"A história mostra que, sob pressão, o que sempre foi considerado impossível pode repentinamente tornar-se novamente possível... Como nosso continente pode ser transformado se enfrentarmos seriamente os desafios ecológicos em um mundo pós-crescimento?", questiona o economista francês
A reportagem é publicada por Religión Digital, 11-06-2023.
Giraud (Foto: Reprodução | Frame do YouTube de Telepace)
O economista, matemático, teólogo e fundador do Programa de Justiça Ambiental da Georgetown University (Estados Unidos), Gaël Giraud, apresentou a edição em espanhol de “A revolução suave da transição ecológica: como construir um mundo possível” (Sal Terrae) na Pontifícia Universidade de Comillas, livro que, segundo o autor, pretende sensibilizar para a emergência climática quando a sociedade se encontra submersa numa cegueira profunda.
Na apresentação, organizada pela universidade e pela editora Sal Terrae, Giraud defendeu "conciliar a velocidade da economia com a velocidade natural da natureza e da sua regeneração", porque o impacto ecológico do nosso modo de vida é superior à biocapacidade da regeneração do planeta. E exemplificou com alguns alertas. "Se não fizermos nada, em 2040 haverá 40% menos água potável na Espanha e na Itália e 20% menos na França: Roma pode ficar sem água em 2024. A água se tornará uma questão de segurança nacional", afirmou. Ele também ilustrou com a extração do cobre: “o pico da extração ocorrerá em 2060; depois vai custar muita energia e água e não vai ser possível aumentar a extração. Será um desastre, uma mudança no imaginário industrial”, garantiu.
Giraud defendeu a necessária colaboração entre os setores público e privado, e estabeleceu um valor para o investimento: “2% do PIB deve ser investido a cada ano no mundo até 2050 para realizar as mudanças necessárias para reduzir as emissões de gases de efeito estufa”. E alertou que “não é uma competição entre os dois setores, mas sim uma colaboração porque, caso contrário, será impossível concretizar o caminho para uma sociedade sustentável”.
Giraud também alertou sobre a gravidade do aquecimento global, a acidificação do oceano, a formação de um sexto continente com o lixo despejado no Oceano Pacífico, a elevação do nível dos mares e os rios que secam... “São consequências graves da emergência climática que hoje se tornou 'a' questão impossível de ignorar ou adiar”, reconheceu o autor.
Além disso, o autor francês tem defendido a redução do uso de plásticos (“bebemos um cartão de crédito por mês com a água que consumimos”, alertou, lembrando que o Vaticano reduziu o seu uso em 90%) e recomendou sermos mais sustentáveis reduzindo o consumo de carne (ele é vegetariano), comprando a comida certa e necessária para não desperdiçar (“a comida é produzida para 12 bilhões de pessoas e somos 8 bilhões de nós no planeta; 30% é desperdiçado”) e consumir produtos locais para evitar o impacto ecológico gerado pelo transporte.
"Bebemos um cartão de crédito por mês com a água que consumimos", alerta Gaël Giraud. (Foto: Aryfahmed | Canva Pro)
'A revolução suave da transição ecológica' está estruturado em diferentes partes. A primeira analisa os princípios fundamentais em que se baseia o entendimento de economia e finanças. “A profunda cegueira deste último em relação aos desafios ecológicos é parcialmente responsável pela cegueira política e midiática que envolve toda a nossa sociedade”, diz Giraud. De sua análise surge a questão de enorme alcance: como refundar nossa teoria econômica mais elementar? Podemos pensar em uma economia relacional que abarque a antropologia proposta por Fratelli tutti ou a cosmologia relacional cristocêntrica da Laudato si'?
A segunda parte fala dos becos sem saída em que a sociedade se encontra. Seu desejo de alcançar nós complexos é motivado pela busca de soluções. "A história mostra que, sob pressão, o que sempre foi considerado impossível pode de repente tornar-se possível novamente". Esta análise aprofundada é seguida na terceira parte pela proposta de algumas pistas para reconstruir a Itália e, consequentemente, a Europa: "Como transformar o nosso continente se enfrentarmos seriamente os desafios ecológicos em um mundo pós-crescimento?", Giraud se pergunta.
A última parte busca a luz da Igreja para reler suas propostas. “Nossa Igreja não é uma ONG nem um partido político, mas Jesus Cristo, o acontecimento relacional que a fundou, sempre a convidou a participar do debate democrático para reconhecer os becos sem saída em que se perdem nossos modos de pensar, estimular a criatividade das instituições e ações e defender as vítimas de nossos erros: os mais frágeis, aqueles com quem Jesus sempre se alinhará”.
Versão em espanhol do livro de Giraud. (Foto: Divulgação)
“As críticas que Gaël Giraud expressa em seu livro agitam, e isso é bom”, reconheceu Gonzalo Gómez Bengoechea, diretor do Departamento de Economia de Comillas, um dos responsáveis pela apresentação do livro. “Como analistas econômicos, devemos aproximar as pessoas da verdade no sentido mais amplo e ocupar o espaço entre o cidadão e a ciência, evitando que a política ou a mídia possam causar confusão”.
Por sua vez, Jaime Tatay, codiretor da Cátedra de Ciência, Tecnologia e Religião da Pontifícia Universidade de Comillas, que também participou da apresentação, destacou a capacidade de Giraud de explicar coisas complexas a um público não especializado e destacou "o potencial heurístico de conceitos teológicos que iluminam realidades como as econômicas”. A codiretora da mesma cátedra, Sara Lumbreras, participou neste diálogo on-line, coordenando as intervenções e fazendo uma ponte com o público.