22 Fevereiro 2024
"Um porta-voz de uma organização humanitária - que preferiu manter o anonimato - disse ao site que lhe foi solicitado um pagamento de 5.000 dólares por cada caminhão em trânsito. Seria uma 'taxa' pelo gerenciamento do tráfego, a ser paga a uma empresa afiliada aos Sons of Sinai (Filhos do Sinai), parte do império que é liderado, justamente, pelo Grupo al Organi."
O comentário é de Riccardo Cristiano, jornalista italiano, em artigo publicado por Settimana News, 19-02-2024.
Os mais recentes relatórios da imprensa internacional - sobre o lado do Sinai - destacam uma figura até então negligenciada: o empresário mais importante no governadorado egípcio do norte da região, Ibrahim al Arjani, proprietário de uma empresa importante - a al Organi - em ascensão nos serviços turísticos da península: construção e muito mais.
Ele é o chefe tribal dos Tarabin, leal ao general al Sisi. As empresas de al Arjani (ou Argani) agora estariam liderando os esforços para criar - por assim dizer - uma "zona de conforto" para aqueles que conduzem caminhões carregados de ajuda humanitária na fronteira egípcia, em direção à Faixa de Gaza.
Arjani já teria erguido vários escritórios, com fax, recepcionistas e muito mais. Certamente, havia uma necessidade de logística por aquelas bandas. Mas isso chamou minha atenção para o que foi escrito, não muito tempo atrás, pelo site Middle East Eye sobre o grupo al Organi, os caminhões e a ajuda. Um artigo que teve muitas compartilhamentos na web.
Um porta-voz de uma organização humanitária - que preferiu manter o anonimato - disse ao site que lhe foi solicitado um pagamento de 5.000 dólares por cada caminhão em trânsito. Seria uma "taxa" pelo gerenciamento do tráfego, a ser paga a uma empresa afiliada aos Sons of Sinai (Filhos do Sinai), parte do império que é liderado, justamente, pelo Grupo al Organi.
As operações do Grupo al Organi então remeteriam a diversas atividades realizadas em conjunto com duas empresas de propriedade do GIS, o Serviço de Inteligência Geral egípcio. No artigo publicado online em 30 de janeiro passado, lê-se que o porta-voz da ONG teria dito: "Trabalhamos em todo o mundo em tempos de guerra, terremotos e outros desastres, mas nunca fomos tratados assim por um Estado que lucra com o trânsito de bens humanitários e que está esgotando muitos de nossos recursos: a propina é por cada caminhão". Talvez essa ONG não tenha trabalhado na Síria, onde o governo especulou sobre a ajuda, usando principalmente a taxa de câmbio. Mas deve-se acrescentar que a agência da ONU que cuida dos refugiados palestinos declarou ao Middle East Eye que nunca recebeu tais solicitações.
Sobre esses negócios, do lado egípcio, também tratou, com coragem, o OCCRP, Organized Crime and Corruption Reporting Project, um grupo independente que pode-se presumir não ter uma vida fácil, assim como o site irmão Saheel Masr; segundo eles, há figuras intermediárias na fronteira que permitem a passagem de Gaza para o Egito, em troca de quantias entre 4.500 e 10.000 dólares americanos.
O Egito nega comportamentos incorretos: sobre isso também se pronunciou o chefe do Serviço de Informações Estatais. Permanece o fato de que lembramos das imagens das colunas de caminhões carregados de ajuda humanitária para a Faixa, bloqueados por dias entre Egito e Gaza. Agora, várias fontes de informação estão complementando essas imagens com depoimentos de palestinos que afirmam terem sido obrigados a pagar para obter os tão desejados permessi de trânsito.
A afirmação tem peso, assim como tem peso a objetiva dificuldade política em que se encontra o Egito, assim como os jornalistas chamados a prestar contas das condutas fáticas.
Os termos, lendo o que escreve em La Repubblica, em seu diário de Gaza, Samir al-Ajrami, são um pouco diferentes daqueles que se poderiam imaginar: por 5.000 dólares, você pode fugir, escreve ele, citando a companhia de viagens Hala, que faz parte do grupo al Organi. O relato desse jornalista - que vive em Gaza e que não vai fugir porque seu trabalho é ser jornalista - não se refere tanto a operações de agiotagem, que certamente existem, mas sim a possibilidades legais oferecidas pela agência Hala: "A agência tem um site para inscrição: o dinheiro é depositado na empresa do Cairo que coordena com todas as partes que controlam a passagem".
Portanto, estamos dentro da legalidade: toda noite é publicada uma lista de quem poderá partir no dia seguinte, que pela manhã pode então proceder. Quem não parte é reembolsado. Em seguida, o relato jornalístico aborda o problema dos vistos, que alguns países apoiadores dos palestinos não concedem.
Mas não é só isso. É agora sabido que fotos de satélite tiradas do norte do Sinai indicariam que nessa parte do território está sendo trabalhado intensamente para criar uma área equipada como um campo de refugiados, circunscrita por um muro que se diz ter cinco metros de altura e capaz de "hospedar" até 100.000 pessoas em poucos quilômetros quadrados.
Portanto, o contêiner fechado - construído, mais ou menos, no deserto - deveria servir para conter os palestinos fugindo desesperadamente de Rafah, no caso de conseguirem superar o muro que o regime egípcio, determinado a impedir o êxodo de palestinos de suas terras e sua entrada no Sinai adjacente, está preparando para impedir a fuga.
Quem escreve nestas horas que no norte do Sinai está surgindo um emirado independente do Cairo está exagerando, mas também é compreensível. Levada ao pé da letra, a tese parece pura fantasia política. Mas talvez a tese plausível seja que, depois de desempenhar um papel crucial na luta contra os terroristas do Isis no Sinai, al Arjani (ou Argani) já tenha um poder militar, econômico e tribal que o coloque acima ou além do controle estatal. É por isso que não é exagerado relatar isso.
Certamente as fotos de satélite comprovam que os trabalhos estão em andamento e há quem, como a Fundação Sinai para os Direitos Humanos, assegure que - sob anonimato - alguns trabalhadores afirmaram
que as obras estariam a cargo da Abnaa Sinai For Construction & Building, do grupo Organi, estabelecida em 2010 precisamente por al Arjani.
Al Sisi reiterou seu firme não ao ingresso de palestinos no Sinai, mas também afirmou que aqueles que conseguissem passar seriam tratados com humanidade. Enquanto isso, até agora, isso é o que parece emergir, na realidade.
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Diário de guerra (34). Egito e refugiados. Artigo de Riccardo Cristiano - Instituto Humanitas Unisinos - IHU