04 Agosto 2022
O dia de 9 de agosto marca o 80º aniversário da morte de Edith Stein, filha do povo judeu e filha da Igreja Católica. Recordamo-nos dela com este pequeno perfil de Anselmo Palini.
Anselmo Palini, ex-professor de disciplinas literárias do Instituto de Educação Superior “Antonietti” de Iseo. Autor do livro: Più forti delle armi. Dietrich Bonhoeffer, Edith Stein, Jerzy Popieluszko, Ave, Roma 2016.
O texto é publicado por Viandanti, 29-07-2022. A tradução é de Luisa Rabolini.
Em 9 de agosto de 1942, no campo de Auschwitz, a irmã Edith Stein, uma jovem de origem judia, convertida à fé católica, morreu em uma câmara de gás. Em 1º de maio de 1987, João Paulo II, em Colônia, a proclamou beata e em 11 de outubro de 1998, em Roma, a declarou santa.
Edith Stein nasce em Breslau, na Baixa Silésia, em 12 de outubro de 1891; ela é a caçula de onze irmãos de um casal de comerciantes. Os Stein eram judeus alemães totalmente integrados. Após os estudos básicos e secundários, concluídos de forma brilhante, em 1911 começa a estudar germanística, psicologia e filosofia, na Universidade de Breslau, sua cidade natal, e mais tarde em Göttingen.
Edith é admirada por todos por sua inteligência. Nesses anos de estudos universitários, a vida de Edith é inteiramente centrada no conhecimento, configurando-se como uma espécie de vocação à filosofia pura. Ela se declara agnóstica: as problemáticas religiosas não estão entre seus interesses, todos focados na ciência e na filosofia.
Em 1916 Edith Stein torna-se assistente de Edmund Husserl, professor titular da Universidade de Friburgo. Como assistente de Husserl, Edith logo se vê engajada na transcrição de seus manuscritos: é um trabalho extenuante para decifrar uma escrita muito particular, para classificar o material que consiste principalmente em notas escritas e, por fim, para a redação datilográfica de todo o trabalho. Vários dos textos de Husserl só podem ver a luz graças a todo o trabalho realizado pela jovem assistente. Nesses anos, Edith entra em contato direto com os principais filósofos da época: de Jacques Maritain a Max Scheler até Martin Heidegger.
No verão de 1921 termina uma jornada de aproximação à fé católica, que Edith estava realizando de maneira cada vez mais consciente.
Uma noite de junho de 1921, Edith pega ao acaso um livro sobre a vida de Santa Teresa de Ávila da biblioteca de dois amigos. O texto a interessa tanto que continua sua leitura por toda a noite. Na história de Teresa de Ávila, Edith vê refletida sua vida e sua busca pela verdade. O que ela havia procurado e não havia encontrado na filosofia e na ciência, ou seja, a verdade, ela agora o encontra na fé. Após uma longa peregrinação no deserto, Edith agora entrevê o caminho certo a seguir.
Depois de deixar seu trabalho como assistente de Husserl, Edith dedica-se a ensinar primeiro junto às dominicanas de Speyer, depois em Münster. No início dos anos 1930 tenta o caminho da habilitação para o ensino universitário, mas é tudo inútil. As mulheres não têm acesso a tal função na Alemanha. E depois há outro obstáculo intransponível: ela é de origem judaica e o antissemitismo no momento já é generalizado na Alemanha.
Em sua juventude, Edith havia perdido a fé de seus pais. Havia chegado ao ateísmo. Só com a conversão ao catolicismo ela redescobre a consciência de pertencer ao povo eleito. Raniero Cantalamessa escreveu que “a conversão de Edith ao catolicismo é, ao mesmo tempo, uma conversão ao judaísmo. A descoberta de Cristo traz consigo a redescoberta do judaísmo, uma redescoberta que se desenvolverá até assumir uma profundidade mística sob o impulso da perseguição externa. […]. Se antes não se importava muito com sua pertença ao mundo judaico, agora ela se orgulha, no ato de rever os filósofos judeus de seu tempo (Husserl, Bergson, Meyerson) a ponto de dizer enfaticamente: 'Nós judeus'. Em suas palavras, escreve um colega, tinha-se a impressão de ouvir o grito de São Paulo: 'Hebraei sunt: et ego' (2 Cor, 11, 22)”. Diante da perseguição que atingia o povo judeu, Edith se sente unida a ele como nunca antes e carrega no coração a dolorosa tragédia.
A conversão ao catolicismo e a entrada no Carmelo não significaram para Edith fugir do mundo, buscar um abrigo seguro longe dos horrores que estão desabando sobre os judeus de forma cada vez mais dramática. Depois de ter escrito ao papa para implorar sua intervenção em favor dos judeus, Edith, não tendo mais nada para fazer, oferece a si mesma, sua vida, pela paz no mundo e pelo povo judeu.
Abraçando a fé católica, Edith vê na figura de Jesus Cristo aquele que leva a cumprimento as promessas antigas. Edith, portanto, reza para que mesmo o mundo judaico possa alcançar essa consciência, superando uma descrença histórica.
Em janeiro de 1933, o nazismo chega ao poder na Alemanha. Hitler é nomeado chanceler. Edith Stein, ao contrário de muitos outros, fica imediatamente ciente do perigo que o nazismo representa não apenas para o povo judeu, mas também para o povo alemão e para a Igreja.
Em 12 de abril de 1933, após apenas dois meses de governo de Hitler, Edith Stein escreve uma carta a Pio XI para solicitar sua intervenção formal contra o nazismo.
Edith Stein, "como filha do povo judeu, mas há onze anos também da Igreja Católica", pede ao Papa que não fique calado diante de um governo, o nazista, que se define como "cristão", mas que na realidade não é, pois quer destruir não só o povo judeu, mas a própria cristandade. Estamos diante de um governo que impõe "a idolatria da raça e do poder do Estado", e isso para Edith Stein representa uma evidente heresia.
Na Alemanha há "total desprezo pela justiça e pela humanidade". Os líderes do nacional-socialismo não fazem nada além de espalhar e pregar o ódio contra os judeus. Daí o apelo ao Papa para que o silêncio não se prolongue mais, já que a responsabilidade pelo que acontece "recai também sobre aqueles que se calam".
Não se sabe que efeito a carta de Edith Stein teve sobre o Papa. Um fato certamente não em sintonia com o pedido da filósofa alemã é, poucos meses depois da carta, a assinatura da Concordata entre o Vaticano e o governo nazista. Esse fato representa um grande sucesso para Hitler, um selo de legitimidade válido em nível internacional. No entanto, em 14 de março de 1937, Pio XI publica a encíclica Mit brennender Sorge (Com vívida angústia), onde, embora sem jamais mencioná-lo explicitamente, condena o nacional-socialismo.
Logo após sua conversão, Edith Stein havia manifestado sua intenção de se retirar para o Carmelo. Seu diretor espiritual a havia dissuadido na época, pois acreditava que Edith, por suas capacidades intelectuais, fosse chamada para o ensino e o trabalho científico.
Em maio de 1933, Edith expressa formalmente suas aspirações à prioresa do Carmelo de Colônia, que se reserva o direito de decidir. De fato, algumas dificuldades fazem com que a aceitação do pedido de Edith não seja dado como certo: sua idade avançada (ela tem quarenta e dois anos) e, sobretudo, suas origens judaicas, que em um momento de antissemitismo generalizado podem criar problemas para o mosteiro. Seu pedido é depois aceito. O período que precede seu ingresso no Carmelo é passado por Edith em casa, numa tentativa inútil de convencer sua mãe, que é da religião judaica, da correção de sua escolha.
Edith permanece no Carmelo de Colônia por cinco anos. Depois, em 31 de dezembro de 1938, deixa Colônia e a Alemanha e se refugia na Holanda, país considerado mais seguro, onde é acolhida no Carmelo de Echt.
Edith permanece no Carmelo holandês de 1º de janeiro de 1938 a 2 de agosto de 1942. Esses são anos difíceis. Notícias cada vez mais dramáticas chegam da Alemanha. Os familiares de Edith tentam sair do país porque não é mais possível para os judeus exercerem qualquer atividade de trabalho e, além disso, estão começando as prisões e as deportações para os campos de concentração. Alguns de seus familiares conseguem fugir para os Estados Unidos. Sua irmã Elfriede e seu irmão Paul, com sua esposa e filha, são deportados para o campo de concentração de Theresienstadt, onde morrerão. Em uma carta que escreve aos amigos, Edith manifesta seu desejo de compartilhar o destino de seu povo: "Tive a intuição de que Deus estava mais uma vez agravando sua mão sobre seu povo, e que o destino desse povo também era o meu".
Em 1941, a prioresa de Echt pede à Irmã Bendita que realize um trabalho sobre São João da Cruz, no quarto centenário de seu nascimento (1542). Esse texto, que permanecerá inacabado, será publicado postumamente sob o título de Ciência da Cruz. Aqui a Irmã Benedita vê a característica de sua Ordem "na imitação de Cristo no caminho da Cruz, na participação na Cruz de Cristo e em sua paixão para salvar o mundo". A entrada no Carmelo deve-se precisamente ao desejo de realizar aquela semelhança divina com o Cordeiro sacrificado que a tornaria partícipe da morte violenta do Filho de Deus para a salvação do seu povo. Edith tem confiança absoluta em Deus: na escuridão da noite, Deus indica a direção a seguir.
Para Piero Coda, o caminho escolhido por Edith Stein, ao entrar no convento, “é o caminho da substituição e da expiação vicária na identificação com Cristo e, nele, com as vítimas e os oprimidos. Uma referência, a da expiação, que não se reflete imediatamente na meditação espiritual do Carmelo reformado em torno do Cristo crucificado, mas que pode chegar a Stein a partir da releitura das páginas bíblicas do Servo de Javé do Antigo Testamento e de o Filho do Homem crucificado do Novo, no contexto do que estava acontecendo tragicamente na Alemanha”.
Em 2 de agosto Edith e sua irmã Rosa são retiradas de seu convento pela Gestapo e deportadas para o campo de Westerbork. Em 7 de agosto, Edith Stein e sua irmã são colocadas em um trem que as leva de Westerbork a Auschwitz, onde chegam em 9 de agosto. Aqui a seleção ocorre imediatamente: das cerca de 1200 pessoas, as que estavam presentes no comboio, apenas 165 homens, com idades entre 17 e 50 anos, são escolhidos para serem utilizados em atividades de trabalho. Todos os outros, entre os quais Edith e sua irmã Rosa, são imediatamente enviados para a câmara de gás. Em agosto de 1942 em Auschwitz os fornos crematórios ainda não entraram em operação, portanto, é provável que Edith Stein e sua irmã Rosa tenham sido posteriormente enterradas em valas comuns.
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Edith Stein, judia e mártir cristã. Artigo de Anselmo Palini - Instituto Humanitas Unisinos - IHU