03 Abril 2024
Com termos respeitosos, mas francos, no programa de domingo de manhã da CBS “Face the Nation”, o cardeal Wilton Gregory, de Washington, comparou o presidente Joe Biden a um “católico à la carte”, que é “sincero” em sua fé, mas ignora alguns de seus ensinamentos, assim como fazem “vários outros católicos”.
A reportagem é de Brian Fraga, publicada por National Catholic Reporter, 01-04-2024. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Gregory, que em novembro de 2020 disse que não negaria a comunhão a Biden por seu apoio ao direito ao aborto, disse ao apresentador da CBS News Ed O’Keefe, no domingo de Páscoa, que, embora o presidente, um democrata, participe da missa “regularmente com grande devoção”, ele também “se afasta” ou explora certas “questões polêmicas” em seu próprio benefício político.
“E essa não é a forma, creio eu, pela qual gostaríamos que a nossa fé fosse usada”, disse Gregory durante um painel de discussão pré-gravado de meia hora com O’Keefe e a bispa episcopaliana Mariann Edgar Budde, de Washington.
Os comentários de Gregory, feitos durante uma parte em que ele e Budde ofereceram suas ideias sobre a intersecção entre fé e política durante aquele que se espera que será outro ano controverso de eleições presidenciais, rapidamente geraram manchetes nas mídias conservadoras, que enfatizaram que um importante prelado católico havia criticado Biden por sua posição sobre o aborto.
Nos últimos dias, Biden também foi criticado por conservadores sociais e outros por proclamar o Dia da Visibilidade Transgênero, uma comemoração anual realizada nos últimos 15 anos no dia 31 de março que em 2024 coincidiu com o Domingo de Páscoa.
Algumas das recentes coberturas midiáticas negligenciaram algumas falas de Gregory e Budde em que alertam sobre os riscos de a religião se enredar na política partidária. Budde alertou que os Estados Unidos estão “caminhando sobre um gelo muito fino”.
“Em uma democracia, a fé serve ao bem comum, ponto final”, disse Budde. “Se serve ao bem comum, pertence à arena pública. Do contrário, não pertence a ela.”
Questionados por O’Keefe sobre o fato de o ex-presidente Donald Trump estar anunciando a venda da Bíblia “God Bless the USA Bible” [Deus abençoe os Estados Unidos, vendida a 60 dólares], tanto Gregory quanto Budde disseram que o livro sagrado não deveria ser vendido com fins lucrativos nem aparecer junto de textos políticos como a Constituição dos Estados Unidos.
Ambos os líderes religiosos – que se descreveram como amigos e acrescentaram que se conheceram pouco antes do confinamento pandêmico da Covid-19 em 2020 – também falaram da necessidade de um diálogo inter-religioso e ecumênico em uma sociedade pluralista.
“Temos que ter muito cuidado ao descrever a nossa nação para não acabarmos por isolar pessoas que fazem parte desta nação”, disse Gregory.
Devido a suas posições sobre o aborto e as questões LGBTQ, Biden tem sido alvo durante anos de prelados católicos conservadores, vários dos quais queriam que a Conferência dos Bispos dos Estados Unidos declarasse em 2021 que os políticos católicos não deveriam receber a Comunhão se apoiassem o direito ao aborto.
Durante um ano de intensos debates que se seguiu à eleição de Biden e que mais tarde terminou em um documento negociado que resumiu o ensino católico sobre a Eucaristia, Gregory evitou propostas para negar a Comunhão ao segundo presidente católico do país. Gregory disse que preferia envolver Biden em um diálogo que buscasse um terreno comum, ao mesmo tempo em que apontava para a divergência do presidente em relação ao magistério católico.
As palavras de Gregory no programa “Face the Nation” refletiram esse equilíbrio cuidadoso. Ao acrescentar que Biden é “muito sincero” em relação à sua fé católica, o cardeal disse que o presidente também ignora as “questões da vida” ou as utiliza como um “peão político”.
Gregory, que criticou Biden em outras ocasiões nos últimos anos pelas suas afirmações sobre o aborto, disse que preferiria que Biden empregasse uma abordagem direta e explicasse por que, como político, ele não defende o ensino antiaborto da Igreja Católica. O cardeal também disse que “não ficaria nada surpreso” se o Papa Francisco comunicasse preocupações semelhantes a Biden.
“Uma das coisas que eu acho que o Papa Francisco faz, e faz extraordinariamente bem, é envolver as pessoas”, disse Gregory. “Ele se encontra com as pessoas, não as ataca. Mas ele as encontra. E as convida a responder aos seus melhores anjos.”
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Cardeal Gregory, da capital dos EUA, critica o catolicismo “à la carte” de Biden - Instituto Humanitas Unisinos - IHU