25 Agosto 2023
“Não devemos esquecer que as gerações mais jovens têm direito a receber um mundo belo e habitável e que isso nos investe de grandes deveres”, disse o Pontífice, que desde a publicação do documento sobre a ecologia integral, oito anos atrás, multiplicou os apelos para que sejam adotadas “políticas de ampla visão” para o cuidado da criação.
A reportagem é de Mimmo Muolo, publicada por Avvenire, 22-08-2023. A tradução é de Luisa Rabolini.
O Papa anunciou ontem que quer atualizar a encíclica Laudato si' no que diz respeito aos problemas do momento. E poucas horas depois o diretor da Sala de Imprensa Matteo Bruni especificou que se trata de uma Carta que pretende abordar em particular as recentes crises climáticas.
O anúncio de Francisco chegou na segunda-feira pela manhã com uma frase de improviso durante o discurso de que o Pontífice dirigia a um grupo de advogados dos países membros do Conselho da Europa, signatários em 11-06-2022 do Apelo de Viena, que convida os Estados membros do Conselho a empenhar-se em favor do Estado de direito e da independência da justiça. Ao abordar o tema ambiental numa passagem do seu discurso, o Papa disse: “Sou sensível, por fim, ao cuidado que vocês dedicam à casa comum e ao seu compromisso por participar na elaboração de um quadro normativo a favor da proteção do meio ambiente. Nunca devemos esquecer que as gerações mais jovens têm o direito de receber de nós um mundo belo e habitável, e que isso nos investe de sérios deveres para com a criação que recebemos das mãos generosas de Deus. Obrigado por essa contribuição. Estou escrevendo uma segunda parte da Laudato si’ para atualizar os problemas do momento”.
A encíclica que toma o título do verso inicial do Cântico das criaturas de São Francisco foi publicada em 18-06-2015, embora trazendo (de acordo com uma prática consolidada para documentos pontifícios) a data de 24 de maio. A ideia central do texto, que na época foi recebido com grande interesse não só dentro da Igreja, é a chamada “ecologia integral". Em essência, o Papa Francisco afirma que é necessário reconhecer como “Não há duas crises separadas: uma ambiental e outra social; mas uma única e complexa crise socioambiental. As diretrizes para a solução requerem uma abordagem integral para combater a pobreza, devolver a dignidade aos excluídos e, simultaneamente, cuidar da natureza". Conceito depois reafirmado em muitos discursos subsequentes.
Os oito anos decorridos desde a publicação da encíclica confirmaram a exatidão da análise do Pontífice. Está diante dos olhos de todos, de fato, que os efeitos da crise climática têm pesadas repercussões na economia, não apenas em termos de danos causados por fenômenos extremos em quase todas as áreas do mundo, mas porque com o avanço da desertificação e com o corte sem critério das florestas, são desencadeados fenômenos migratórios em grande escala, como aqueles que trazem da África milhares de pessoas desesperadas para morrer no deserto ou na travessia do Mediterrâneo (e recentemente o Papa Bergoglio explicou que irá ao encontro de Marselha nos dias 22 e 23 de setembro porque preocupa-se particularmente com esse problema).
Essa pressão às portas do mundo rico (os mesmos problemas são encontrados na fronteira entre o México e os EUA), depois têm consequências no plano político, frequentemente lembradas por Francisco. Em Lisboa, no último dia 2 de agosto, falando às autoridades e ao corpo diplomático, o Papa recordou: “Para onde navegas, se não ofereces percursos de paz, vias inovadoras para acabar com a guerra na Ucrânia e com tantos conflitos que ensanguentam o mundo?” Uma passagem que lembra outra das ideias principais da Laudato si', a ecologia humana, da qual já haviam falado São Paulo VI, São João Paulo II e Bento XVI. A tal ponto que cada vez mais o Pontífice fala da cultura do descarte que também e sobretudo diz respeito à fase da vida no nascimento (aborto) e no declínio (com os impulsos para a introdução da eutanásia).
Nestes oito anos, aliás, várias coisas mudaram. E a pandemia primeiro, a guerra na Ucrânia depois (ontem novamente definida como “insensata” pelo Papa) desferiram outros golpes fatais na situação ambiental (basta pensar na crise do trigo, consequência direta do conflito causado por Putin e às suas repercussões sobre a alimentação de grandes segmentos da população africana, arriscando amplificar a não habitabilidade de certas regiões e a pressão migratória).
Nos últimos anos, Francisco tem enviado mensagens a todas as COP sobre o clima, insistindo na redução dos gases de efeito estufa para não aumentar o aquecimento global (como evidenciado, por exemplo, pelo derretimento das geleiras), pedindo o fim do desflorestamento e sobretudo insistindo na necessidade de “políticas de ampla visão” que não ponham em risco o futuro das novas gerações. “Estamos perante um 'desafio de civilidade”, escreveu ele por ocasião da COP 25 (Madri, 2019). Em vista a COP 26 em Glasgow (2021), o Papa reuniu no Vaticano cientistas, especialistas e líderes religiosos – entre os quais o imã de al-Azhar, Ahmad al-Tayyeb, e o patriarca ortodoxo de Constantinopla, Bartolomeu I – para a encontro “Fé e Ciência”. E para a COP 27, em novembro passado, em Sharm el-Sheikh, ele escreveu: “Nunca nos cansemos de trabalhar para a dramática urgência das alterações climáticas. Vamos implementar escolhas concretas e de ampla visão, pensando nas gerações mais jovens antes que seja demasiado tarde”. Todos temas que provavelmente reaparecerão na Carta em preparação.
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Crise climática, novo apelo do Papa. A Laudato si’ será atualizada - Instituto Humanitas Unisinos - IHU