03 Novembro 2018
O Sínodo dos bispos sobre os jovens tinha pela frente uma tarefa particularmente difícil por vários motivos. Acima de tudo, pela sua pouca representatividade, como já dissemos várias vezes. Prelados idosos, homens e celibatários, junto com poucos jovens externos e com poucas mulheres, e, além disso, estas com o status de quem não podia votar.
O comentário é de Vittorio Bellavite, coordenador do Nós Somos Igreja Itália, em artigo publicado no sítio do movimento, 31-10-2018. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Além disso, o assunto consistia em uma categoria muito sociológica, a dos jovens, precisamente, distribuída na generalidade da humanidade e que oferecia a ocasião e o pretexto para falar de tudo, de problemáticas de tipo psicológico ou social, até questões mais diretamente da Igreja, passando pelas linhas de tendência da convivência humana em relação ao futuro. Era justo invocar o Espírito Santo diante de tal tarefa!
O percurso escolhido para chegar à assembleia recém-concluída, de acordo com o bom senso, tentou envolver sujeitos externos ao circuito eclesiástico e fez bem. Em março, reuniu-se um pré-sínodo de jovens, um questionário foi divulgado online por muito tempo, e tudo isso permitiu preparar um documento preparatório, o chamado Instrumentum laboris, que, pelo menos no que diz respeito à realidade, não dizia palavras vazias, mas fazia análise.
A partir do andamento do Sínodo, não foi possível ter as intervenções individuais nas congregações gerais, mas apenas os textos de síntese das duas rodadas dos 14 Circuli minores, cada um deles constituído por cerca de 20 Padres sinodais autosselecionados com base no idioma. A leitura desses textos foi interessante para entender do que se estava falando.
No geral, a informação divulgada pelo Vaticano foi deficiente, facilitando a falta de atenção da mídia. Durante o seu desenvolvimento, organizou-se um lobby, com intervenções e apelos, para pedir que pelo menos as freiras presentes, superioras de ordens religiosas, pudessem ser admitidas ao voto, como seus colegas homens superiores de ordens masculinas. Isso não foi aprovado. Teria sido um fato muito importante, porque teria quebrado a lógica canônica da absurda proibição de papéis formalmente decisórios, atribuídos também ao sexo feminino.
O documento final, muito longo, votado praticamente por unanimidade, consiste em 167 parágrafos em 55 páginas. Será preciso torná-lo utilizável no difuso tecido do nosso mundo católico. Agora não é.
O excesso de consensos que ele reuniu pode também não ser considerado positivo, porque pode fazer com que se considere como patrimônio de todos orientações e linhas de intervenção que, depois, não o serão, de modo algum, sobretudo na gestão concreta.
Na primeira parte, o documento entrelaça pontos de análise com afirmações autocríticas explícitas e contemporâneas sobre as carências da Igreja. Acima de tudo, faltou a escuta, essa é uma consideração geral, os jovens não recebem a necessária atenção, existe uma situação de autoritarismo ou de paternalismo generalizado.
Depois, o documento reconhece as profundas diversidades de situações que dizem respeito aos jovens no mundo e as mudanças em curso, e, por fim, sem timidez, as profundas diferenças entre aqueles que gozam de uma condição de vida aceitável e aqueles que vivem às margens da sociedade. Fala-se da colonização cultural causada pela globalização em contextos não ocidentais, avaliam-se os aspectos positivos e negativos da secularização.
Em seguida, o documento faz afirmações interessantes e eficazes sobre a permeabilidade da internet e das redes sociais, sobre as suas oportunidades, sobre os seus muitos lados obscuros. Sobre os migrantes, faz as análises que devem ser feitas, sobre um fenômeno que é irreversível, sobre as fraturas nas comunidades de origem, sobre a mentalidade xenófoba que os migrantes frequentemente encontram aonde chegam e assim por diante.
A denúncia do clericalismo é abrangente e é seguida pela questão dos abusos de todos os tipos, de “poder, econômicos, de consciência, sexuais”. O Sínodo expressa “gratidão para com aqueles que têm a coragem de denunciar o mal sofrido”. A solução do problema dos abusos pode levar “a uma reforma de porte epocal”, mas a referência é genérica, não é o “j’accuse” intransigente sobre o abuso sexual dos menores que se esperava. Não chegamos lá!
Depois, chega-se à questão da sexualidade. “Não há uma adequada educação sexual.” Em seguida, referem-se todos os textos do magistério desde o Catecismo de 1992. Não se vai além das belas palavras, mas não se pode deixar de reconhecer que “a moral sexual é causa de incompreensão e de afastamento da Igreja, por ser percebida como espaço de julgamento e de condenação”. Sobre essa questão ultrassensível, o Sínodo não foi mais longe. Esse nos parece ser um ponto de fraqueza que será muito notado.
O texto completa a análise de vários aspectos da condição juvenil: o problema não é só o trabalho, mas também, às vezes, o mal-estar psicológico, a depressão, a cultura do descarte. Diante disso, há o protagonismo, talvez escasso na Igreja, mas presente na cidadania ativa, no compromisso social e político, no voluntariado, na vontade de justiça. E depois há a distância da Igreja, da qual se espera uma comunidade verdadeira, que, na sua ausência, facilita uma religiosidade privada e, às vezes, de tipo sincrético.
Junto com essa busca, o texto expressa explicitamente as dificuldades do mundo eclesial com um comportamento pastoral adequado: há pouco acompanhamento por ocasião do compromisso no campo político; a liturgia é bastante estranha à sensibilidade juvenil; percebe-se a desconfiança dos adultos; o diálogo, onde existe, deve ser menos paternalista; é inevitável a mudança no que diz respeito ao papel das mulheres; “prevalece às vezes a tendência a dar respostas pré-confeccionadas e receitas prontas”; a paróquia “custa a ter um papel relevante para os jovens, e é necessário repensar a sua vocação missionária”.
A segunda parte do documento, depois de dizer enfaticamente que os jovens são “um lugar teológico”, trata do acompanhamento, referindo-se, de várias maneiras e sobre várias temáticas, a assistência, também psicológica ou psicoterapêutica, ao crescimento humano e espiritual dos jovens, tanto individualmente quanto em grupos ou em associações.
O interessante sobre esse ponto é a afirmação de que ele “não está necessariamente ligado ao ministério ordenado. Há a necessidade de guias espirituais, pais e mães, com uma profunda experiência de fé e de humanidade. Também é preciso redescobrir a vida consagrada, em particular a feminina e de leigos, adultos e jovens”.
Para enfrentar esse possível caminho não paternalista, calibrado sobre os sofrimentos e as buscas de quem está à procura da própria estrada, as paróquias, segundo o texto, poderiam se equipar de um modo novo, até mesmo prescindindo da centralidade do padre. Não é pouca coisa e se apresenta como algo muito interessante.
Na última parte do documento, opta-se por propor a continuação do caminho iniciado com um método totalmente sinodal. De fato, “como as condições concretas, as possibilidades reais e as necessidades urgentes dos jovens são muito diferentes entre países e continentes, convidamos as Conferências Episcopais e as Igrejas particulares a prosseguirem esse caminho engajando-se em processos de discernimento comunitário e nas relativas deliberações, também aqueles que não são bispos”.
As possíveis orientações pastorais, assim elaboradas, deverão estar atentas aos marginalizados e a quem não está em contato com as comunidades eclesiais. O documento não usa palavras genéricas ao propor a sinodalidade: todos os sujeitos eclesiais devem contribuir ativamente com ela e, no que se refere aos jovens, deve estar prevista a participação nos lugares de corresponsabilidade nas Igrejas locais, nas Conferências Episcopais e na Igreja universal, levantando a hipótese também de um órgão de representação dos jovens em nível internacional no Vaticano.
Essa prática da sinodalidade e da busca de soluções compartilhadas não tem um horizonte unicamente eclesiástico, mas se projeta para as periferias do mundo para “responder ao duplo grito dos pobres e da Terra, tendo como inspiração a dignidade da pessoa, a destinação universal dos bens, a opção preferencial pelos pobres, a solidariedade, a atenção à subsidiariedade, o cuidado da casa comum”. São palavras pesadas de estilo totalmente bergogliano.
O documento continua retomando os pontos da primeira parte, mas dando indicações operacionais. Para a paróquia, que tem limites territoriais, é necessário repensá-la pastoralmente também pela sua incapacidade de ir ao encontro dos fiéis com propostas diversificadas. Nela, é preciso repensar a presença no território, a liturgia e a diaconia, os centros juvenis.
Chega-se a propor, no nível das Conferências Episcopais, um “diretório de pastoral juvenil”. Nas diversas situações, é preciso operar por “projetos”, não por compartimentos estanques.
O Sínodo está muito preocupado com o ambiente digital, propõe uma evangelização digital.
Sobre os migrantes, as palavras são inequívocas. É preciso defender o direito de quem não quer migrar e o de quem emigra e tem direito à acolhida. A palavra de ordem de toda a Igreja deve ser contra a xenofobia, o racismo e a rejeição dos migrantes, contra o tráfico de seres humanos.
Sobre o papel da mulher na comunidade eclesial, as palavras são claras em favor da mudança na prática pastoral cotidiana e do dever da sua participação nos processos decisórios eclesiais. Mas, diz o texto, “no respeito ao papel do ministério ordenado”. Mas este não é o tão depreciado clericalismo?
Era um Sínodo difícil no começo. A partir dessa constatação, fazem-se algumas primeiras observações de bom senso, com a reserva de novos aprofundamentos requeridos por uma temática tão vasta e importante. Parte-se do que falta e daquilo que está no início de um caminho que deverá ser percorrido.
É curioso que não tenha havido no Sínodo, entre as muitas coisas ditas, algo sobre o cenário das relações entre os Estados, os povos e os continentes, que está em fase de agravamento, particularmente nesses últimos dois ou três anos (o rearmamento nuclear, o relançamento do papel imperial dos Estados Unidos, a situação no Oriente Médio, a crise do papel da Europa com as novas identidades fechadas sobre si mesmas, a retomada do conflito Leste-Oeste etc.).
O fato de se colocar ao lado dos migrantes, contra o comércio de armas, pela proteção do ambiente etc. exige para todos, e para os jovens em particular (o futuro é deles!), que se tenha o quadro geral que determina ou agrava as situações específicas sobre as quais é preciso intervir. É o olhar sobre todo o mundo que o Papa Francisco tem.
Sobre a sexualidade, a situação parece estar congelada. Não se consegue ir além das belas palavras e das exortações gerais, mas esse é o centro da relação de muitos jovens com a Igreja. Poder-se-ia esperar pelo menos que se desbloqueasse a posição tradicional sobre a contracepção, que se reconhecesse que deveria ser abandonada.
Quanto aos homossexuais, após o impasse nos dois sínodos sobre a família, não se podia esperar mais do que o convite ao acompanhamento em todas as estruturas eclesiais. É positivo o fato de que não se diz nada contra o reconhecimento, em qualquer forma, das uniões entre homossexuais. Poder-se-ia esperar a sua demonização.
Em todo o texto, fala-se dos jovens como uma categoria única, sem qualquer distinção entre jovens homens e jovens mulheres. No entanto, haveria motivos para análises e propostas diferentes. Em particular, fala-se da diferença entre os dois sexos (números 13 e 150), “que pode ser um âmbito em que nascem formas de dominação, de exclusão e de discriminação”. E ponto final!
Mas e a condição particular de sujeição da mulher, especialmente das jovens, em grande parte do mundo, por serem submetidas ao peso do controle masculino, familiar e social? Não é uma questão central e tipicamente a cargo da mulher? Esse estado de subalternidade se manifesta às vezes em verdadeira violência real, não apenas sexual, e faz parte da vida cotidiana.
E como lidar com essa relação entre os dois sexos também entre os jovens? A diferença exige análises, hipóteses e propostas que não aparecem no documento final do Sínodo.
Quanto aos abusos sexuais, assunto que, mais do que todos os outros, afeta os jovens, parece que, no Sínodo, falou-se muito a esse respeito, mas, no documento final, há apenas algumas linhas gerais no número 29, que falam de todos os tipos de abuso.
Sinceramente, não se entende esse tratamento muito modesto em um documento tão longo e, às vezes, superabundante que se ocupa dos jovens. Eles são vítimas dos abusos que sempre ocorrem em ambientes católicos (oratórios, associações...) e usando da forte autoridade que confere o papel do padre.
É uma questão central para a credibilidade da Igreja, que está fortemente abalada por ela justamente nestes tempos. Há algo que continua não funcionando e que vem de muito longe.
Para entender, foi-nos lembrado que, no Sínodo de 1990 sobre a formação dos sacerdotes, não houve uma palavra sequer sobre os abusos, e a exortação pós-sinodal do Papa Wojtyla (documento de 60.000 palavras) ignora a questão. Porém, sabe-se com certeza que, em Roma e nas Conferências Episcopais, já havia centenas de denúncias e investigações em curso.
Como essas coisas são possíveis na nossa Igreja?
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Primeiras reflexões sobre o documento final do Sínodo dos bispos sobre os jovens - Instituto Humanitas Unisinos - IHU