03 Novembro 2018
Um documento descafeinado. Este é o sentimento de muitos, após a publicação do texto oficial do Sínodo dos Bispos sobre os Jovens, cujo resultado final ficou muito abaixo das expectativas, inclusive daquilo que se falou no chamado Pré-Sínodo e que foi incluído no Instrumentum Laboris.
A reportagem é de Jesús Bastante e publicada por Religión Digital, 01-11-2018. A tradução é de André Langer.
A sensação é que, entre um e outro documento, os Padres Sinodais optaram por um texto de visão ampla, sem entrar de cheio nos temas escabrosos e evitando polêmicas, como aquela que aconteceu em 2015, quando uma nota de rodapé na página da Amoris Laetitia provocou uma ameaça de cisma diante da abertura à comunhão para os divorciados em segunda união.
O texto apresentado neste domingo ao Papa pede para favorecer a acolhida aos homossexuais e promover a presença feminina nos órgãos de responsabilidade da Igreja, mas não introduz nenhuma mudança substancial.
Também não reflete alguns dos pedidos específicos feitos na assembleia, como a criação de um ‘ministério’ vaticano para os jovens. Pede apenas “o estabelecimento de um corpo representativo de jovens em nível internacional”.
O texto também não responde à exigência de que as mulheres possam votar no Sínodo e dá um passo atrás no reconhecimento da diversidade sexual em relação ao Instrumentum Laboris, o documento de trabalho da assembleia, no qual se utilizava o termo LGBT.
O documento final do Sínodo menciona a pedofilia na Igreja, passa na ponta dos pés pela questão das drogas e pede aos jovens para que descubram o “justo valor da castidade” sem ocupar-se das relações sexuais anteriores ou fora do matrimônio.
O Instrumentum Laboris foi recebido como um banho de realidade, no qual o Vaticano admitia que “muitos jovens católicos não seguem as indicações da moral sexual da Igreja”, e incorporava pela primeira vez as avaliações mais duras dos jovens católicos sobre “temas polêmicos”, como os anticoncepcionais, a homossexualidade, o aborto, o matrimônio ou a questão de gênero, temas sobre os quais “os jovens já discutem livremente e sem tabus”.
Os jovens pediam para debater “abertamente e sem preconceitos” sobre estes e outros temas, que vão desde o desemprego até as novas tecnologias, passando pelos desafios das migrações, do trabalho precário, das novas escravidões, das drogas e inclusive o papel das mulheres. No entanto, o documento final concede apenas uma proposta de futuro: a de que nos próximos Sínodos se possa arbitrar uma posição para que leigos e mulheres (nem mesmo as religiosas que participaram das congregações puderam votar) tivessem voz e voto na tomada de decisões.
O texto aprovado por mais de dois terços fala em convidar “as Conferências Episcopais e as Igreja particulares para continuarem este caminho, participando de processos de discernimento comunitário que também incluem aqueles que não são bispos nas deliberações” e de apostar decididamente em uma “Igreja Sinodal”, mas não concretiza.
O documento final inclui uma dura crítica ao clericalismo e ao drama dos abusos sexuais na Igreja, assim como à corrupção na cúria, algo que os jovens solicitaram durante o pré-sínodo. Mas apenas acrescenta propostas arriscadas sobre a igualdade homens e mulheres na tomada de decisões (como se reclamava no Instrumentum Laboris) e limita-se a recomendar “que todos estejam mais conscientes da urgência de uma mudança inevitável, também a partir de uma reflexão antropológica e teológica sobre a reciprocidade entre homens e mulheres”.
Sobre a questão LGBT, sigla que já aparecia no Instrumentum, mas desapareceu do documento entregue ao Papa, “o Sínodo reafirma que Deus ama todas as pessoas e a Igreja faz o mesmo, renovando o seu compromisso contra toda discriminação e violência sobre a questão sexual”. Ao mesmo tempo, considera que “é redutor definir a identidade das pessoas com base em sua orientação sexual”. Pouco para o que se esperava.
“Os jovens querem uma Igreja autêntica, uma comunidade transparente, acolhedora, honesta, atraente, comunicativa, acessível, alegre e interativa”, acrescenta o Instrumentum Laboris, que é dividido em três partes: Reconhecer, Interpretar e Escolher. Eles pediam uma resposta concreta da Igreja que, no documento final, não é dada. Agora temos de esperar para ver como o Papa molda os resultados do Sínodo, com a esperança de que, como ele mesmo assinalou, “o Sínodo é um caminho” e “uma boa vindima, que promete bom vinho”. Veremos.
FECHAR
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
O que aconteceu entre o Instrumentum Laboris e o documento final do Sínodo? - Instituto Humanitas Unisinos - IHU