22 Novembro 2023
"As mulheres sabem o óbvio: mulheres foram ordenadas diáconas. Nunca haverá um acordo completo sobre os fatos da história, da antropologia e da teologia. As mulheres já disseram isso mais de uma vez. Se houver provas absolutas de que as mulheres não podem ser restauradas ao diaconato ordenado, estas devem ser apresentadas e uma decisão deve ser tomada".
O comentário é de Phyllis Zagano, pesquisadora e professora da Hofstra University, em Nova York. O artigo foi publicado em National Catholic Reporter, 21-11-2023. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Sem dúvida, a melhor frase que veio do Sínodo sobre a Sinodalidade foi: “Com licença, Eminência, ela ainda não acabou de falar”.
Isso resume o Sínodo e o estado da atitude da Igreja Católica em relação à mudança.
Em outubro, centenas de bispos, acompanhados por leigos e leigas, padres, diáconos, religiosas e religiosos, reuniram-se durante quase um mês em Roma para o Sínodo sobre a Sinodalidade. Ao encerrar, o Sínodo divulgou um relatório de síntese repleto da esperança e da promessa de que a Igreja seria uma Igreja mais à escuta.
Cerca de 54 mulheres votaram no Sínodo. Ao voltarem para casa, as mulheres continuam sendo ignoradas.
Por quê?
Não é pelo fato de as mulheres citarem o Concílio Vaticano II nas reuniões do conselho paroquial. É porque muitos bispos e párocos ignoram os conselhos paroquiais.
Não é pelo fato de as mulheres do mundo não escreverem a seus pastores e bispos. É porque, sem um cheque substancioso, suas cartas são ignoradas.
O Sínodo sobre a Sinodalidade foi inovador em parte porque se tratou mais de aprender a escutar. Tratou-se mais de um processo do que de resultados. Seu objetivo era envolver toda a Igreja em uma nova forma de relação, de “conversar no Espírito”, em que a escuta e a oração alimentam o discernimento e a tomada de decisões.
Mesmo agora, o projeto enfrenta obstáculos. Em sua assembleia de novembro em Baltimore, os bispos dos Estados Unidos ouviram as apresentações do bispo Daniel Flores, de Brownsville, Texas, que liderou o processo sinodal nacional de dois anos até agora. Seus irmãos bispos não pareciam interessados.
Na verdade, alguns bispos de algumas dioceses, nos Estados Unidos e em outras partes do mundo, estão engajados com a tentativa do Papa Francisco de encorajar a Igreja a aceitar as reformas do Vaticano II, a escutar o povo de Deus. Mas muitos bispos não aceitam nada disso.
O Sínodo reconheceu a infecção global da Igreja pelo clericalismo narcisista. Disse coisas boas sobre as mulheres na liderança e sobre o cuidado de outras pessoas marginalizadas. No entanto, o Sínodo continua sendo um segredo em muitos lugares. Suas boas palavras não chegam aos fiéis comuns.
Pergunte sobre a sinodalidade em qualquer paróquia e você poderá ouvir: “Ah, não fazemos isso aqui”. É igualmente provável que você ouça sermões do tipo “quando eu” (“quando eu estava no seminário”, “quando eu estava em outra paróquia”), e não sobre o Evangelho.
As pessoas que ficaram entusiasmadas com a abertura e a mensagem pastoral de Francisco apenas balançam a cabeça.
As mulheres que querem contribuir, que querem pertencer, estão mais do que desanimadas. Estão fartas. E já não estão caminhando rumo à porta de saída – estão correndo, levando consigo seus maridos, filhos e talões de cheques.
Na Diocese de Brooklyn, Nova York, descobriu-se recentemente que a frequência à missa caiu 40% desde 2017. O mesmo acontece em muitos lugares. A razão pela qual a Igreja está vacilando não é a falta de piedade. É porque as mulheres são ignoradas. Suas reclamações só chegam até às pastas do arquivo morto.
Do que as mulheres reclamam? Sermões ruins, como discutido. Pastores autocráticos. E o grande problema: a pederastia. Verdade seja dita, as mulheres não confiam seus filhos a homens solteiros. Em todo o mundo, diocese após diocese, novas revelações continuam surgindo. Ainda.
Muitos bispos e pastores entendem isso. Francisco certamente entende, mas é constrangido por clérigos que se arraigam em um passado que muitos deles nunca conheceram. Cada vez mais padres jovens (e mais velhos) anseiam pelos anos 1950, quando os padres usavam rendas e bordados, e as mulheres conheciam o seu lugar. Esse imaginário não inclui a sinodalidade.
O esforço sinodal funcionará? A abertura de Francisco às mulheres na gestão da Igreja é promissora. Nas chancelarias eclesiásticas onde as mulheres estão presentes, há mais oportunidades para que as vozes das mulheres sejam ouvidas. Sem dúvida, algumas mulheres a mais poderiam ajudar.
Levar as mulheres para a sacristia é mais complicado. Embora pareça que a maioria dos membros do Sínodo tenha concordado em restaurar as mulheres ao diaconato ordenado como um reconhecimento da igualdade batismal de todos, alguns opositores ferrenhos argumentaram que isso era contra a tradição. Outros ainda viam o fantasma de uma “ideologia de gênero ocidental”, que procura confundir os papéis de homens e mulheres.
Então, eles pediram uma revisão da pesquisa. De novo.
As mulheres sabem o óbvio: mulheres foram ordenadas diáconas. Nunca haverá um acordo completo sobre os fatos da história, da antropologia e da teologia. As mulheres já disseram isso mais de uma vez.
Se houver provas absolutas de que as mulheres não podem ser restauradas ao diaconato ordenado, estas devem ser apresentadas, e uma decisão deve ser tomada.
As mulheres acabaram de falar isso.
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“Com licença, Eminência, ela ainda não acabou de falar.” Artigo de Phyllis Zagano - Instituto Humanitas Unisinos - IHU