03 Junho 2024
Convido aqueles que se abstêm, os pacifistas e todos os cidadãos a pressionarem pelo voto a Europa a promover outra ideia de mundo e a salvá-lo.
O apelo de 260 pessoas foi organizado por Raniero La Valle, Domenico Mogavero, Michele Santoro e publicado por Chiesa di tutti chiesa dei poveri, 31-05-2024. A tradução é de Luisa Rabolini.
De muitas partes, por ocasião das eleições europeias, vem sendo feito um apelo à sociedade civil e às suas expressões e iniciativas de paz, em contraposição às políticas de partidos indiferentes ou concordantes com a guerra.
Mas como pode a sociedade civil, ignorando ou “esnobando” as eleições, permitir que a guerra, e o sistema de guerra, fiquem naquelas mãos?
No entanto, a sociedade civil, ao medir-se com a política, isto é, com os lugares e os sujeitos a quem se devem às decisões, a começar por aquelas eleitorais, conseguiu no passado influir sobre o curso das situações.
Vindo da sociedade civil, fomos a Sarajevo para quebrar o cerco e lá chegamos em quinhentos. Promovemos uma missão parlamentar independente em Bagdá para dissuadir Saddam Hussein a não se expor à violência do poder militar estadunidense, que tínhamos experienciado na nossa última guerra, e oxalá tivéssemos sido ouvidos. Os jovens das universidades estadunidenses, ao rasgarem as cartas de convocação, contribuíram para acabar com a Guerra do Vietnã. Recolhemos um milhão de assinaturas na Sicília contra os mísseis de Comiso e, finalmente, não só os Cruises, mas também os Pershings foram removidos. Contribuímos, por meio de contribuições para a televisão estatal, a aumentar no país a consciência da paz e fazer repudiar a guerra como obsoleta. Lutamos contra a "pequena Europa" que acabava na Cortina de Ferro, sonhando a "Europa do Atlântico aos Urais", amiga mas autônoma dos Estados Unidos, como proposta primeiro pelo General De Gaulle, e depois por muitos outros europeus líderes, até Gorbachev, Sarkozy, Medvedev e a Rússia de Putin. Objetamo-nos contra a nova Cortina de Ferro e o Mediterrâneo blindado que dividem todo o Ocidente do “resto do mundo”, ouvindo o grito de paz do Papa Francisco; e nem falaremos aqui das vítimas da sociedade civil que pagaram com a vida a paz, o trabalho e a democracia, de Pio La Torre a Vittorio Bachelet, de Falcone a Borsellino, de Marco Biagi em Bolonha a Accursio Miraglia em Sciacca. E tudo isso sempre em relação às instituições diversamente competentes.
Hoje a sociedade civil é chamada a dizer a Biden que não é com a “competição estratégica”, isto é, com a ameaça militar mais forte e mais letal de todas, que se obtém, se não a dominação pelo menos a hegemonia sobre o mundo, e que o mundo é maior, mais variado e complexo do que ele pensa, de forma que não pode ser subjugado sob um único poder e um único dólar. A sociedade civil não pode continuar a ver sem pestanejar os membros perdidos, os corpos mutilados, as mulheres grávidas estripadas, as incubadoras derrubadas, os médicos mortos, as mesquitas e as igrejas destruídas, os corpos insepultos, a população caçada do massacre de Gaza; não pode ver o povo judeu espalhado pelo mundo mais uma vez em perigo e injustamente acusado devido às ações do governo e dos soldados de Israel, não pode resignar-se ao fato de que judeus e palestinos se consideram alternativos, que não possam se reconciliar e viver juntos numa terra ultrajada, mas amada por ambos e não apenas a uns prometida. A sociedade civil sabe que a Europa também inclui a Rússia, que não deve ser dividida por novas e mais mortíferas cortinas, e se uma aliança a defende, uma política alta e diferente pode pacificá-la e uni-la. A sociedade civil sabe que a guerra mundial em pedaços se instalou nos pensamentos e nas armas dos poderosos, mas não nos corações dos povos, e que se não formos nós, os nossos filhos terão de encontrar os caminhos para a paz e evitar o fim.
E por isso pensamos que a sociedade civil tenha a força para fazer da Europa um sujeito político de autoridade, a fim de promover outra ideia de mundo e salvaguardá-la hoje e para as gerações futuras; que, portanto, a sociedade civil, a começar pela galáxia pacifista ou pelos mosteiros contemplativos aos quais La Pira escrevia no auge da guerra fria, não possa considerar perdidas as eleições europeias ou vãs, não possa se eximir perseguindo de outra forma os seus ideais e, em vez disso, possa expressar um voto não inútil, se candidatos dignos e contrários à guerra se oferecem para o sufrágio de diferentes maneiras e existe também uma chapa de propósito que privilegia Paz, Terra e Dignidade para todas as criaturas.
Por último, pensamos que este é o momento em que os vinte milhões de abstenções devem retornar às urnas para revalorizar a democracia representativa, depois de ter visto como dois governos fortes, por não serem contidos por eleitorados e parlamentos, ou seja, aqueles de Netanyau e Zelensky, transformaram a defesa em vingança e suicídio, sacrificando os seus próprios povos. Este é o momento em que se deve passar da propaganda ao pensamento político e do personalismo à primazia do bem comum.
Porque mesmo aqueles que dizem que querem a paz, não sabem como fazer, não sabem que não se pode salvar um de cada vez, é preciso salvar todos juntos.
Roma, Pentecostes 2024
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Por uma outra ideia de mundo capaz de salvá-lo. Apelo à sociedade civil e pacífica - Instituto Humanitas Unisinos - IHU