13 Março 2011
A análise da conjuntura da semana é uma (re)leitura das "Notícias do Dia’ publicadas, diariamente, no sítio do IHU. A análise é elaborada, em fina sintonia com o Instituto Humanitas Unisinos - IHU, pelos colegas do Centro de Pesquisa e Apoio aos Trabalhadores - CEPAT - com sede em Curitiba, PR, parceiro estratégico do Instituto Humanitas Unisinos - IHU.
Sumário:
Pós-Consenso de Washington
Salário Mínimo e Bolsa Família. Decisões contraditórias?
Ajuste fiscal. Recado para o mercado
Bolsa Família. Focalização da pobreza?
Pós-Consenso de Washington e o papel do Estado
Os grandes potentados ganham mais
Modelo fordista tardio
Agenda esquecida
Conjuntura da Semana em frases
Eis a análise.
Pós-Consenso de Washington
Salário Mínimo e Bolsa Família. Decisões contraditórias?
De um lado, a postura relutante e inflexível na negociação do salário mínimo; de outro, o aumento no valor do benefício Bolsa Família. Dureza de um lado e generosidade de outro? Como se explicam duas decisões aparentemente contraditórias? Essas decisões tomadas num curto espaço de tempo são compreendidas quando interpretadas a partir do "Pós-Consenso de Washington".
A expressão foi cunhada pelo diretor do Banco Mundial Vinod Thomas. Segundo ele, o "Pós-Consenso de Washington" é a junção da aplicação da ortodoxia econômica – disciplina fiscal e monetária – com a adoção de programas sociais. O Banco Mundial e o FMI vibraram com os primeiros meses do governo Lula – a prova, segundo as organizações, de que é possível juntar o econômico com o social.
Na opinião de Vinod Thomas, falando do governo Lula em 2003 [n. 1], "já existe uma nova direção que considera os pontos do Consenso de Washington (ajuste fiscal, privatização, desregulamentação) como um componente específico dentro de algo mais amplo". Continua o diretor do Banco Mundial: "A crítica que se faz é a de que o Consenso de Washington [n.2] sozinho não é apenas insuficiente, mas contraproducente. Porque, se a parte social não muda, não se consegue nem as melhorias econômicas pretendidas pelo Consenso de Washington. Então o pós-Consenso de Washington, ou, para alguns, o novo Consenso de Washington, seria o social junto com a economia e a política, e não depois", disse o diretor do Banco Mundial.
Foi isso que Lula fez, principalmente em seu primeiro mandato. De um lado, a aplicação dos fundamentos da disciplina fiscal e monetária e, por outro, políticas sociais de caráter, sobretudo, compensatórias. É o que Dilma está reeditando agora em seu início de governo. Como destaca o ministro Gilberto Carvalho, "Dilma tem outro estilo, mas a mesma linha".
Por "outro estilo", entenda-se a discrição da presidenta, a não aparição em público e a ausência de entrevistas e, por "mesma linha", a continuidade do modelo econômico do governo Lula. Há, porém, aqueles que interpretam que Dilma tende a radicalizar ainda mais o "Pós-Consenso de Washington". As medidas do começo do mandato seriam um indicativo dessa tendência.
As duas primeiras grandes decisões do governo Dilma foram a aprovação do salário mínimo de R$ 545,00 e o anúncio do corte de R$ 50 bilhões do orçamento de 2011. Anteriormente a essas decisões, ainda em janeiro, o Comitê de Política Monetária (Copom) já havia aumentado a taxa Selic em 0,5 ponto percentual, para 11,25, e nos últimos dias anunciou um novo aumento de 0,5% elevando a taxa para 11,75% ao ano. Tudo indica que o aperto monetário se estenderá por todo o ano.
Os cortes no orçamento que atingem a área social, como o programa Minha Casa Minha Vida, a inflexibilidade na negociação de um salário mínimo maior, o aumento na taxa de juros e a busca de um superávit maior, indicam medidas de ajuste macroeconômico restritivo, ou seja, trata-se de sinalizar para o mercado que o governo não se descuidará do ajuste fiscal.
Ajuste fiscal. Recado para o mercado
As medidas fiscalistas – redução de gastos – anunciadas pelo governo se traduzem na prática num tranco na economia para desaquecê-la, ou seja, o governo tem receio de que com a economia aquecida, a inflação fuja do controle. Esse é o discurso governamental para justificar as decisões dos "cortes na carne".
"Todo mundo sabe que em 2009 e 2010 nós enfiamos o pé no acelerador para sair da crise. Desoneramos, estimulamos, fizemos concessões de toda sorte. 2011 se afigura como um ano em que você precisa controlar. A inflação está batendo na porta", disse o ministro Gilberto Carvalho. "Temos que mandar um sinal claro para a sociedade de que o governo não vai brincar com a economia, não vai aceitar a indexação, porque, no fundo, se tem um prejuízo grande para o trabalhador é a inflação", disse ele.
Há, entretanto, outra motivação nem sempre explicitada com o ajuste fiscal: o recado para o mercado de que não se descuidará do pagamento dos débitos da dívida pública, sobretudo interna.
Dilma repete o governo Lula quando do início do seu governo. Lula quando assumiu o governo em 2003 deu um "cavalo-de-pau na economia", nas palavras do então poderoso ministro da Casa Civil José Dirceu [n.3]. Por "cavalo-de-pau’, entenda-se o aumento da taxa de juros de 25% para 25,5% e depois 26,5%. O aumento do superávit primário de 3,5% para 3,75% e posteriormente para 4,25%, e cortes no orçamento no montante de R$ 14 bilhões que chegaram a atingir a área social. O "cavalo-de-pau’ foi dado com receio de que a crise econômica se agravasse com a inflação recrudescendo, o dólar a R$ 4,00 e o risco Brasil aumentando. Fez parte ainda desse pacote de Lula, o anúncio do banqueiro Henrique Meirelles para presidir o Banco Central. O conjunto das medidas tinha um endereço: acalmar o mercado financeiro. Destaque-se ainda que a primeira grande Reforma do governo Lula foi a da Previdência, para cortar gastos.
As medidas de caráter fiscalista de Dilma têm o mesmo objetivo. Uma importante corrente do mercado financeiro, aliás, já vê a necessidade de que a freada na economia brasileira se estenda até o final de 2012. Estão de olho nos ganhos que terão com o aumento das taxas de juros. Notícias recentes dão conta de que os bancos tiveram lucro recorde na Era Lula: R$ 199 bilhões.
As medidas neoliberais de Dilma reacenderam divergências internas no PT e na base aliada. Raul Pont, um dos nomes fortes da DS [corrente interna do PT] disse que o partido "deve chamar o Mantega para pedir explicações". Altamiro Borges, integrante do Comitê Central do PCdoB, divulgou um artigo no qual dizia: "As velhas teses ortodoxas voltaram a ganhar força no Palácio, sob o comando do todo poderoso ministro Antonio Palocci". O presidente da CUT Artur Henrique, também protestou: "Sou contra a ideia de que o único instrumento para controlar a inflação é o aumento da taxa de juro com redução da demanda".
Mantega, tido como desenvolvimentista e avalista, junto com Palocci [Casa Civil] e Alexandre Tombini [Banco Central], das novas medidas já vem sendo descrito como um "desenvolvimentista fiscalista".
Bolsa Família. Focalização da pobreza?
Após as medidas fiscalistas, Dilma Rousseff anunciou um aumento no benefício do Bolsa Família. Segundo o Ministério do Planejamento, o aumento do Bolsa Família "não compromete a consolidação fiscal e a redução de despesas previstas para 2011", referindo-se ao bloqueio de R$ 50 bilhões. Com o reajuste, o benefício médio pago passará de R$ 96,00 para R$ 115,00.
Destaque-se que o aumento do Bolsa Família foi apenas possível com cortes em outras áreas, inclusive de áreas sociais. Cerca de R$ 340 milhões inicialmente destinados a programas de combate ao trabalho infantil e à violência sexual contra crianças e adolescentes foram remanejados para o Bolsa Família.
O aumento do Bolsa Família pode ser compreendido, por um lado, como uma iniciativa para amenizar as repercussões negativas da postura inflexível do governo com o aumento do salário mínimo e, por outro, como cumprimento da promessa da presidenta de "erradicar a miséria" no país. Outra interpretação, entretanto, é de que mais do que iniciativas de ordem conjuntural político-econômica, as medidas aparentemente desconexas seguem o modelo do "Pós-Consenso de Washington".
Na análise da Auditoria Cidadã da Dívida, as medidas de Dilma, seguem o receituário do Banco Mundial, de continuidade das políticas neoliberais – principalmente o ajuste fiscal –, mas com pequenas concessões focalizadas aos mais pobres, legitimando o sistema, o que se convencionou chamar de "Novo Consenso de Washington".
A análise é compartilhada por José Antônio Moroni, do Inesc, para quem o governo Dilma indica um retrocesso significativo na área de combate à desigualdade. Segundo ele, "a primeira medida do governo Dilma nesta área foi pedir uma nova definição da linha da miséria e da pobreza onde o único critério é o da renda per capta da família. Está havendo a subordinação da lógica social à lógica econômica, e uma economista dirige o Ministério de Desenvolvimento Social. Parece uma reedição do discurso dominante na década de 90, com belas fórmulas e números para combater a miséria", diz ele.
Para Moroni, "esta estratégia de combate à miséria/pobreza leva a uma personalização das políticas públicas. Centrada no indivíduo, tira a possibilidade de serem instrumentos de fortalecimento dos sujeitos políticos ou mesmo da organização desses cidadãos/ãs, podendo interferir nas decisões políticas e nos espaços de poder. Essa estratégia de combate à miséria não incorpora a dimensão participativa, ou seja, a organização política dos "usuários’ dessas políticas públicas", afirma.
O pesquisador destaca que "o discurso do governo Dilma sobre a desigualdade (econômica), de certa forma, caminha na mesma direção do discurso e estratégias de algumas agências de cooperação. Isso pode enfraquecer o campo que defende os direitos humanos como elemento fundamental no combate a todas as formas e processos de desigualdades".
A citação da ideia da focalização na mitigação da desigualdade social a que se referem a Auditoria Cidadã da Dívida e José Antônio Moroni, diz respeito a um Relatório do Banco Mundial para América Latina e Caribe divulgado de 2006 que "recomenda que os países tornem mais equitativos os seus programas de gastos públicos, dirigindo-os às pessoas que realmente precisam deles". O Bolsa Família, no relatório, é citado pelo Banco Mundial como política exemplar de focalização e combate à desigualdade social.
É importante registrar que o Bolsa Família representa 0,5% do PIB. Na opinião do economista Guilherme Delgado, "não é com 0,5% que se realiza o programa de melhoras declarado pelo governo". Para ele, "o combate à pobreza se faz com políticas sociais". Há um consenso de que o salário mínimo e os aumentos reais que sobre ele incidem distribuem mais renda do que o Bolsa Família.
Decisões diametralmente opostas sobre temas sociais como o salário mínimo e o Bolsa Família explicam-se, portanto, pela adoção do modelo do "Pós-Consenso de Washington". Aquilo que é contraditório ganha lógica.
Pós-Consenso de Washington e o papel do Estado
Seria um erro, porém, considerar que o governo Dilma, assim como o governo Lula, sustenta-se apenas com programas sociais de caráter compensatório como o Bolsa Família. O outro lado do "Pós-Consenso de Washington" é a forte atuação do Estado como indutor do crescimento econômico.
No Consenso de Washington, o Estado era considerado um estorvo e empecilho para o crescimento da economia, o mesmo tinha que ser afastado das tarefas de gestão da economia. O governo Fernando Henrique Cardoso assumiu com vigor a agenda do Consenso de Washington e seguindo seu receituário rompeu com o modelo de desenvolvimento dos anos 1930 no qual o Estado jogou um papel decisivo. A agenda fundada no período FHC se orientou pelo trinômio: abertura econômica, privatização e desregulamentação do Estado.
Agora, no Pós-Consenso de Washington assiste-se a uma retomada do papel do Estado como importante protagonista no crescimento econômico. Prova disso são os crescentes investimentos e empréstimos realizados pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico Social – BNDES. O BNDES é hoje a grande alavanca do capitalismo brasileiro. Está por detrás das grandes obras de infraestrutura e dos empréstimos para criar e/ou fortalecer as empresas "gigantes" de capital privado nacional que competem no mercado internacional.
Foi a forte ação do Estado na economia nacional associado aos programas sociais que contribuiu decisivamente para a eleição de Dilma Rousseff. Agora, a presidente, esforça-se em manter a "mesma linha". O governo Dilma propõe manter ações focalizadas de combate à miséria e dar continuidade aos investimentos do Estado. Dando seguimento ao modelo Pós-Consenso de Washington, Dilma lançará em breve o Plano Nacional de Erradicação da Miséria e anunciará ações do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) com destaque para investimentos do pré-sal e obras na preparação das 12 cidades-sede para a Copa do Mundo de 2014.
Os grandes potentados ganham mais
O modelo do Pós-Consenso de Washington, que reúne ações mitigadoras da desigualdade com um Estado forte na economia – Estado neodesenvolvimentista –, está aquém das demandas do movimento social.
As críticas de parte dos movimentos sociais ao modelo implementado por Lula e agora reeditado por Dilma são duas: a primeira, de que esse modelo tem favorecido sobretudo o grande capital, e, segundo, de que o modelo é tributário de um padrão fordista de desenvolvimento com agravantes para a crise ambiental.
Sobre as benesses do modelo do Pós-Consenso de Washington para o grande capital, pipocaram notícias nas últimas semanas: os bancos tiveram lucro recorde na Era Lula – R$ 199 bilhões; assim como o agronegócio foi beneficiado pela generosidade do Estado – os usineiros receberam mais de R$ 28 bi do BNDES nos últimos oito anos. Também o capital industrial teve crescimento jamais visto e recebeu volumosos aportes do BNDES. Efetivamente, o Pós-Consenso de Washington resultou numa reorganização do capitalismo brasileiro, onde os grandes potentados – agronegócio, finanças, grande indústria, oligarquias – continuaram sendo os que mais ganharam.
Por outro lado, milhares ascenderam socialmente, melhoram sua renda e passam a consumir mais. Fala-se do surgimento de uma nova classe média brasileira – 22,7 milhões de brasileiros mudaram de patamar de renda, sobretudo, nos últimos cinco ou seis anos. A crítica, porém, de parcela do movimento social é de que o crescimento da economia não resultou necessariamente no enfrentamento e na resolução dos problemas estruturais brasileiros – saúde, educação, saneamento –, que permanecem deficitários.
Modelo fordista tardio
Por outro lado, alertam alguns movimentos sociais, o modelo levado a cabo por Lula e agora continuado por Dilma dá as costas para a problemática ambiental. É um modelo fordista, refém da segunda revolução industrial que investe pesadamente em matrizes energéticas centralizadoras e poluidoras (fósseis), perigosas (nuclear) ou devastadoras do meio ambiente (hidrelétricas), ao mesmo tempo em que exigem enormes investimentos.
Joga papel determinante no modelo fordista de desenvolvimento brasileiro o BNDES como o grande investidor, financiador e subsidiário das grandes obras de infraestrutura energética e outras – apenas em 2010, o banco liberou R$ 168,4 bilhões. A pujança vista nos desembolsos, porém, não se repete na área de sustentabilidade do banco, dizem os movimentos sociais.
Ao financiar grandes projetos de infraestrutura no norte do país e empreendimentos sucroalcooleiros no Centro-Sul, o banco vem sendo criticado por organizações civis e é alvo também de uma série de ações movidas pelo Ministério Público (MP). A política socioambiental do BNDES é vacilante, diz estudo do Centro de Monitoramento de Agrocombustíveis (CMA), da ONG Repórter Brasil intitulado "O BNDES e sua política socioambiental - Uma crítica sob a perspectiva da sociedade civil organizada".
O estudo cita as usinas hidrelétricas de Santo Antônio e Jirau, em Rondônia, que recebem o suporte de R$ 13,3 bilhões do BNDES, e tem sido alvos de pesados questionamentos quanto à sua viabilidade econômica e ambiental. Na mesma direção, o projeto hidrelétrico de Belo Monte, no rio Xingu, Pará, é outro caso de destaque. No ramo sucroalcooleiro, chamam a atenção os casos das usinas da Brenco (que tem como sócia o BNDESPar, braço de investimentos em participações acionárias do banco) e da Cosan, em que foram libertos trabalhadores em situação análoga à escravidão.
Outro projeto com aportes do BNDES e que tem recebido pesadas críticas do movimento social são as obras de transposição do rio S.Francisco. Relatório da Plataforma Dhesca Brasil – Rede Nacional de Direitos Humanos afirma que a obra gera vários problemas: falta de água potável, falta de titulação e demarcação das terras dos quilombolas e indígenas, falta de escolas, de posto médico, estão entre os exemplos de violação dos direitos humanos acarretadas pelo projeto.
Entre as denúncias, o documento destaca que estudos antropológicos dos povos indígenas Truká e Tumbalalá não foram finalizados e já perduram por muito tempo, cujos territórios não são reconhecidos e nem demarcados, na sua integralidade. Essas áreas, ou serão inundadas ou impactadas por essas obras na região. E diante dessas incertezas têm ocorrido conflitos entre esses povos indígenas e os órgãos governamentais.
A questão ambiental tem sido negligenciada pelo governo. Além da polêmica em torno das grandes obras de infraestrutura, a imprensa informa – notícia não confirmada e tampouco desmentida pelo governo – do projeto de redução em quase 90% da distância mínima exigida entre plantações de milho transgênico e unidades de conservação – parques florestais. A flexibilização constaria de decreto já negociado entre os ministérios do Meio Ambiente e da Agricultura e a ser editado em breve pela presidente Dilma Rousseff, destaca a imprensa.
Hoje nenhuma lavoura de milho geneticamente modificado pode ser plantada a menos de dez quilômetros da divisa dos parques nacionais e reservas biológicas. Com a nova norma, o plantio seria permitido a 1.200 metros. Caso se confirme o anúncio de que o governo brasileiro irá facilitar a plantação de milho transgênico próximo a parques florestais é um profundo desrespeito a luta do movimento social brasileiro, particularmente da Via Campesina que teve um de seus militantes, Valmir Mota, o "Keno’, assassinado por milícias a serviço da Syngenta Seeds que mantinha um campo experimental de transgênicos próxima ao Parque Nacional do Iguaçu no oeste do Estado do Paraná, destaca em artigo Cesar Sanson, pesquisador do Cepat.
A postura vacilante do governo com a agenda ambiental manifesta-se ainda na ausência de posição clara do governo acerca do projeto de lei que pretende flexibilizar o Código Florestal. O silêncio do governo faz pensar que o mesmo é conivente com a proposta dos ruralistas.
O modelo fordista de desenvolvimento brasileiro aposta, subsidia, financia e investe nas commodities primárias, o que explica a ampliação das plantations de monocultura como a soja e a cana-de-açucar. O Brasil caminha para ser o maior produtor de transgênicos do mundo e já se constitui no maior produtor e exportador de etanol. "Hoje, o mercado clama por mais 15 grandes usinas de cana", afirma especialista na área.
A opção pela ampliação de monoculturas como a soja e a cana-de-açucar pressionam as áreas agricultáveis de alimentos, assim como outra commoditie campeã brasileira, a exportação de carne bovina, que pressiona o bioma da floresta amazônica e está entre as principais causas do desmatamento e queima da floresta – responsável por 70% de nossas emissões de CO2.
Hidrelétricas, usinas nucleares, transposição do S.Francisco, pré-sal, flexibilização do Código Florestal, aumento da produção de etanol, entre outros exemplos, estão na base do modelo de desenvolvimento fordista brasileiro – um modelo tardio, refém de matrizes poluidoras que não se coaduna com a emergência da economia do imaterial e com as potencialidades de um país gigante em biodiversidade e energia solar.
Agenda esquecida
O modelo Pós-Consenso de Washington tem sido ainda lento e até mesmo surdo com demandas do movimento social brasileiro, como a questão ambiental (já citada), indígena e agrária.
Aguarda-se um posicionamento mais claro do governo Dilma sobre temas como a reforma agrária e a demarcação de terras indígenas. Até o momento foi aberta a interlocução com o movimento sindical que possui fortes ramificações no governo e é um ator social que se faz ouvir e tem canais priveligiados para negociações.
A agenda, entretanto, levada pelas centrais sindicais ao governo pode ser considerada uma agenda economicista e reformista. Resta saber como o governo reagirá às demandas do movimento camponês e indígena que têm tido posturas mais autônomas e críticas ao modelo econômico em curso.
O último exemplo na Esplanada dos Ministérios foi desalentador. Na audiência entre caciques e lideranças ribeirinhas com os representantes do governo Federal para debater a construção da usina hidrelétrica de Belo Monte, o que se viu e ouviu foi uma grande falta de sensibilidade do governo.
Conjuntura da Semana em frases
Agronegócio
"Mais de 70% dos alimentos que chegam à nossa mesa vêm de agricultores familiares. Ainda assim, a pressão do agronegócio para aumentar as fronteiras agrícolas é enorme" - padre Luiz Carlos Dias, secretário executivo da Campanha da Fraternidade - O Estado de S. Paulo, 10-03-2011.
CNBB e Belo Monte
"As hidrelétricas, especialmente as que estão previstas para a Amazônia, também devem fazer parte de nossas reflexões e preocupações. A necessidade de energia não pode justificar projetos que ignoram o meio ambiente, desalojam povos inteiros, matam culturas" – Dimas Lara Barbosa, bispo-auxiliar do Rio de Janeiro e secretário-geral da CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil) – Folha de S. Paulo, 09-03-2011.
Pibão
"O Pibão foi bom, foi bom" – presidenta Dilma – O Estado de S. Paulo, 04-03-2011.
"Nem o Brasil, nem a grande maioria dos outros países, pode sustentar um crescimento chinês, que é atípico, mas o Brasil sustenta, sim, um crescimento acima dos 5%" – Guido Mantega, ministro da Fazenda - O Estado de S. Paulo, 04-03-2011.
Macroprudenciais
"O importante para as pessoas é observar que o volume de dívida das famílias já atinge 25% da renda. Sugiro: continue a vida, mas sem o exagerado otimismo que guiou os consumidores nos últimos dois, três anos" - José Roberto Mendonça de Barros, economista – O Estado de S. Paulo, 04-03-2011.
Smart
"Precisamos trabalhar muito para criar milhões de famílias smart neste país" - Lula, ex-presidente da República - Folha de S. Paulo, 03-03-2011.
Mulher fora do seu papel
"É interessante como esperam de nós, mulheres, uma certa fragilidade. Isso decorre do fato de que a mulher, quando assume um alto cargo, é vista fora do seu papel" – Dilma Rouseff, presidenta da República - Folha de S. Paulo, 01-03-2011.
Só na novela
"Gay e travesti são bem-vindos na vida "real" da novela e no Carnaval, mas não podem ter direitos de cidadania elementares" – Marta Suplicy, senadora – PT-SP – Folha de S. Paulo, 11-03-2011.
Autoritárias
"Mulheres começam a ocupar postos aos quais não tinham acesso, mas, quando desempenham suas ações com firmeza, não importa o cargo, logo são chamadas de autoritárias" – Marta Suplicy, senadora – PT-SP – Folha de S. Paulo, 11-03-2011.
Política e machismo
"A presença de mulheres no governo esbarra no machismo dos partidos de base. Quantas mulheres os presidente dos partidos da base indicaram para os cargos de segundo, terceiro, quarto e quinto escalões?" – Iriny Lopes, Secretária de Política para as Mulheres – Época, 08-03-2011.
Mortal
"Ele fez o que Dilma mais detesta" - um auxiliar da presidente Dilma, sobre o descarte de Emir Sader, que perdeu a Casa de Rui Barbosa depois de atacar a ministra Ana de Hollanda (Cultura). A saber, brigar via imprensa - Folha de S. Paulo, 03-03-2011.
República do Relatório
"O governo Dilma já está sendo chamado, entre os mais próximos, de "República do Relatório". Seja qual for o assunto, a presidente pede um relatório e explicações bem detalhadas" – Raymundo Costa, jornalista – Valor, 01-03-2011.
Grandes chefes
"Difícil foi comer a omelete que a minha secretária preparou depois de ver a senhora cozinhando" - Jovair Arantes (PTB-GO), aproveitando visita de deputados a Dilma para comentar a aparição da presidente no "Mais Você" - Folha de S. Paulo, 03-03-2011.
Popularizar
"Há no Planalto grande preocupação com sua imagem no marco simbólico dos cem dias. A boa impressão que ela causa hoje entre as elites é diferente de aprovação popular. É preciso popularizar Dilma. É preciso explicar direitinho, para o louro entender, que não se faz omelete sem quebrar ovos" – Fernando de Barros e Silva, jornalista – Folha de S. Paulo, 02-03-2011.
Sexo explícito
"Aécio Neves chega para fazer a sua boquinha na badalada Feijoada do Amaral. Vestido a caráter, estampando a "Devassa" no peito, se deixa fotografar com os patrocinadores da comilança momesca. "É um grande parceiro nosso", diz o anfitrião Adriano Schincariol. Uma socialite de São Paulo se levanta para beijar o senador mineiro: "Você jura que vai ser o nosso presidente?". É o sexo explícito no país do Carnaval" – Fernando de Barros e Silva, – Folha de S. Paulo, 08-03-2011.
Promiscuidade
"Políticos não deveriam fazer propaganda de empresas privadas -parece elementar. Mas trocam seu prestígio e influência pelas mordomias dos espaços VIPs. São parceiros da promiscuidade entre o público e o particular, porta-estandartes do exclusivismo social a abrilhantar dos camarotes descolados a "festa bonita do povo" – Fernando de Barros e Silva, jornalista – Folha de S. Paulo, 08-03-2011.
Academia e ... negócios
"Pelos negócios feitos com a Líbia de Gaddafi, já como diretor da London School of Economics, vê-se que Davies não parece, a exemplo de Giddens, abominar também o poder do Estado (no caso, o líbio) de matar, prender, torturar, exilar etc." - Clóvis Rossi, jornalista - Folha de S. Paulo, 10-03-2011.
Liberais?!
"É bom acrescentar que, no Brasil, uma penca de liberais tem o mesmo tipo de comportamento: ficam horrorizados se o Estado avança na economia, mas estavam ao lado da ditadura quando ela avançou sobre a vida dos brasileiros" - Clóvis Rossi, - Folha de S. Paulo, 10-03-2011.
Pelúcias e chazinhos
"Muito frequentemente, as mães rivalizam com as filhas. Essa rivalidade é especialmente óbvia e feroz quando, de um jeito ou de outro, oferecendo pelúcias ou preparando chazinhos, uma mãe tenta manter a filha parada numa eterna infância" – Contardo Calligaris, psicanalista, comentando o filme "Cisne Negro" – Folha de S. Paulo, 10-03-2011.
Perigo e brincar
"Um homem de verdade deseja duas coisas: perigo e brincar" – Rubem Alves, escritor – Folha de S. Paulo, 08-03-2011.
Conformismo hedonista
"Ao ideal da morte honrosa dos gregos, da morte-libertação dos gnósticos, da boa morte dos cristãos medievais, da morte heroica dos românticos, nós contrapomos a "morte segura" no leito high-tech de um hospital chique, transfixados por catéteres e "plugados" na TV. Uma morte que é o símbolo perfeito da doença que acomete a nossa civilização e que, decerto, vai matá-la: o conformismo hedonista" – Cláudio L. N. Guimarães dos Santos, escritor, artista plástico, médico e diplomata – Folha de S. Paulo, 09-03-2011.
Mania e praga
"Querer ser feliz é uma praga. Quando queremos ser felizes sempre ficamos com cara de bobo. Preste atenção da próxima vez que vir alguém querendo ser feliz" – Luiz Felipe Pondé, professor de filosofia – Folha de S. Paulo, 07-03-2011.
"Hoje é Carnaval. Espero que você não tenha pegado aquele trânsito idiota de cinco horas para ser feliz na praia" – Luiz Felipe Pondé, professor de filosofia – Folha de S. Paulo, 07-03-2011.
Abaixo o sutiã
"Da escultural Michelle Bezerra, destaque da Rosas de Ouro, exemplo de emancipação feminina neste Dia Internacional da Mulher: "Não estava satisfeita com 285ml de silicone nos seios, aí aumentei para 425ml." E ninguém tem nada a ver com isso, certo?!" – Tutty Vasques, humorista – O Estado de S. Paulo, 08-03-2011.
Carnaval em Curitiba
"Chuva e frio compõem o clima do carnaval de rua curitibano" – Manchete do portal do jornal Gazeta do Povo na noite de sábado, 05-03-2011.
Mal comparando
"Se você não anda lá muito satisfeito consigo mesmo, calma: o Ronaldinho Gaúcho também não está jogando nada e, no entanto, é campeão" – Tutty Vasques, humorista – O Estado de S. Paulo, 01-03-2011.
Mulherzinha
"Gisele Bündchen fazendo papel de dona de casa no comercial da Sky, francamente, é mais um duro golpe no Dia Internacional da Mulher que se avizinha. Como se já não bastasse, neste ano, dividir o 8 de março com a terça-feira gorda" – Tutty Vasques, humorista – O Estado de S.Paulo, 25-02-2011.
Notas:
1. Entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo, 4-5-03
2. Na elaboração do "Consenso de Washington’ estão os economistas John Williamson - economista britânico - e Rudiger Dornbusch, professor do Massachusetts Institute of Technology (MIT). No Brasil, vários economistas que trabalharam no governo FHC se vincularam ao que se denominou o "grupo da universidade católica do rio’. Em torno de John Williamson e Rudiger Dornbusch, se reuniram jovens professores, como Pérsio Arida, que foi presidente do Banco Central no governo FHC, André Lara Resende, que foi presidente do BNDES, Pedro Malan, ex-ministro da Fazenda. E estudantes como Edward Amadeo (ex-ministro do Trabalho de FHC); Gustavo Franco (ex-presidente do Banco Central); Armínio Fraga (ex-diretor do Banco Central).
3. Fala do ministro José Dirceu numa reunião em maio de 2003 no Diretório Nacional do PT. Sem saber que suas palavras estavam sendo gravadas pela impressa, foi curto e grosso: "nós demos um cavalo-de-pau na economia".
FECHAR
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
Conjuntura da Semana. Governo Dilma reedita o Pós-Consenso de Washington - Instituto Humanitas Unisinos - IHU