16 Julho 2024
O artigo é de Félix Placer Ugarte, teólogo, publicado por Religión Digital, 14-07-2024.
Bem sistematizado, com clareza e profundidade, como o assunto exige; aberto, libertador, inter-relacionado, o novo livro de Juan José Tamayo, intitulado Rumo a uma espiritualidade libertadora (Herder, 2024), traça e desenvolve, a meu ver com grande sucesso e relevância, os aspectos e as dimensões complexas de uma espiritualidade atual a partir de uma perspectiva em diálogo com outras posições. Interpreto-o como uma síntese espiritual de seu pensamento, de sua extensa e comprometida obra teológica, de sua militante dedicação cultural, epistemológica, política, feminista, ecológica, mística...
Hacia una espiritualidad liberadora, de Juan José Tamayo (Foto: Divulgação)
Escrito a partir da inspiração e da escolha libertadora cristã, motivado pelo hálito quente e pela perspectiva utópica de um outro mundo possível, desenvolvida em sua densa e extensa obra teológica, ele mostra diante dos desafios prementes da era tecnológica em um mundo de injustiças que a espiritualidade é a chave para que não sucumbamos à desumanização. Constitui, de fato, a "dimensão fundamental do ser humano" e nela "a verdadeira identidade do ser humano, a sua humanização...".
Achei muito importante sua reflexão sobre a espiritualidade cristã de seguir Jesus, em sua "práxis libertadora" com suas características originais, que supera todo espiritualismo, longe do mundo, para "tornar-se força de libertação" da autoridade das vítimas, das margens, na oração e na prática da justiça.
Especialmente interessante e original, a meu ver, é sua reflexão no capítulo III sobre o "novo paradigma da espiritualidade no horizonte do pluriverso cultural" para construir esse novo paradigma na interculturalidade, no diálogo, na interlibertação, contra todo imperialismo, imerso compassivamente, libertadoramente, na injustiça da marginalização que nosso mundo causa.
Sublinho a espiritualidade feminista ecofeminista ética, política, sapiencial, holística.... Especificamente, "a perspectiva de gênero deve desempenhar um papel fundamental hoje neste novo paradigma de interespiritualidade" que nos leva a uma reinterpretação de nossas categorias teológicas, tarefa que Tamayo vem realizando em suas extensas publicações.
Com o amigo José Saramago descobre-nos "no grande silêncio do universo (...) a solidariedade de crentes e não crentes para sofrer o mal e combatê-lo". Seu último capítulo desenvolve uma profunda e luminosa reflexão sobre a mística relacionada à ciência, à filosofia e ao ateísmo. Destaco a importante contribuição de María Zambrano para conduzir ao que ela chama de "ateísmo místico", apoiado por Bloch juntamente com Fiore, Eckhart, Müntzer, São João da Cruz, Wittgenstein, Weil...
Concordo plenamente com Juan José Tamayo que "a busca de um novo consenso universal... É o grande desafio para o século XXI". Esse consenso deve ser espiritual. Somente descobrindo o Espírito humanizador-libertador, na experiência mística que pulsa nas profundezas de cada pessoa, em sua espiritualidade, daremos sentido a esse admirável e arriscado mundo tecnológico e impediremos que a inteligência artificial seja invasiva, para alcançar a humanização e evitar sucumbir aos ditames dos algoritmos capitalistas e imperialistas guiados pelo lucro egoísta e pelo ódio avassalador.
Neste momento complexo, contraditório, polarizado e incerto, em circunstâncias desorientadoras e pessimistas para muitas pessoas, esta reflexão de Juan José Tamayo, que responde às suas coerentes convicções de vida que admiro, contribui para estimular com lucidez e clareza motivadoras uma espiritualidade de busca, esperança e realização libertadoras.
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“Rumo a uma espiritualidade libertadora”: em tempos de incerteza, polarização e injustiça - Instituto Humanitas Unisinos - IHU