11 Dezembro 2023
Países historicamente resistentes mostram inflexão, mas negociações seguem em aberto.
A reportagem é publicada por Observatório do Clima, 10-12-2023.
No domingo (10/12), a dois dias do final da Conferência do Clima em Dubai, um encontro de líderes trouxe um fio de esperança para a pauta mais urgente e esperada das negociações. O Majlis (do árabe para conselho, assembleia) foi convocado pela presidência da COP28 para que os países apresentassem demandas, dificuldades e, principalmente, falassem abertamente sobre os nós que os impedem de avançar no Global Stocktake (GST, o balanço do Acordo de Paris) e seu ponto mais relevante (e polêmico): a eliminação gradual dos combustíveis fósseis.
Pela primeira vez, os países (representados por seus chefes de delegação, os ministros e ministras de meio ambiente) parecem caminhar para a aprovação de um texto que trate do tema, adotando nas resoluções a referência ao phase-out de fósseis. “A eliminação gradual de combustíveis fósseis é, afinal de contas, o mastodonte na sala aqui em Dubai. Não dá pra sairmos daqui chamando essa COP de sucesso se não tiver, no texto do GST, uma decisão de eliminar gradualmente os combustíveis fósseis”, analisou Claudio Angelo, coordenador de Política Internacional do Observatório do Clima.
Em (mais uma) fala contundente, Susana Muhamad, ministra de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável da Colômbia, reivindicou as conclusões da ciência sobre a emergência climática e a necessidade de comprometimento político com a eliminação dos fósseis e a redução de 43% nas emissões de gases de efeito estufa até 2030 para que a meta de estabilizar o aquecimento do planeta a 1,5ºC se mantenha viável.
“Não temos mais tempo a perder, porque precisamos atingir a meta até 2030 – ou então, viveremos um desastre. Quem diz isso é a ciência. Se realmente acreditamos na ciência, estamos muito atrasados”, afirmou Muhamad, em tom provocativo que acertou em cheio os destinatários. Assim que a ministra colombiana encerrou sua fala, Al Jaber, presidente da COP28 (e CEO da estatal petroleira emiradense), tomou a palavra para dizer que “nós respeitamos e reconhecemos a ciência”.
Antes disso, Muhamad apelou ainda para que os países não se percam no labirinto burocrático, prezando por uma decisão política que, uma vez tomada, possa ser traduzida nos termos das negociações e no texto final (as “linguagens” a serem adotadas). E insistiu na necessidade de um novo acordo econômico e financeiro global que possa transformar intenções em ação climática efetiva.
Como exemplo, citou a proposta de resolução sobre triplicar as energias renováveis globalmente, questionando de onde virá o incentivo para que países pobres, endividados e com piores condições de acesso a créditos internacionais possam implementar a medida. “Quando nosso presidente disse que não iria assinar novos contratos de exploração [de fósseis], nossa moeda desvalorizou na semana seguinte e as agências de risco procuraram nosso ministro de Finanças anunciando que iriam nos rebaixar, porque estávamos colocando em risco os recursos de segurança da nossa dívida. Como lidar com esses sinais contraditórios?”, questionou.
Uma das surpresas ficou por conta da Austrália, maior exportador de carvão no mundo, que defendeu ineditamente uma resolução sobre eliminação gradual de fósseis. A mesma sinalização veio dos países do G77 e, de maneira indireta, da China, maior emissora global. “Precisamos acelerar o passo para cumprir a meta de Paris. (…) Como temos diferentes pontos de partida, aquelas que estão mais à frente precisam ajudar os que vêm mais atrás”, disse o representante chinês.
Marina Silva, pelo Brasil, reforçou a necessidade de ações concretas e urgentes baseadas no consenso científico sobre a emergência climática. Defendendo o cruzamento entre ética, política e ciência, cobrou responsabilidades de todos. “Garantir o 1,5ºC é a missão de todos nós. Como viabilizar isso depende do compromisso político e ético. Nós já temos as respostas, o que falta é decisão política e compromisso ético”, disse.
“Sem isso, vamos continuar diagnosticando o problema e aplicando o remédio insuficiente”, completou a ministra de Meio Ambiente e Mudança do Clima brasileira, defendendo a aceleração de fontes renováveis e a desaceleração dos fósseis, para uma eliminação gradual dos últimos a ser iniciada pelos países desenvolvidos.
A Bolívia, que lidera a ala “linha-dura” dos países em desenvolvimento, ficou isolada em sua posição de, reivindicando as decisões já tomadas no âmbito do Acordo de Paris, negar uma resolução que avance para a eliminação gradual dos fósseis. “Não precisamos encontrar soluções diferentes do que já está no Acordo de Paris”, disse o chefe da delegação boliviana.
Arábia Saudita e Iraque, grandes produtores fósseis, insistiram na tese ilógica das “emissões sem fonte”, alegando que, já que o tratado do clima fala apenas em reduzir emissões, sem citar fontes específicas, não há motivos para uma resolução específica quanto aos fósseis. “Uma das divergências-chave que precisamos abordar se refere ao ataque às fontes de energia, e não às emissões”, criticou o representante saudita.
A nova versão de texto do Global Stocktake está prevista para ser apresentada nesta segunda (11/12), a um dia do encerramento oficial da conferência. A ver se as boas indicações feitas no Majlis se refletirão no novo texto e na decisão final em Dubai.
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Encontro de líderes faz aceno a acordo sobre eliminação de fósseis na COP28 - Instituto Humanitas Unisinos - IHU