Anticoncepcionais: as insidiosas traduções

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12 Abril 2011

Nesta quarta-feira, às 12h30, na Sala de Imprensa do Vaticano, será apresentado o YouCat, o catecismo de perguntas e respostas para os jovens da Jornada Mundial da Juventude que irá ocorrer na Espanha nos próximos meses. É um texto ágil, que reúne em 527 perguntas e respostas breves toda a fé e a moral católica, organizado pela Conferência Episcopal Austríaca em acordo com as conferências episcopais alemã e suíça.

A nota é de Andrea Tornielli, em seu blog Sacri Palazzi, 12-04-2011. A tradução é de Moisés Sbardelotto.

Nas últimas horas, a pergunta 420 está no centro de algumas polêmicas, principalmente do outro lado do oceano, depois que, nesta terça-feira, a agência norte-americana Catholic News Agency descobriu uma ambiguidade na versão italiana.

O texto (p. 227) recita:

- Um casal cristão pode recorrer aos métodos anticoncepcionais?

- Sim, um casal cristão pode e deve ser responsável na faculdade de poder doar a vida.

Uma resposta que poderia soar como uma abertura à possibilidade do uso dos anticoncepcionais por parte da Igreja Católica. Deve ser dito, na verdade, que a pergunta e a resposta posterior limpam o campo de possíveis mal entendidos. Ali se lê:

- Por que nem todos os meios para evitar a concepção de um filho são igualmente bons?

- Entre os métodos para a regulação consciente da concepção, a Igreja faz referência às práticas mais evoluídas da auto-observação e do planejamento natural da família. Estas respeitam as leis internas do corpo feminino, requerem ternura e atenção recíproca e são, portanto, uma escola de amor.

Enfim, nenhuma mudança da doutrina moral tradicional, a apresentada na encíclica Humanae vitae de Paulo VI e reforçada pelos seus sucessores.

Segundo fontes vaticanas anônimas citadas pela Catholic News Agency, na origem da ambiguidade da pergunta e resposta 420, estaria o original em alemão. Mas, ainda nos EUA, o presidente da editora católica Ignatius Press, Mark Brumley, explicou que o original alemão recebido por eles não continha essa formulação da pergunta, mas sim uma diferente:

"420 May a Christian married couple regulate the number of children they have?"

Isto é, um casal de esposos cristãos pode regular o número de filhos que terão?

Com essa versão da pergunta, a resposta, assim como é colocada na versão italiana, tem muito mais sentido, a partir daquele "sim" inicial e decidido.

Um problema de tradução, embora sobre o mesmo assunto, havia sido verificado não antes de cinco meses atrás, no momento da publicação do livro-entrevista de Peter Seewald com o Papa (Luz do Mundo, Principia Editora). Na primeira edição, o jornalista fazia esta pergunta a Bento XVI:

- A pílula abortiva é um outro problema ainda...

- Sim. O que Paulo VI queria dizer, a sua grande visão que continua sendo sempre válida, é esta: se separarmos fundamentalmente sexualidade e fertilidade uma da outra – é o que ocorre com a utilização da pílula –, então a sexualidade se torna uma coisa qualquer.

Disso, deduz-se que, tanto na pergunta quanto na resposta, o jornalista entrevistador e o entrevistado pretenderam se referir à pílula anticoncepcional, não à pílula abortiva, que é uma outra coisa (a primeira impede a ovulação, a segundo produz um verdadeiro aborto).

Mas, além das polêmicas e das traduções imprecisas e ambíguas – acidentes do gênero sempre são possíveis, mas que em tempos recentes parecem se multiplicar –, vale a pena lembrar também as outras palavras usadas pelo Papa no livro-entrevista Luz do Mundo para falar da atualidade da Humanae vitae.

As perspectivas da Humanae vitae continuam válidas, mas outra coisa é encontrar caminhos que podem ser humanamente percorridos. Acredito que sempre haverá minorias intimamente persuadidas pela justeza dessas perspectivas e que, vivendo-as, permanecerão plenamente satisfeitas que se tornarão para outros um fascinante modelo a ser seguido. Somos pecadores. Mas não devemos assumir esse fato como instância contra a verdade, isto é, quando aquela alta moral não é vivida. Devemos procurar fazer todo o bem possível, ajudar-nos e suportar-nos reciprocamente. Expressar tudo isso também do ponto de vista pastoral, teológico e conceitual no contexto da atual sexologia e pesquisa antropológica é uma grande tarefa à qual é preciso que nos dediquemos mais e melhor.