e das autoridades do Vaticano, com relação à credibilidade de alguns movimentos, é explicado pelos números. De acordo com o Anuário Estatístico do Vaticano de 2024, atualizado em 2022, há um total de 128.559 sacerdotes religiosos em todo o mundo.
Não estanca a saída das religiosas que vem ocorrendo já há algum tempo. Considere-se que no espaço de 25 anos, de 1998 a 2022, o número de freiras caiu de 814.779 para 559.228 em todo o mundo.