26 Abril 2022
Entre os mármores policromados e os ícones sagrados da Catedral de Cristo Salvador, volta à cena mais uma vez a sagrada "sinfonia" entre Igreja e Estado. Com uma vela vermelha na mão, o presidente russo Vladimir Putin participa da vigília de Páscoa ortodoxa celebrada pelo patriarca de Moscou e de todas as Rússias, Kirill.
Não há beijo para selar o acordo como aconteceu em 2015, após a anexação da Crimeia, o início do conflito no Donbass e a operação russa na Síria. Mas não há dúvida de que, dois meses após o lançamento da chamada "operação militar especial" russa na Ucrânia, os dois ex-agentes da KGB estão mais uma vez do mesmo lado da história.
Ambos fiéis à ideia do "Russkij Mir", o mundo russo, com Moscou como centro político e Kiev como berço espiritual. Porque é na Ucrânia, com o batismo do príncipe Vladimir I de Kiev chamado de Santo, em 988, que se faz remontar a origem da civilização russa. O mesmo Vladimir, cuja estátua gigantesca há alguns anos domina, não por acaso, um espaço atrás do Kremlin.
A reportagem é de Rosalba Castelletti, publicada por La Repubblica, 25-04-2022. A tradução é de Luisa Rabolini.
“Esta grande celebração une os cristãos ortodoxos em torno de altos ideais e valores morais, desperta nas pessoas os sentimentos mais luminosos, a fé no triunfo da vida, a bondade e a justiça”, deseja Putin em comunicado publicado no site do Kremlin. E agradece à Igreja Ortodoxa Russa por seu "trabalho construtivo e frutífero destinado a preservar nossas mais ricas tradições históricas, culturais e espirituais, fortalecendo a instituição da família e educando as gerações mais jovens".
Enquanto Kirill, em sua mensagem aos bispos e fiéis, reza para que "todos os obstáculos sejam superados para que a paz duradoura possa triunfar e as feridas da divisão sejam curadas pela graça divina". Não é um repensamento após os muitos sermões em apoio aos soldados russos na Ucrânia, mas o comunicado padrão para a festividade solene. É por isso que a plataforma ucraniana Euromaidan Sos pediu que o patriarca e outros líderes religiosos da Igreja Ortodoxa Russa sejam sancionados pela UE, EUA, Reino Unido e G7, já encontrando apoio da Lituânia, e que sejam suspenso pelo Conselho Mundial de Igrejas que em breve se reunirá. Enquanto dois ativistas de direitos humanos, Willy Fautré e Patricia Duval, foram ainda mais longe ao apelar ao Tribunal Penal Internacional para incriminar Kirill "para inspirar, incitar, justificar, ajudar e apoiar crimes de guerra e contra a humanidade perpetrados pelas forças armadas russas na Ucrânia".
Enquanto isso, os múltiplos apelos do Papa Francisco ou Volodymyr Zelensky por uma trégua na "Páscoa" caíram em ouvidos surdos. Os sinos de todas as igrejas da capital russa tocam festivamente. Enquanto na Ucrânia há toque de recolher e as pessoas se escondem nos bunkers para se proteger dos mísseis que nunca param de cair, Putin reza e faz o sinal da cruz. Cada vez mais sozinho e isolado. Mesmo na igreja, onde todas as ruas circundantes são blindadas, só se pode entrar por convite estrito do Kremlin através de uma passagem nos fundos altamente vigiada.
Nos anos de seu primeiro mandato, Putin costumava ser cercado por uma dezena de pessoas durante as celebrações solenes. Dez anos atrás, o número de acompanhantes já havia se reduzido a algumas pessoas: o prefeito de Moscou Sergej Sobjanin, o então primeiro-ministro Dmitry Medvedev e sua esposa Svetlana. Nos últimos anos da pandemia, ao seu lado, a uma distância segura, restava apenas Sobjanin. Tanto que nas redes sociais há quem comparou Putin a Josef Stalin que fazia remover das fotos oficiais os funcionários que gradualmente iam caindo em desgraça. Com uma diferença: naquela época "eram os editores de fotos que removiam os Antipovs e os Ezhovs das fotos de Stalin, enquanto hoje Putin faz tudo sozinho".
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Entre os mármores e os ícones Putin renova o pacto com o patriarca Kirill - Instituto Humanitas Unisinos - IHU