14 Novembro 2024
Entre os textos aprovados na assembleia geral dos bispos franceses (5-10 de novembro de 2024), há dois que dizem respeito de perto os sacerdotes: sobre a confissão e sobre o acompanhamento espiritual. Eles foram elaborados em coerência com as indicações fornecidas pela CIASE, a comissão que trabalhou sobre o tema dos abusos.
O artigo é de Lorenzo Prezzi, teólogo italiano e padre dehoniano, em artigo publicado por publicado por SettimanaNews, 12-11-2024. A tradução é de Luisa Rabolini.
A confissão celebra o perdão e abre para a renovação da vida batismal. É o fruto da misericórdia de Deus e da ação do Espírito. As diretrizes dizem respeito à distinção entre o “foro interno” e o “foro externo”, o segredo sacramental, a absolvição e algumas indicações gerais.
O “foro interno” diz respeito à relação pessoal e íntima com Deus e é próprio da confissão, enquanto o “foro externo” se refere aos comportamentos e às atitudes públicas. Pede-se ao confessor uma prudência especial para não interferir na relação do penitente com Deus. É o Espírito que examina os corações e as almas, e o confessor é apenas uma testemunha “externa”.
Muito firme é a reafirmação do segredo confessional que a CIASE pedia para ser removido em casos de perigo imediato. Ele “torna possível uma palavra difícil, por mais pesada que seja. O segredo vincula o confessor e permite que o penitente se abra, sem duvidar de que o que for confidenciado possa ser usado contra ele ou contra outros”.
O sigilo sacramental tem um caráter absoluto mesmo quando a absolvição deve ser recusada. Ninguém pode liberar o confessor desse vínculo. Nem mesmo o penitente. No caso de uma vítima de abuso, o confessor aconselhará com gentileza a vítima a conversar com quem possa ajudá-la, aliviando-a de todo sentimento de culpa. Não existe “absolvição com condições”. Ela é assim e permanece assim. Mas isso não isenta o penitente de responder por seus atos e por suas consequências. “Em certos casos e sem recusar a absolvição, o confessor lembra (ao penitente) que a eficácia exige um ato de reparação em relação às vítimas”, como se denunciar às autoridades civis e eclesiais. Conselhos práticos
Entre as indicações mais práticas está o reconhecimento da conveniência de ouvir a confissão dentro de locais de culto, em ambientes preparados para isso. Em todo caso, em contextos visíveis de fora. Não se confessa no próprio quarto. As confissões noturnas são desencorajadas, a menos que estejam dentro de vigílias de oração compartilhadas. Elas devem ser evitadas em contextos emocionalmente carregados.
O tempo também é importante. Não devem ser muito longas. É bom que haja um sinal visível (crucifixo) e que o confessor use a estola. A relação sacramental não tolera uma familiaridade excessiva e o gesto de imposição não deve tocar o penitente.
O diálogo tem o objetivo de esclarecer a consciência do pecado e não é intrusivo. É uma escuta “casta”, livre de qualquer complacência, diferente daquela psicoterapêutica. Em uma nota de rodapé, é feita menção à excomunhão latae sententiae na absolvição “do cúmplice”, no caso da violação do segredo e de “instigação” do penitente.
É necessária uma formação inicial adequada para o confessor. Para exercer o sacramento, é necessário um mandato explícito disponível no 'celebret' (novamente previsto para o clero francês). Recomenda-se enfaticamente a formação contínua e a necessidade de informar os fiéis sobre o sacramento. Convidando-os também a denunciar atitudes ambíguas ou intrusões excessivas. A penitenciária diocesana é chamada a promover e a vigiar o bom exercício do sacramento.
O segundo documento diz respeito ao acompanhamento espiritual ou “direção” espiritual.
“É um serviço específico oferecido a uma pessoa que deseja livremente ser ajudada em sua busca por Deus, com relação à sua vida e escolhas para seguir Jesus, e na escuta do Espírito Santo. O acompanhante é uma pessoa formada (padre, diácono, leigo, religioso, religiosa) e reconhecida pela Igreja. Com a graça do Espírito Santo, tenta ajudar a pessoa a exercitar o discernimento para reconhecer as moções divinas, os apelos, o sentido do combate espiritual, um desejo de Deus em um ponto específico da vida cotidiana, bem como nos eventos.
O acompanhamento ajuda a pessoa a tomar livremente decisões, grandes ou pequenas, para viver de acordo com o Evangelho e conduzir sua vida na busca de verdade maior e liberdade maior.
O acompanhante verifica as expectativas do interessado e esclarece a diferença entre direção espiritual e confissão. Sua escuta é “benevolente”, facilita a palavra alheia. Acima de tudo, respeita a ação do Espírito que atua no crente. Encaminha a outros profissionais (médicos, psicólogos, conselheiros) quando as demandas mostram a presença de distúrbios de personalidade.
No caso de um abuso cometido ou sofrido, convida o interessado a procurar a justiça, informando-o de seu dever de denunciar o fato. Nunca decide no lugar da pessoa que está buscando acompanhamento e deve ter cuidado para não iniciar uma relação afetiva. Pode renunciar ao seu serviço se perceber que não está sendo útil.
Um bom diretor espiritual é, por sua vez, acompanhado em seu caminho e é chamado a adquirir uma formação adequada, encontrando lugares ou pessoas capazes de supervisionar seu serviço. O acompanhamento não pode ser feito para um número muito grande de pessoas e deve estar de acordo com as diretrizes sobre os abusos. Quem recorrer a um padre espiritual deve fazê-lo com plena liberdade, comprometer-se na continuidade e fidelidade e evitar um poder impróprio sobre sua pessoa. Continua sendo responsável por suas decisões e não é oportuno que acumule muitas referências. É chamado à discrição e a denunciar eventuais abusos, permanecendo sempre livre para interromper a relação.
O caminho desenvolvido exige, em certo ponto, uma verificação mútua sobre a fidelidade aos chamados de Deus, sobre a transparência com relação à ação do Espírito e sobre os frutos de bem produzido.
É uma boa norma que o diálogo não ultrapasse uma hora, e a frequência deve ser, por exemplo, mensal. O local para os diálogos deve ser sempre possível de ser aberto e as cadeiras ou poltronas não devem estar muito próximas. Não é cobrada nenhuma tarifa para esse serviço eclesial. A eventual oferta será destinada a uma obra da igreja ou da congregação.
Voltando à confissão, é útil reproduzir as palavras que o Papa Francisco proferiu de improviso aos confessores na Basílica de São Pedro na audiência de 11 de novembro, quando ele aludiu a uma grande obra de arte não visível, mas presente na igreja: as confissões.
“Por favor, que existam sempre, à disposição, os confessores. As pessoas vão, ouvem alguma coisa, até mesmo os não cristãos se aproximam para pedir uma bênção... Nesse mundo tão artístico e belo, há também a arte da comunicação pessoal. E, por favor, digam aos confessores que perdoem tudo, tudo! Tudo deve ser perdoado. O Senhor quer isso e não fazer discursos. “Você deve....”. Não, nada de “você deve”. Eu o perdoo e vá em frente, com o Senhor. Perdoar, não tanto pregar; algumas palavras devem ser ditas, mas perdoar; não deixar ninguém ir embora [sem a bênção]. Mesmo aqueles que não são cristãos, segundo me disseram os confessores, que muitas vezes são muçulmanos ou de outra religião, se aproximam e pedem uma bênção. Sempre deem a bênção a todos, àqueles que querem se confessar, perdoem todos, todos!”
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França: guia para os confessores. Artigo de Lorenzo Prezzi - Instituto Humanitas Unisinos - IHU