28 Outubro 2018
Jovens acolhidos, ouvidos e acompanhados por adultos que são testemunhas confiáveis do Evangelho. Jovens que se tornam protagonistas da missão da Igreja não por força de uma estratégia de marketing, de um juvenil encomendar-se às redes sociais, de rígidos e desencarnados apelos doutrinários, mas porque encontram em suas vidas testemunhos capazes de tocar o coração: “Os jovens precisam de santos que formem outros santos”. O Sínodo dos Bispos sobre os jovens publicou o seu documento final, que deverá introduzir mudanças na pastoral da juventude da Igreja católica, mas a partir da conversão pessoal de cada um dos padres sinodais e “ouvintes”, como enfatizou o Papa Francisco, que, em seu discurso final, explicou: “Agora o Espírito nos dá o documento para que trabalhe em nossos corações. Nós somos os destinatários dos documentos, não as pessoas de fora”.
A reportagem é de Iacopo Scaramuzzi e Andrea Tornielli, publicada por Vatican Insider, 27-10-2018. A tradução é de André Langer.
O documento de 167 parágrafos insiste no acompanhamento, na acolhida e no discernimento. Propõe amplamente a imagem de uma Igreja “sinodal”, mais aberta à partilha e que veja a própria juventude se transformar em protagonista da missão evangelizadora. E propõe a todas as Igrejas que ofereçam aos jovens uma experiência de acompanhamento, um longo período para ser vivido longe dos ambientes habituais, dedicando-se ao serviço e à oração.
O texto final esclarece que a Igreja está “à escuta” dos jovens, que “expressam o desejo de ser ouvidos, reconhecidos e acompanhados” (parágrafo 7). E o Sínodo “reconhece que nem sempre a comunidade eclesial sabe tornar clara a atitude que o Ressuscitado teve para com os discípulos de Emaús” e “às vezes predomina a tendência de oferecer respostas preconcebidas e receitas prontas, sem deixar que emirjam as demandas juvenis em sua novidade e apreciar a sua provocação” (parágrafo 8).
O documento aborda muitos temas: reconhece a “diversidade de contextos e culturas” dos padres sinodais, a partir da “diferença entre homens e mulheres com seus dons peculiares, as sensibilidades específicas e as experiências do mundo” (parágrafo 13), até o tema da “colonização cultural” (parágrafo 14), a partir do papel que a Igreja desempenha nas suas instituições educativas, acolhendo “todos os jovens, independentemente das suas preferências religiosas, origens culturais e situação pastoral, familiar ou social” (parágrafo 15), passando pela “família, ponto de referência privilegiado” (parágrafo 132), pela importância da maternidade e da paternidade (133), pelas potencialidades e perigos do ambiente digital (22-24) – um tema sobre o qual, além disso, no parágrafo 146 o documento enfatiza que o Sínodo “espera que na Igreja sejam instituídos nos níveis apropriados escritórios específicos ou organismos para a cultura e a evangelização digital” e também sugere “sistemas de certificação dos sítios católicos, para enfrentar a difusão de falsas notícias sobre a Igreja”.
Uma seção inteira é dedicada aos migrantes (25-28), e nela se destaca, entre outras coisas, que “graças às diferentes origens dos Padres, com relação ao tema dos migrantes, o Sínodo viu o encontro de muitas perspectivas, particularmente entre os países de partida e os países de chegada” e ressoou “o grito de alarme dessas Igrejas, cujos membros se veem forçados a fugir da guerra e da perseguição e que enxergam nessas migrações forçadas uma ameaça à sua própria existência. Justamente o fato de incluir todas essas diferentes perspectivas dentro da Igreja coloca a Igreja em posição de exercer um papel profético em relação à sociedade sobre a questão das migrações”.
O documento do Sínodo dedica uma seção ‘ad hoc’ a “todos os tipos de abusos”, esclarecendo que “o Sínodo insiste no firme compromisso pela adoção de rigorosas medidas preventivas que impeçam que se repitam, com base na seleção e na formação daqueles a quem serão confiadas tarefas de responsabilidade e de educação” (parágrafo 129). E “expressa gratidão àqueles que têm a coragem de denunciar o sofrimento sofrido: ajudam a Igreja a tomar consciência do que aconteceu e sobre a necessidade de reagir com firmeza”.
Diversas seções enfrentam várias faces da injustiça social: o mundo do trabalho continua a ser “uma área em que os jovens expressam a sua criatividade e a capacidade de inovação”, mas “ao mesmo tempo experimentamos formas de exclusão e marginalização” (parágrafo 40). As diferentes formas de violência e de perseguições que desafiam a Igreja (41), desde as situações de guerra até a criminalidade, passando pelos “diferentes tipos de perseguição, até a morte”, as dependências e a “marginalização” social (42). O documento lança luz sobre aspectos positivos, como o compromisso e a participação social dos jovens, sua paixão pela arte, pela música e pelos esportes.
No parágrafo 53, o documento final enfatiza que “o Sínodo está ciente de que um número considerável de jovens, pelas mais diferentes razões, não pede nada à Igreja, porque não a consideram significativa para a sua existência. Alguns, pelo contrário, pedem expressamente para serem deixados em paz, pois sentem a sua presença como chata e até irritante. Tal pedido, muitas vezes, não nasce de um desprezo acrítico e impulsivo, mas cujas raízes se encontram em razões sérias e respeitáveis: escândalos sexuais e econômicos; o despreparo dos ministros ordenados que não sabem captar adequadamente a sensibilidade dos jovens; a falta de cuidado na preparação das homilias e na apresentação da Palavra de Deus; o papel passivo atribuído aos jovens dentro da comunidade cristã; o cansaço da Igreja para justificar suas posições doutrinárias e éticas em relação à sociedade contemporânea”, diz o texto dos padres sinodais, que destaca o desejo dos jovens de serem protagonistas e seu desejo para que haja “um maior reconhecimento e valorização das mulheres na sociedade e na Igreja”.
O texto também explica que a Jornada Mundial da Juventude (que nasceu “de uma profética intuição de São João Paulo II, que continua a ser um ponto de referência inclusive para os jovens do terceiro milênio”), assim como os encontros nacionais e diocesanos, têm “um papel importante na vida de muitos jovens, porque oferecem uma experiência viva de fé e de comunhão” (parágrafo 16).
Em relação à sexualidade (149-150), “no atual contexto cultural – escreveram os Padres sinodais –, a Igreja não consegue transmitir a beleza da visão cristã da corporeidade e da sexualidade”. Temos necessidade de “uma busca de modalidades mais adequadas, que se traduzam concretamente na elaboração de caminhos renovados de formação. É necessário propor aos jovens uma antropologia da afetividade e da sexualidade capaz de dar o justo valor à pessoa, em todos os estados da vida. Trata-se de apostar na escuta empática, no acompanhamento e no discernimento, nos moldes indicados pelo Magistério recente. Por isso, é necessário cuidar da formação dos agentes de pastoral para que sejam confiáveis, a partir do amadurecimento de suas próprias dimensões afetivas e sexuais”.
Em relação ao tema da “diferença e harmonia entre a identidade masculina e feminina e as inclinações sexuais”, o Sínodo “insiste em que Deus ama a cada pessoa e a Igreja faz o mesmo, renovando o seu compromisso contra qualquer discriminação e violência de acordo com uma base sexual. Também reafirma a determinante relevância antropológica da diferença e da reciprocidade do homem e da mulher e considera redutora a definição da identidade das pessoas unicamente a partir da sua orientação sexual”. No que diz respeito mais especificamente à acolhida das pessoas homossexuais, “em muitas comunidades já existem caminhos de acompanhamento na fé”. O Sínodo “recomenda favorecer tais caminhos. Nestes caminhos, as pessoas são ajudadas a ler sua própria história; a seguir com liberdade e responsabilidade o próprio chamado batismal; a reconhecer o desejo de pertencer e contribuir para a vida da comunidade; a discernir melhores maneiras para realizá-lo”.
O Sínodo recorda também (153-154) que “a promoção da justiça” também está relacionada com a administração “dos bens da Igreja. Os jovens sentem-se em casa numa Igreja em que a economia e as finanças são vividas na transparência e na coerência. Necessita-se de decisões corajosas na perspectiva da sustentabilidade, como indica a encíclica Laudato Si’, uma vez que a falta de respeito pelo meio ambiente gera novas pobrezas, das quais os jovens são as primeiras vítimas. Os sistemas também mudam, mostrando que uma maneira diferente de viver a dimensão econômica e financeira é possível. Os jovens estimulam a Igreja a ser profética neste campo, com palavras, mas, principalmente, por meio de decisões que demonstram que é possível uma economia amiga da pessoa e do meio ambiente. Junto com eles, podemos realizá-lo”.
Com respeito às questões ecológicas, “será importante oferecer diretrizes para a concreta realização do Laudato Si’ nas práticas eclesiais”. Muitas das intervenções “destacaram a importância de oferecer aos jovens uma formação para o compromisso sociopolítico e o recurso que a Doutrina Social da Igreja representa a este respeito. Os jovens na política devem ser apoiados e encorajados para que ajam por uma mudança real nas estruturas sociais injustas”.
Os padres sinodais chegaram a propor (161) que todas as Igrejas particulares, congregações religiosas, movimentos, associações e outros sujeitos eclesiais ofereçam aos “jovens uma experiência de acompanhamento em vista do discernimento”. Uma experiência cuja duração pode variar de acordo com os contextos e as oportunidades, que pode ser qualificada como “um tempo destinado ao amadurecimento da vida cristã adulta. Deveria prever uma distância prolongada dos ambientes e das relações costumeiras e ser construída em torno de pelo menos três eixos indispensáveis: uma experiência de vida fraterna compartilhada com educadores adultos que seja essencial, sóbria e respeitosa da casa comum; uma proposta apostólica forte e significativa para viver juntos; uma oferta de espiritualidade enraizada na oração e na vida sacramental. Desta forma, são contemplados todos os ingredientes necessários para que a Igreja possa oferecer aos jovens que o queiram uma profunda experiência de discernimento vocacional”.
“Devemos ser santos – diz um dos parágrafos finais do documento (166) – para poder convidar os jovens a se tornarem santos. Os jovens pediram em voz alta uma Igreja autêntica, resplandecente, transparente e alegre: apenas uma Igreja de santos pode estar à altura de tais pedidos! Muitos deles a [a Igreja] deixaram porque não encontraram santidade nela, mas mediocridade, presunção, divisão e corrupção. Infelizmente, o mundo está indignado com os abusos de algumas pessoas da Igreja” em vez de ter descoberto “a santidade de seus membros: por isso, a Igreja como um todo deve realizar uma mudança de perspectiva decisiva, imediata e radical. Os jovens precisam de santos que formem outros santos, demonstrando assim que a santidade é o rosto mais belo da Igreja. Há uma linguagem que todos os homens e mulheres de qualquer época, lugar e cultura podem compreender, porque é imediata e resplandecente: é a linguagem da santidade”.
O documento, disse durante uma coletiva de imprensa o prefeito do dicastério vaticano da Comunicação, Paolo Ruffini, é dirigido, como indicou o Papa, aos próprios padres sinodais e ao Papa, e Francisco não decidiu, portanto, se fará parte do Magistério da Igreja.
Os 167 parágrafos ultrapassaram o quorum que oscilou entre 166 e 168 votos. Com 65 ‘non placet’ e 178 ‘placet’ foi aprovado o parágrafo mais polêmico, o 150, que afirma, entre outras coisas, que “já existem em muitas comunidades cristãs caminhos de acompanhamento na fé para pessoas homossexuais: o Sínodo recomenda favorecer tais caminhos”, que ajudam “cada jovem, sem exclusão, a integrar cada vez mais a dimensão sexual em sua própria personalidade, crescendo na qualidade das relações e caminhando para a doação de si”. Outro parágrafo polêmico, que obteve 51 ‘non placet’ e 191 ‘placet’, é o 121, sobre a “forma sinodal da Igreja”.
Nota de IHU On-Line: A íntegra do documento final, em italiano, pode ser lida aqui.
Veja a seguir a carta do Sínodo aos Jovens:
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Vocação pessoal e compromisso no mundo: o texto final do Sínodo - Instituto Humanitas Unisinos - IHU