06 Junho 2024
”Gostaria de oferecer essa trajetória a tantos irmãos desesperados de hoje. Você não é o teólogo da esperança, mas o teólogo da esperança recuperada”, escreve José Ignacio González Faus, jesuíta, teólogo espanhol, em carta publicada por Religión Digital direcionada a Jürgen Moltmann, 05-06-2024.
Lieber Jürgen:
Não sei por que, a notícia da sua partida foi para mim um abalo daqueles que suspeitamos que vêm de Deus, embora ainda não entendamos seu conteúdo. A tendência agora é falar dos seus livros. Eu prefiro destacar antes de tudo do seu drama juvenil, aos 17 anos, quando estava na guerra: em seu batalhão havia outro rapaz da sua idade com quem podia se comunicar mais e, um belo dia, ao retornar de não sei de qual missão, você o encontra morto. Você fica sem ele, podia ter acontecido com você… Realmente, não parece que esta vida tenha muito sentido nem que a esperança seja muito possível.
Prisioneiro de guerra na Escócia, um pastor protestante (acho que norte-americano) em quem você busca apoio e consolo, lhe deixa um Novo Testamento e os Salmos. Você se torna cristão e decide estudar teologia.
E mais uma vez temos uma daquelas coisas estranhas do século passado e que não se sabe se são sinais dos tempos: os grandes testemunhos da fé foram quase todos de convertidos, de origem não crente (E. Stein, S. Weil, E. Hillesum, M. Delbrêl..., com exceções como D. Romero).
Mais do que uma síntese, gostaria de propor agora uma trajetória do seu pensamento que me parece muito atual: a esperança (como dimensão humana fundamental); a crucificação de Deus (como tragédia que coloca decisivamente em questão as certezas e expectativas de nossas esperanças); e a força do Espírito (como possibilidade de reconstruir uma nova esperança). Talvez porque, como você mesmo intitulou também: a criação é um futuro[1]. Uma trajetória marcante que recupera nossa capacidade de esperar a partir do Espírito.
Depois disso, é também notável (mas não estranho) que a esperança volte a aparecer em vários outros títulos seus: como “experimento”, como necessitada de “ética” e como Esperança para um mundo inacabado. Gostaria de oferecer essa trajetória a tantos irmãos desesperados de hoje. Você não é o teólogo da esperança, mas o teólogo da esperança recuperada.
Essa recuperação se expressa em outro título que já não é seu (embora digam que você participou daquelas entrevistas): Acreditar apesar de tudo. E esse “apesar de tudo” se torna maior e mais difícil porque não deve evitar a frase de sua esposa Elisabeth: “quem não toca o chão não pode chegar ao céu”.
Vielen Dank, lieber Jürgen. Bis nachher.
[1] Alusão a vários títulos de Moltmann: Teologia da Esperança; (por volta de 1966), O Deus crucificado (por volta de 1972), Igreja no poder do Espírito (1978). E O Futuro da Criação (1979).
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A esperança recuperada. Carta para Jürgen Moltmann - Instituto Humanitas Unisinos - IHU