11 Dezembro 2023
No dia 27 de novembro, Christoph Theobald, teólogo jesuíta, compartilhou sua experiência como perito do recente encontro sinodal em Roma, durante uma noite co-organizada pela comunidade de Saint-Merry Hors-les-Murs [veja vídeo abaixo].
O comentário é de Blandine Ayoub, publicado por SaintMerry-Hors-les-Murs.com, 03-12-2023. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Christoph Theobald sugere que, acima de tudo, voltemos à famosa imagem do Vaticano II, a imensa nave da Basílica de São Pedro com suas fileiras de prelados e de clérigos, todos aparelhados e dispostos em vários níveis de acordo com seu cargo, antes de mostrar a imagem do recente encontro sinodal, em que grupos de uma dezena de pessoas, compostos por ministros ordenados, religiosos e leigos de ambos os sexos, falam ao redor de 36 mesas redondas, com roupas comuns: outro mundo.
(Notamos que os teólogos não foram incluídos sistematicamente em todos os grupos, como se dessem medo, mas pediram no Instrumentum laboris para serem incluídos).
Foram abordados cinco módulos temáticos sucessivos, divididos em três etapas, segundo uma metodologia bastante moderna: uma primeira “rodada” em que cada um devia permanecer em silêncio para escutar a pessoa que falava; depois, um debate em que cada um dizia o que entendeu como ressonância; por fim, elaborava-se uma lista em quatro partes: aquilo sobre o que havia acordo; aquilo sobre que não havia; os assuntos que ainda precisavam ser aprofundados; as propostas concretas que já podem ser feitas. A liberdade começa pelo fato de se escutarem uns aos outros, o que pressupõe ter os meios para fazer isso: a sinodalidade começa aqui, na base.
Christoph Theobald afirma o potencial de autorreforma da Igreja. Constata uma verdadeira libertação da palavra, a experiência efetiva de uma nova comunicação na Igreja, depois do bloqueio sobre certos temas sobre os quais era proibido falar durante o último pontificado (como a ordenação das mulheres); um novo clima permite que se possa respirar e se expressar.
Ele também percebeu uma verdadeira capacidade de escuta, talvez até uma abertura à possibilidade de mudar de opinião, uma vontade para tratar dos assuntos, o que, segundo ele, já é um início de reforma. E verdadeiros momentos de emoção puderam ser compartilhados durante alguns testemunhos.
Entre os assuntos que geralmente são objeto de consenso geral, pode-se citar a noção de igualdade na dignidade batismal entre todos os cristãos, ou uma certa “continentalização” da Igreja Católica para permitir que as diferenças culturais sejam levadas em consideração.
As tensões e diferenças são diversas: sobre a hospitalidade eucarística; sobre o lugar das mulheres, sobre a autoridade delas na Igreja, sobre o acesso delas ao diaconato; sobre o celibato dos padres, sobre o diaconato permanente, sobre a participação de padres que deixaram o ministério após serviços ligados à pastoral; em suma, temas ligados à eclesiologia, à antropologia e aos estilos de vida, em particular a questão LGBTQIA+.
Notou-se um leque de pontos de vista sobre o diaconato feminino, que ia desde aqueles que se opõem a ele em nome da tradição, até aqueles que o justificam em nome da prática estabelecida pelas primeiras comunidades, passando por aqueles que o veem como um sinal dos tempos. Duas comissões não conseguiram abordar esse tema, mas também será preciso chegar a uma conclusão, como salientou Timothy Radcliffe. Por sua vez, há um consenso sobre a necessidade de dar espaço às mulheres no governo.
Os alemães desempenharam um grande papel nisso: os delegados de seu sínodo nacional se inseriram muito bem no processo e foram aplaudidos; suas contribuições foram levadas em consideração na síntese final: avançaram no debate sobre as questões de transparência no governo, de eleição e de controle dos bispos, do papel de seus conselhos, da separação dos poderes – já que hoje o bispo é ao mesmo tempo pai e juiz, e acumula o poder da ordem e o da jurisdição.
Manifestou-se claramente a possibilidade de reforma, e a reforma do Direito Canônico está sobre a mesa: tendo já começado no que diz respeito aos problemas de delinquência e de disciplina, ela certamente exigirá muito tempo, quer se prossiga abordando todos os temas juntos, quer se proceda por partes sucessivas, porque o trabalho é enorme.
Em 2015, o papa expressou uma tese básica: a sinodalidade é uma dimensão constitutiva da Igreja; e, além disso, é o marco mais adequado para levar em consideração o caso do clero e dos ministérios. Resta a pergunta: por que existe um ministério ordenado? As frágeis respostas dizem o seguinte: todas as religiões têm sacerdotes, ou todas as associações têm dirigentes, é mais interessante ver nisso o símbolo da convocação de Deus. Isso nos leva diretamente ao debate sistêmico do clericalismo.
A ideia de organizar cursos de formação comuns para clérigos e leigos foi apresentada como desejável. Mas estamos apenas no início de um processo de mudanças gigantescas, cuja conclusão a nossa geração certamente não verá.
Constatou-se um grande dinamismo provenientes da Igreja da América Latina em comparação com uma verdadeira fragilidade da Europa. Concretamente, surge a questão dos ministérios: alguns catequistas sul-americanos também governam suas comunidades. Perguntou-se se é sempre o padre quem deve pregar, e por que não leigos, homens e mulheres. De uma forma geral, pode=se constatar que é possível movimentar as coisas pouco a pouco, utilizando linhas de falha – e não fazendo terra-arrasada –, o que implica escutar uns aos outros para além das fortes divisões.
Em resposta aos diálogos, o papa propõe “promover uma teologia do futuro”. Sugere uma teologia indutiva, a partir das experiências: trata-se de levar a sério a vivência como lugar teológico, na comunidade e na sociedade; pensar as experiências, como se pratica na América Latina.
É claro que há um risco de cisma com os tradicionalistas, entre os quais há alguns bispos que expressaram algumas “dubia” antes do Sínodo, e dos quais um órgão de imprensa publicou ilegalmente uma versão não definitiva do documento final para criar a divisão.
A primeira versão da síntese final foi seguida por 1.254 emendas, todas examinadas [...]. Quanto ao papa, ele já teve a oportunidade de dizer a importância que atribui à “busca comum da verdade” e que “não tem medo dos cismas”.
Não houve uma verdadeira representação intergeracional nessa sessão: foi pedido que se convidasse um maior número de jovens representantes das novas gerações e que se reforçasse a presença ecumênica na sessão seguinte.
O documento final de 43 páginas provavelmente nunca será lido nas paróquias: Christoph Theobald recomenda fazer um resumo pedagógico de cinco páginas para divulgá-lo e promovê-lo. Propõe também a leitura da primeira parte do documento de síntese para refletir sobre ele agora nas comunidades paroquiais, segundo o método da conversação no Espírito, pois a sinodalidade é o modo de ser Igreja; o que pressupõe uma conversão das mentalidades, o que levará tempo, mas “é ‘O’ critério”.
Resta elaborar a cultura do debate, da argumentação, para não cair em discussões que não levam a nada – assim como os princípios da Ação Católica (ver, julgar, agir) inspiraram o espírito do Vaticano II em sua época. O papel das Ciências Humanas foi claramente aceito no processo; o próprio termo “discípulo” se refere a quem aprende: a Igreja, de fato, continua a aprender, o que é particularmente importante reconhecer neste período pós-Ciase [comissão independente sobre os abusos sexuais na Igreja na França], e constitui em si um ato de fé.
Guy Aurenche concluiu: que a reformabilidade da Igreja e uma liberdade de expressão redescoberta possam nos levar à teologia do futuro, praticando a sinodalidade com base na escuta e na confiança, e nos ajudem a fazer gestos de corresponsabilidade batismal, experimentando a alegria do caminho.
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O Sínodo visto por Christoph Theobald - Instituto Humanitas Unisinos - IHU