20 Fevereiro 2023
O Pontífice recorda que as crianças ucranianas com quem se encontrou nos últimos meses “esqueceram como se ri”. "Viajar bem é ter grata lembranças" e, ao contrário, quando as lembranças são ruins corre-se o risco de adoecer e "agarrar-se aos fracassos da vida", precisamos “olhar para o horizonte” e “agarrar-nos à âncora da esperança” para ir em frente neste “momento ruim da história”. O Papa Francisco diz isso em uma nova entrevista conduzida por Dom Davide Banzato e centrada nas "viagens do coração".
A entrevista a seguir é de Iacopo Scaramuzzi, publicada por La Repubblica, 16-02-2023. A tradução é de Luisa Rabolini.
A entrevista está no centro do programa I Viaggi del Cuore con Papa Francesco, que será transmitido no Canal 5 no sábado, 18 de fevereiro, e também se tornou um livro publicado pela Piemme, em colaboração com a Editora do Vaticano, a ser lançado em 21 de fevereiro e intitulado Cerca il tuo orizzonte: rialzarsi e ripartire oggi (Busca teu horizonte: levantar-se e recomeçar hoje).
“Eu estava gravando um episódio do programa na Basílica de São Pedro e perguntei ao Papa se poderia ir cumprimentá-lo e apresentar-lhe a equipe. Era para ser um cumprimento simples, do qual nem tínhamos certeza, possivelmente uma mensagem por vídeo. Mas ele nos recebeu e ficou conosco por uma hora e meia”, conta o sacerdote. “Ele quis cumprimentar a todos, sentou-se, comecei a conversar: tive que improvisar as perguntas e no final percebi que tinha feito dez perguntas, e estamos a dez anos do início do pontificado. Foi uma grande emoção, tanto para mim como para a minha equipe: a maioria das pessoas não crentes ou de outros credos, mas emocionaram-se com as palavras do Papa, quando disse, por exemplo, que sonha com um Igreja evangélica, como nos primeiros tempos, um povo de pessoas que caminham juntas; ou quando lhe perguntei como, com todos os dramas internacionais que existem, consegue manter a paz no coração, e ele respondeu: 'O Senhor a guarda', e me explicou que às vezes também ele se sente inquieto, mas a inquietude pode ajudar a fazer perguntas interiores; ou quando, falando das crianças ucranianas com quem se encontrou nos últimos meses, por exemplo no hospital Bambino Gesù, percebeu que 'as crianças se esqueceram de como rir".
Francisco conta que entre pandemia, guerra, crise econômica, este é "um tempo difícil e um momento ruim da história", um tempo de "desolação humana". Mas também neste tempo é possível “olhar para o horizonte”, que “te dá coragem para caminhar”, e depois usa uma antiga metáfora sobre a esperança como âncora. Você pode explicar melhor?
"No que diz respeito às minhas perguntas sobre a atualidade, suas respostas são existenciais, ele vai aos fundamentos do cristianismo e da vida humana. São os temas que ele expõe na encíclica Fratelli tutti e que agora repropõe, com, em particular, três palavras-chave: o horizonte, porque sem horizonte não há orientação, não há propósito nessas densas trevas da história.
Depois recorda o que escreveram os Padres da Igreja, que "pensavam na esperança como uma âncora, por que tanto estando no mar como no rio, você joga a âncora para se sentir seguro e se agarra à corda. A esperança - a âncora – você a joga na eternidade e continua em frente nas tempestades agarrando-se a ela". Por fim, ressalta que como Igreja somos um povo em caminho, porque se não caminharmos juntos não sairemos disso".
Você perguntou ao Papa se havia "lugares do coração" aos quais ele estava ligado, e Francisco o levou fora "do assunto".
"Ele me falou sobre viagens no tempo, "viajar bem é ter gratas lembranças". Explicou como é importante voltar às próprias raízes, não esquecer de onde viemos, mas sem cair no erro de fechar-se em si mesmo e dar voz às próprias culpas e aos próprios fracassos. Nas gratas lembranças, porém, até os fracassos, os erros, até os inimigos foram aqueles que nos permitiram ser quem somos hoje". “Existe a possibilidade de se deparar com uma doença perigosa: apegar-se aos fracassos da vida”, diz Francisco.
"Ele é um grande psicólogo do humano: eu também gosto de defini-lo, como fez Fabio Fazio, um intelectual do coração. Ele é um grande conhecedor do ser humano, sempre viveu como um pastor entre as pessoas, e escolhe usar a linguagem de acordo com os destinatários, até de forma pop. Ele faz como fazia Jesus, que falava de modo diferente caso se dirigisse aos discípulos ou às multidões.
E sabe como tocar os problemas humanos atuais: a solidão, a depressão ou a "esclerocardia" a indiferença em relação aos outros. E explica, quando pergunto o que cada um de nós pode fazer diante de grandes dramas como a crise climática, que cada um pode se empenhar nas pequenas coisas, lembrando que somos administradores e não donos: se alguém tiver mais talentos, ou mais bens, é chamado a administrá-los bem, considerando-se depositário da confiança de Deus".
Às vezes, Francisco é criticado porque "se entrega demais", em entrevistas, coletivas de imprensa, televisão. O que você acha?
“Este Papa tem um aspecto único que poucos recordam, é o primeiro Papa filho do Concílio. Seus dois predecessores, João Paulo II e Bento XVI eram padres do Concílio, ele é filho, e o implementa, inclusive na comunicação. São Paulo teve as mesmas críticas, Jesus também... assim como Jesus e São Paulo usavam os areópagos da época, tenho certeza que também usariam os de hoje, como os meios de comunicação de massa. O importante é ter cuidado para usar as mídias sem deixar as mídias usarem você."
O especial Viaggi del cuore con Papa Francesco (Canal 5) acompanha a história do Papa com várias contribuições. Entre os convidados estarão o secretário do dicastério para a Doutrina da fé, monsenhor Armando Matteo, o vaticanista do Mediaset Fabio Marchese Ragona, a correspondente do Avvenire e especialista em América Latina Lucia Capuzzi, e dom Fernandez Artime, reitor-maior dos Salesianos.
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“O horizonte te dá coragem para caminhar”: a esperança do Papa Francisco num livro entrevista com Dom Davide Banzato - Instituto Humanitas Unisinos - IHU