Novo regime climático requer mudança na concepção de desenvolvimento das cidades. Entrevista especial com Milton Cruz

"Esta é a cidade real que estamos construindo: rica e pobre, com lugares belos que garantem o bem-estar, e territórios onde os conflitos entre as forças do Estado e o tráfico organizado causam um número significativo de mortes", diz pesquisador do Observatório das Metrópoles

Foto: PMPA

10 Outubro 2023

Apesar de todo o aparato legal para enfrentar os problemas socioambientais da Região Metropolitana de Porto Alegre e propor alternativas para melhorar a qualidade de vida da população, observa-se "que o trânsito metropolitano está cada vez mais difícil e que ainda não se conseguiu integrar o transporte público que chega na capital, o crescente acúmulo de lixo nos arroios e rios, que fica evidente quando as águas baixam, e a violência e os crimes crescem em todos os municípios da região", sublinha Milton Cruz, nesta entrevista concedida por e-mail ao Instituto Humanitas Unisinos  IHU.

Na avaliação dele, a "cidade real está sendo construída sob a pressão econômica e política de um sistema que considera o ser humano uma máquina de produção de riqueza, que utiliza a maior parte do seu tempo de vida para produzir bens e serviços, e a natureza como uma fonte inesgotável de matérias-primas para a indústria". No atual contexto de eventos climáticos extremos em curso, menciona, "os governos precisam se transformar em gestores da coisa pública e promotores do bem-estar urbano e abandonar a prática clientelista da troca de favores com os financiadores de campanha".


Milton Cruz (Foto: Câmara Municipal de Porto Alegre)

Milton Cruz é doutor e mestre em Sociologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS. Atua como pesquisador do Observatório das Metrópoles/Núcleo Porto Alegre. Participou como pesquisador do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada – IPEA e da Fundação de Economia e Estatística – FEE/RS. É graduado em Ciências Sociais e em Engenharia Eletrônica. Em 22-10-2015, no IHU, ele proferiu a conferência “Cais Mauá: duas visões em disputa sobre qual o projeto de cidade”.

Confira a entrevista.

IHU – Como avalia a discussão em torno da derrubada do muro da Mauá no processo de revitalização do Cais, especialmente após as cheias dos últimos dias, e a proposta de construir um novo sistema de proteção contra enchentes no lugar do muro?

Milton Cruz – Em primeiro lugar, precisamos identificar qual a concepção de cidade moderna imaginada pelos diferentes segmentos sociais, agentes econômicos e pelos partidos políticos. Essa concepção se manifesta nas escolhas feitas, por exemplo, pelos agentes econômicos do setor imobiliário e do turismo de negócios que apostam em edifícios de maior altura que agregam muita tecnologia. Buscam localizar prédios que serão utilizados por turistas e moradores de maior renda que irão se deslocar do aeroporto e dos bairros de classe média alta em direção aos edifícios que pretendem construir próximo à rodoviária de Porto Alegre. É uma região estrategicamente localizada, mas com graves problemas de congestionamentos de trânsito, baixa qualidade do ar, e riscos de alagamentos com a elevação das águas do Guaíba.

O setor comercial tradicional existente no centro histórico aposta em uma revitalização que depende da qualificação dos espaços públicos, como o das calçadas, das vias, dos estacionamentos, e das praças, além da reorganização do transporte público e do trânsito de automóveis que utiliza a Mauá apenas como corredor de passagem. Já os moradores do centro necessitam e reivindicam melhores calçadas, praças de lazer, e a eliminação das barreiras que dificultam a passagem do Centro para a Orla e para o Cais (como o fluxo de automóveis que circula pela avenida Mauá), além de segurança e moradia compatível com as remunerações das classes de menor renda. Estas demandas do setor comercial e dos moradores do Centro Histórico deveriam estar sendo contempladas no Programa de Reabilitação do Centro Histórico que identificou a existência de barreiras físicas ao longo dos limites bairro com o 4º Distrito, a Redenção, o Centro Administrativo, o Parque Harmonia, a Orla, a Usina do Gasômetro e o Cais Mauá. Mas, para saber se estamos avançando na eliminação dessas barreiras que prejudicam a mobilidade ativa (aquela que estimula o uso da bicicleta e o andar a pé) e o desenvolvimento do pequeno comércio e do comércio tradicional, necessitamos de um sistema de acompanhamento que nos permita dizer quais foram, até agora, os resultados do Programa.

Infelizmente ainda não contamos com esse sistema que permitiria aos pesquisadores e à população acompanhar a evolução de projetos e programas, corrigir os erros, qualificar a gestão dos programas e incorporar essa avaliação ao processo de Leitura da Cidade, que faz parte da revisão do Plano Diretor da Cidade em curso. Os diagnósticos e as propostas do Programa de uma das regiões mais importantes da cidade sequer foram citados nas reuniões que vem debatendo a revisão do Plano Diretor da Cidade (o PDDUA de 1999) e tampouco analisadas pela consultoria Ernst Young contratada pelo governo municipal para subsidiar a revisão. E os partidos representados na Câmara de Vereadores também não tem feito os debates necessários e nem apresentado propostas, baseadas em estudos, que revelem o interesse em construir soluções conjuntas para uma região da cidade que concentra a maior parte dos empregos, e que acumulou problemas complexos ainda pendentes de resolução, como o do Muro e o trânsito de automóveis da Mauá, o transporte coletivo de passageiros, o aquecimento e a baixa qualidade do ar, entre outros.

Planejamento da cidade

Os eventos que testam a nossa capacidade de planejar a cidade preparada para enfrentar as mudanças climáticas em curso, que exigem a qualificação da gestão municipal para responder às diferentes demandas dos setores sociais e econômicos, ainda não estão sendo tratados com a devida seriedade. Não se observam mudanças na gestão pública que incorporem a participação permanente da sociedade (principalmente os setores mais organizados e bem-informados) na definição das soluções mais adequadas para enfrentar os problemas antigos e novos que a cidade vem acumulando, e na criação de instrumentos de acompanhamento dos projetos e programas de revitalização, inclusão social, e de preservação ambiental. A partir do fechamento do Cais Mauá como Porto (a área portuária do Cais Mauá está desativada desde 2005), passamos a acreditar que o Muro da Mauá era a barreira que nos impedia de ter acesso livre ao Guaíba e que cheias como a de 1941 poderiam não se repetir.

Mas, as mudanças climáticas exigem que sejamos mais cautelosos quanto à derrubada do Muro, pois ele se mostrou importante para conter a elevação das águas do Guaíba que prejudicaria muitos moradores e o comércio do centro. A gestão pública ainda não deu mostras de estar preparada para operar um novo sistema que exige mais qualificação operacional e representaria mais custos. As exigências dos novos sistemas de proteção propostos deveriam ser apresentadas para a sociedade e serem condicionantes para a tomada de decisão sobre a derrubada do Muro atual, isto é, quais os custos e benefícios dos novos sistemas quando comparados ao atual.

Depois da instalação do empreendimento econômico Embarcadero no Cais, ao lado da Usina do Gasômetro, se percebe que a acessibilidade à Orla depende também da vontade política dos governos que são os responsáveis pela gestão do espaço que fica entre o Muro e o Guaíba. Aqueles que podem fazer um Happy Hour já tem acesso ao Cais no Embarcadero. Foi uma escolha que priorizou quem tem automóvel e renda suficiente para ir a um restaurante sofisticado com vista para o pôr do sol.

Já o Parque da Orla do Guaíba (trechos 1, 2 e 3), que vai da Usina do Gasômetro ao Estádio Beira Rio, é um parque urbano de uso público que facilita o acesso de todas as classes de renda e de todas as idades para a contemplação, as caminhadas e a práticas de diferentes esportes. Este último é um espaço mais democrático e compatível com as demandas de uma cidade moderna e metropolitana que busca se destacar pela peculiaridade de ter um grande lago chamado Guaíba.

Movimentos sociais

Em segundo lugar, é preciso entender o papel dos movimentos sociais organizados na construção de uma concepção de cidade que tem como centralidade o bem-estar da população de todos os bairros, tantos os centrais como os da periferia, e os projetos de urbanização ambientalmente sustentáveis que valorizam os espaços públicos para convívio social. Esses movimentos são muito importantes, pois contribuem para a formação de uma esfera pública em que a opinião pública não se deixa levar por ideias e promessas de desenvolvimento que se mostram orientadas para satisfazer os interesses exclusivos de um grupo da sociedade, ou tem um impacto negativo para o conjunto da sociedade urbana.

Ao reduzir a ideia de desenvolvimento urbano ao desenvolvimento do mercado e ao estilo de vida baseado no consumo de produtos, que dependem de renda para serem adquiridos, se excluem as demais possibilidades de se vivenciar o espaço urbano criado pela cidade moderna. Espaços como as calçadas e vias que nos levam da casa para a escola, ao terminal de transporte público, para as praças e parques, e para os lugares de eventos culturais, têm um valor que não pode ser monetizado, mas que marca a experiência de vida das crianças, e que vão fazer parte das lembranças de adultos e idosos. Espaços urbanos impactam positivamente nas experiências de vida da cidadania quando são qualificados com o propósito de estimular o convívio social.

Esses movimentos contestatórios adquirem toda a legitimidade ao se contrapor aos governos que desejam administrar a cidade exclusivamente sob a perspectiva do dinheiro e da ideia de que eficiência se alcança apenas com o corte nas despesas do governo. Um governo que não consegue incorporar os movimentos sociais críticos e organizados em um sistema de participação e acompanhamento das políticas públicas, e utiliza a estratégia da política tradicional que busca apoio entre os setores sociais mais carentes de boas informações (aqueles que não conseguem acompanhar como os vereadores e o prefeito tomam as decisões depois de eleitos e são mais facilmente manipulados), não consegue organizar uma gestão profissionalizada e aberta à opinião pública formada por um eleitorado bem informado e crítico. A esfera pública de uma cidade com essa característica é ingênua e suscetível aos erros cometidos por governos e empreendedores privados que desejam impor sua visão de desenvolvimento social e urbano, e que ocultam esses erros quando o resultado negativo se torna uma realidade, como nos exemplos da construção de bairros sem o devido tratamento de esgoto e o aquecimento urbano provocado pela retirada da vegetação.

O debate em torno da revitalização do Cais Mauá revela, pelo menos, dois projetos de cidade: a cidade democrática na qual todos têm acesso e o da cidade que prioriza o consumo e aqueles que podem pagar pelos serviços da modernidade, hoje puxada pela tecnologia e sofisticação do lazer e do consumo.

A revitalização do Cais Mauá, pode se tornar uma oportunidade para se pensar a cidade com vistas a um futuro que integre as demandas de desenvolvimento da cidadania, que reivindica espaços públicos gratuitos e de qualidade, e o desenvolvimento de uma cidade com comércio e serviços diversificados que atendem as necessidades de todas as faixas de renda, de todos os bairros, e dos turistas que visitam nossa capital.

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IHU – Como avalia a nova versão do edital de concessão do Cais Mauá, cujo leilão será realizado em dezembro deste ano?

Milton Cruz – A abertura de uma nova concorrência pública internacional (EDITAL CRI 0020/2023) sem o debate público ou a apresentação de um documento avaliando a experiência negativa anterior do consórcio Cais Mauá do Brasil, que venceu a licitação (de 2010) para a realização da revitalização e exploração comercial da área por 25 anos, mas ficou nove anos sem ter iniciado as obras e não ter apresentado as garantias financeiras que comprovariam a sua capacidade de fazer o investimento, gera incertezas e revela que os governos não mudaram suas práticas de gestão. Essas práticas desconsideram a prestação de contas aos eleitores e aos moradores da cidade e não consideram necessário apresentar os estudos e os dados que orientam as suas decisões. Pesquisadores das universidades locais e especialistas em planejamento urbano têm muita dificuldade em acompanhar as ações dos governos e emitir opiniões sobre a qualidade dos projetos e programas e da gestão pública. O governo não dá nenhuma garantia de que a cidade não corre o risco de ficar mais nove anos sem ter acesso aos armazéns do Cais Mauá, que já receberam uma proposta da UFRGS de uso cultural, de ocupação pela indústria criativa, e para empreendimentos econômicos que têm forte relação com a cidade e o Centro Histórico [1].

De posse desse estudo sobre as possibilidades de usos dos armazéns do Cais, o governo pode apresentar um Edital que busque promover o desenvolvimento do Cais como um equipamento especial, único em toda a cidade, que pode impulsionar a requalificação de toda a macrorregião do centro (esta região está prevista no Plano Diretor da Cidade, PDDUA de 1999). E não condicionar o desenvolvimento do Cais e do Centro Histórico ao interesse do setor imobiliário e do turismo de negócios internacionais que não sabemos se vão manifestar interesse, em função da perda de competitividade na nossa indústria (que tem pouca integração com os centros universitários que desenvolvem pesquisa) e dos nossos problemas de mobilidade urbana e metropolitana. Esses problemas da nossa modernidade limitam os rendimentos da população ocupada e travam o desenvolvimento de uma massa crítica necessária para a inserção da cidade na rede nacional e internacional da sociedade do conhecimento e da revolução tecnológica.

IHU – De um lado, observa-se a revitalização de determinadas áreas da cidade de Porto Alegre e, de outro lado, a repetição de velhos problemas em zonas periféricas. O que isso indica sobre a gestão, a urbanização e o desenvolvimento da capital? Que modelo de cidade está sendo construído?

Milton Cruz – A urbanização do país é um processo relativamente recente se considerarmos que a população urbana só superou a população rural em 1970, e que as cidades mais antigas da Grécia e da Bulgária têm mais de mil anos a.C. As cidades brasileiras atuais reproduzem um modelo de urbanização que se caracteriza pela dualidade conflitante. De um lado, temos a presença de centros dotados de prédios modernos com áreas de lazer e consumo integrados, serviços especializados em saúde, escolas dotadas de bons equipamentos e com alta tecnologia, e uma alta densidade de automóveis por habitante. É a cidade das classes de renda média e alta. Do outro, temos os enclaves onde moram os pobres e as periferias que não dispõem de serviços de educação, saúde, e saneamento de qualidade, com poucos equipamentos e espaços de lazer, poucos parques e praças, o transporte coletivo é de baixa qualidade, e muitos moram em áreas de risco. É a cidade das classes de média-baixa e baixa renda. Convivem de um modo conflitante os moradores ricos que utilizam as melhores infraestruturas, equipamentos, e serviços urbanos (como o aeroporto, os shoppings e Torres multiuso, a Freeway, as perimetrais, os melhores hospitais e universidades) e os trabalhadores moradores das periferias que trabalham nesses serviços e equipamentos e dependem do transporte público. A incapacidade do sistema capitalista de dar uma ocupação e renda para todos gerou uma população, nas favelas e periferias, sem emprego e perspectiva de futuro e uma geração de moradores de rua.

Violência urbana

Essa população que está fora do mercado de trabalho vem sendo capturada pelo mercado organizado pelos grupos que controlam o tráfico de drogas. A violência urbana atual agregou aos problemas tradicionais das mortes no trânsito, dos homicídios e furtos, as mortes causadas pelas disputas de território pelos grupos que controlam a venda de drogas ilícitas. Recentemente, vem se percebendo o surgimento de territórios em que o morador precisa obter a permissão dos grupos que controlam a venda de drogas para entrar e sair de seu local de moradia, como é o caso de vários territórios do Rio de Janeiro.

Sobre esta realidade da cidade dual conflitante se insere uma nova que disputa, com os setores sociais que têm renda e ocupação, o seu lugar no território urbano e no mercado, mas utilizando-se de práticas que ameaçam o Estado regulado pelas normas democráticas. Esta é a cidade real que estamos construindo: rica e pobre, com lugares belos que garantem o bem-estar, e territórios onde os conflitos entre as forças do Estado e o tráfico organizado causam um número significativo de mortes.

O Rio Grande do Norte atingiu, em 2017, a marca histórica de duas mil mortes em menos de um ano, a maior parte delas causada pelo tráfico de drogas e pelas disputas entre facções criminosas. No Brasil, nos anos de 2006 até 2010, morreram 40.546 pessoas devido ao uso de substâncias lícitas e ilícitas, e, entre 2010 e 2019, ocorreram cerca de 392 mil mortes em acidentes de transporte terrestre, incluindo atropelamentos, sinistros com bicicletas, motocicletas, automóveis, caminhonetes, caminhões, ônibus, veículos de serviço e fora de estrada.

A mobilidade urbana e a qualidade do ar vêm piorando em nossa cidade e na região metropolitana. A Confederação Nacional da Indústria [2] fez estudos que mostram que o tempo perdido no deslocamento para o trabalho já afeta a produtividade. O relatório, de 2018, do Ministério das Cidades [3], sobre a mobilidade urbana no país, registra que a Região Metropolitana de Porto Alegre emite mais gases de efeito estufa por habitante que o Rio de Janeiro, São Paulo, Salvador e Recife.

Mudança climática e urbanização

No último século, o aumento das emissões de gases do efeito estufa – consequência da ascensão dos combustíveis fósseis, da agropecuária e outras ações antropogênicas –, aliado ao desmatamento de matas e florestas, levou o planeta a registrar um aumento de mais de 1,07ºC em sua temperatura média em relação ao mundo pré-industrial (até meados do século 19). Enquanto os termômetros no Equador seguiram subindo além da média, o gelo antártico resistiu às mudanças no polo [4]. O aumento da diferença entre um Equador mais quente e uma Antártica ainda fria impulsiona ainda mais a força dos ventos, e o Rio Grande do Sul passa a conviver com um cenário mais quente, tempestuoso, com mais chuva, mas também com mais estiagens. Segundo dados de 2017 do governo do Rio Grande do Sul, 79,1% da população gaúcha vive em cidades que não possuem nenhum tipo de planejamento para prevenir os riscos de inundações, enchentes, enxurradas e deslizamentos. As pessoas continuam fixando suas moradias em locais de risco, como em encostas ou nas margens de rios. O aumento da urbanização do Rio Grande do Sul e de sua população, a partir dos anos 1960, foi inclusive um marco na ascensão dos desastres naturais no Estado.

Cidade real

Esta cidade real está sendo construída sob a pressão econômica e política de um sistema que considera o ser humano uma máquina de produção de riqueza, que utiliza a maior parte do seu tempo de vida para produzir bens e serviços, e a natureza como uma fonte inesgotável de matérias-primas para a indústria. Essas duas premissas do sistema capitalista são falsas sob uma perspectiva mais universal: aquela que considera a pessoa como um ser dotado de desejos de integração, reconhecimento e valorização social, necessidades que não são plenamente satisfeitas nas relações de produção e consumo oferecidas pelo mercado; e a que a ciência, que estuda os sistemas da natureza que permitem a existência da vida em nosso planeta, vem nos revelando um equilíbrio que vem sendo desestabilizado pelo processo de industrialização e urbanização.

Nossa percepção é a de que as instituições dos três níveis de governo (Federal, Estadual, e Municipal) não estão conseguindo construir boas soluções na velocidade exigida pelas mudanças climáticas, pelo impacto do uso das novas tecnologias (como o celular e o computador) no comportamento social, e pela transformação dos centros urbanos tradicionais, como é o caso do Centro Histórico de Porto Alegre que perdeu parte da sua antiga função de centro econômico, político e cultural, e do Cais Mauá que perdeu sua função de Porto da Cidade.

A lógica da carreira política, dos eleitos para os cargos desses três poderes, é determinada pelos interesses econômicos dos lobbies que mais contribuem nas campanhas eleitorais e depois cobram pela aprovação de projetos de Lei de seu interesse. O atendimento das demandas da população trabalhadora e das periferias vai depender da pressão da sociedade que se expressa através de movimentos organizados que adquirem visibilidade via grande imprensa e manifestações de rua, já que eles não conseguem financiar tantos candidatos como os grandes grupos econômicos, e nem convencer o eleitorado de que os seus candidatos são os melhores. As demandas do interesse de todos, como a da cidade inclusiva e sustentável, ainda não possuem um lobby que promova a sua priorização pelos governos. Elas aparecem como demandas de grupos profissionais-militantes, como os ambientalistas, do direito urbanístico e do direito à cidade.

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IHU – As ilhas de Porto Alegre foram amplamente afetadas pelo transbordamento do Guaíba. Como analisa essa região particular da cidade e o que precisaria ser feito, já que esta não é a primeira vez que a região é afetada por enchentes no período recente?

Milton Cruz – A Unidade de Conservação Parque Estadual Delta do Jacuí foi criada em 1976, por meio do decreto 24.385, tendo a sua área ampliada em 1979 pelo Decreto n. 28.161. Seus limites foram alterados pela Lei n.12.371/2005 que criou a APA Delta do Jacuí. O plano de manejo da APA foi homologado em 2014 e propõe o ordenamento territorial de uma das regiões mais populosas do Estado e busca levar em consideração todos os projetos de relevância para o Estado, tanto da iniciativa privada quanto da área pública, e as necessidades das comunidades que vivem próximas à Unidade de Conservação. O Plano de Manejo, que pode ser revisto a cada dois anos, deve observar o que dizem os Planos Diretores de Porto Alegre, Eldorado do Sul, Nova Santa Rita, Canoas, Triunfo e Charqueadas, cidades que abrigam trechos do parque. O documento prevê a possibilidade de atividades econômicas e investimentos que estão em projeto ou em estudo na Grande Porto Alegre, tais como a nova ponte sobre o Guaíba, a hidrovia Brasil-Uruguai, o plano hidroviário da Metroplan, e medidas de contenção a inundações.

Apesar destas previsões, os órgãos responsáveis não apresentaram uma avaliação sobre a situação atual deste Plano de Manejo e os problemas que precisam ser enfrentados para a equipe que vem coordenando a revisão do Plano Diretor de Porto Alegre. Na plenária de Leitura da Cidade deste ano (2023), que faz parte da revisão do Plano Diretor em curso, não se apresentou um diagnóstico atualizado sobre as Ilhas que possa orientar o planejamento urbano daquela região que sofre com alagamentos e carece de muitos equipamentos e serviços urbanos. O Plano Diretor é o instrumento adequado para se ouvir a população das Ilhas e os técnicos responsáveis pelo Plano de Manejo e, a partir daí, definir as diretrizes, as estratégias e os instrumentos adequados para o planejamento desta Unidade de Conservação. Essa é a obrigação legal dos governos que não vem sendo cumprida, apesar das promessas de que a sustentabilidade ambiental e social é uma prioridade.

IHU – O que poderia fazer parte de um sistema de proteção contra enchentes, a fim de contemplar também as pessoas que ficaram desabrigadas por causa das chuvas?

Milton Cruz – Um estudo (A Habitação flutuante como uma resposta resiliente: entre o vernacular e o contemporâneo), que investigou o conhecimento do meio físico e de técnicas construtivas com o objetivo de testar a resiliência da ocupação humana em território alagadiço, concluiu que a população ribeirinha do Rio Solimões vem consolidando seu caráter resiliente pela aquisição de sabedoria popular. Já o modelo holandês, que resulta de um extenso investimento em resiliência e tecnologia, possibilitou criar mais de um sistema de construção resiliente a inundações e enchentes. Essas experiências de construção de habitação em locais sujeitos a alagamentos podem ser uma boa alternativa para muitos moradores das Ilhas que lá moram há décadas. As prefeituras deveriam publicar editais que estimulassem a elaboração de propostas que garantam mais segurança e bem-estar aos moradores e inserir estratégias de planejamento ajustadas às especificidades desse território. O desenvolvimento urbano sustentável é uma recomendação da Nova Agenda Urbana, que propõe “Agir Local, Pensar Global”, que o governo de Porto Alegre diz ter como diretriz para a revisão do Plano Diretor, mas que não está sendo aplicada no diagnóstico desse território, o que não vai permitir formular estratégias, definir os instrumentos, e priorizar as ações mais adequadas para enfrentar os problemas do desequilíbrio ambiental.

Habitações de emergência

O Departamento Municipal de Habitação de Porto Alegre (Demhab) apresentou recentemente um projeto de casas de emergência, destinadas exclusivamente ao atendimento de situações emergenciais à população de baixa renda. A casa de emergência ecológica é feita de material reciclado e madeira de reflorestamento. Dentre os benefícios destacam-se maiores isolamentos acústico e térmico, resistência à umidade, não propagação de chamas em caso de incêndio, e menor risco nos alagamentos, quando a população reside em áreas ribeirinhas. As casas têm um tamanho padrão, incluindo o banheiro, com uma área total mínima de 12,40 metros quadrados, com duas peças. Essa nos parece uma boa alternativa para os eventos emergenciais, mas precisa ser divulgada e apresentada aos especialistas e à população para que possa ser aperfeiçoada.

Alternativas de proteção contra cheias

O Muro da Mauá, construído entre 1971 e 1974, tem três metros de altura (projetados para conter inundação até 1m26cm acima do registrado na enchente de 1941) e conta com 68 quilômetros de diques, 14 comportas e 19 casas de bombas. Ele se estende por 2,3 quilômetros entre a doca próxima da estação do Trensurb, na Rodoviária, e a Usina do Gasômetro. A derrubada do Muro está prevista no edital de concessão do Cais Mauá para a iniciativa privada — publicado pelo governo do Estado dia 18 de setembro e com leilão previsto para 21 de dezembro deste ano.

Como alternativa de proteção se apresenta como proposta a construção de uma passarela de 1,26 m. e mais uma proteção modular removível para chegar aos 3 metros do Muro atual. Penso que as mudanças climáticas que vem surpreendendo os governos de todo o mundo (incêndios no Canadá, na Austrália e na Europa, inundações na China e Índia) recomendam cautela. A decisão de derrubada do Muro só deveria ser tomada depois de instalado e testado o novo sistema de proteção e depois de uma avaliação sobre a capacidade dos gestores de manterem esse novo sistema em pleno funcionamento durante todo o tempo da concessão. O governo estadual poderia ter elaborado um Edital específico que apresentasse as alternativas de sistemas utilizados em todo o mundo e seus custos.

Uma possibilidade, que não é apresentada no Edital de concessão do Cais Mauá, é a da elevação dos armazéns e da construção de uma passarela elevada até a cota de 3 metros. Seria um sistema de proteção sem comportas e bombas, o que reduziria os custos de manutenção e criaria uma plataforma elevada para a circulação das pessoas e apreciação da vista do Guaíba de dentro dos Armazéns. Como exemplo, temos a avenida elevada Edvaldo Pereira Paiva, que vai da Usina do Gasômetro ao Beira Rio, que criou uma barreira entre o bairro Praia de Belas e o Guaíba.

Nesta última cheia, as águas avançaram apenas até os equipamentos esportivos localizados abaixo da avenida e ao lado do Guaíba. Também não podemos esquecer que existe outra barreira que dificulta a chegada dos moradores do Centro, de outros bairros, e de turistas ao Cais Mauá, que é o fluxo de automóveis pela Av. Mauá. As alternativas, economicamente viáveis, para se remover essa barreira ainda não foram apresentadas para o debate público. Seriam túneis ou passarelas que levariam os pedestres da praça da Alfândega ao pórtico de entrada do Cais, e da praça Brigadeiro Sampaio e praça Júlio Mesquita até a Usina do Gasômetro? E como essas alternativas podem ser implementadas de modo a valorizar o patrimônio histórico e cultural do Cais Mauá e do Centro Histórico, sem descaracterizá-los? Ou se alteraria o trânsito de passagem de automóveis pela Av. Mauá e reorganizaria o transporte público na região do centro Histórico?

O novo sistema de proteção contra cheias deve também integrar o Centro Histórico ao Cais Mauá através de projetos e ações que pensem a cidade para os próximos 50 anos. Para que boas respostas sejam encontradas e as melhores soluções sejam implementadas é necessário que os governos criem sistemas de escuta e participação da sociedade capazes de ativar o pensamento crítico e a massa crítica, existentes no espaço social metropolitano, de modo a introduzir inovações nos projetos urbanos (como os espaços públicos e as diferentes modalidades de mobilidade). Os eventos que incentivam a criação e o engajamento de startups, os concursos públicos, e os editais deveriam incorporar a temática urbana e seus problemas em suas agendas e rotinas burocráticas. A inteligência artificial e as novas tecnologias podem contribuir muito na resolução de problemas complexos como os da mobilidade urbana e do equilíbrio entre o ambiente natural e ambiente construído tendo como objetivo principal o bem-estar individual e coletivo.

O que os governos têm feito é conceder espaços, que devem ser de uso público, para empreendedores privados que têm apresentado propostas que buscam garantir o retorno desejado para seu investimento, mas não pensam no impacto que seu empreendimento terá na região, como é o caso dos congestionamentos de automóveis que irão piorar. E buscam abafar o pensamento contestador que aponta as inconsistências das soluções imediatistas que beneficiam apenas um setor da sociedade, mas deixam um passivo de problemas a serem resolvidos pelo poder público, como o das ocupações na margem de arroios e encostas de morros, e da periferia sem infraestrutura urbana.

Tecnologias sociais

Uma cidade que já foi inovadora na participação social na gestão pública, criando o Orçamento Participativo, e na elaboração de Plano Diretor que inspirou o Estatuto da Cidade de 2001 (o PDDUA, 1999) deveria mobilizar as redes de pesquisa existentes em suas universidades para desenvolver tecnologias sociais que respondam aos problemas criados pelos eventos climáticos como os alagamentos. O setor privado poderia atuar como um agente que estimula os governos a desenvolverem projetos de edificação que captem água da chuva e parques projetados para reter a água da chuva, com propostas de acesso de pedestres do Centro ao Cais, e aplicação de recursos para implantação da ciclovia do Cais Mauá. O instrumento da compensação em obras e serviços pelos empreendedores privados, exigido para determinados projetos aprovados pelo município, poderia priorizar esse tipo de adequação. Essa mudança de perspectiva do setor privado indicaria o seu real compromisso com a cidade sustentável e sua preocupação com as consequências das mudanças climáticas.

IHU – Como a urbanização das cidades precisa ser repensada tendo em vista os efeitos das mudanças climáticas? Quais são os principais desafios socioambientais das regiões metropolitanas hoje?

Milton Cruz – A Região Metropolitana de Porto Alegre vem acumulando problemas que os governos não têm conseguido resolver e que têm sido adiados, comprometendo o bem-estar da sociedade atual e a do futuro. O crescimento das cidades criou uma conurbação (um aglomerado de cidades) sem ter priorizado o planejamento integrado do território. Os municípios da região metropolitana têm o Plano Diretor, o Estatuto das Metrópoles (de 2015), a Metroplan, as secretarias municipais de Planejamento, além da Secretaria de Planejamento do governo do Estado, e órgãos de fiscalização e controle como o Tribunal de Contas e o Ministério Público, para fazer o planejamento da mobilidade urbana, do saneamento, e da segurança pública. Apesar de todo esse aparato legal e da estrutura técnico-burocrática especializada, observamos uma realidade em que o trânsito metropolitano está cada vez mais difícil e que ainda não se conseguiu integrar o transporte público que chega na capital, o crescente acúmulo de lixo nos arroios e rios, que fica evidente quando as águas baixam, e a violência e os crimes crescem em todos os municípios da região.

Para agregar qualidade ao modo de vida urbano os governos precisam mudar a sua concepção de desenvolvimento e inserir em seus planos estratégias de prevenção, de qualificação da infraestrutura e dos equipamentos dos núcleos urbanos consolidados, e de estímulo às boas práticas na gestão pública e no setor privado. A integração dos órgãos responsáveis pela gestão pública permitiria dar um salto de qualidade no planejamento urbano metropolitano, pois reuniria todas as equipes técnicas e os estudos sobre, por exemplo, mobilidade e o impacto do crescimento urbano no ambiente natural, em um esforço comum de criação de alternativas possíveis e implementáveis em cenários de curto, médio e longo prazos. As propostas elaboradas nesta “Sala de Criação da Cidade do Futuro” seriam debatidas com a sociedade em Audiências Públicas do Plano Diretor e em eventos nos quais os governos municipais debatem suas políticas públicas.

Herança do processo histórico

Os governos ainda acreditam em grandes eventos e grandes investimentos como impulsionadores que vão gerar empregos e renda e deixar uma marca de grande visibilidade na memória do eleitorado e da opinião pública. Essa crença é uma herança do processo histórico de disputa entre cidades em busca de investimentos externos. Esses governos desacreditam no potencial do desenvolvimento endógeno, aquele que se baseia nas potencialidades da sociedade local. Contrariando essa crença, os dados revelam que a maioria dos empregos é gerada por pequenos e médios empreendedores que deveriam ser vistos como agentes de desenvolvimento, e fazer parte da política de desenvolvimento urbano. Temos também o exemplo do Vale do Silício (onde a HP surgiu em uma garagem) que nos mostra como o pensamento criador devidamente incentivado pela sociedade e pelos investidores pode gerar um ciclo de inovação e um ecossistema empreendedor com foco no cidadão que demanda por bem-estar.

Os governos do passado erraram em apostar em um projeto de cidade que priorizou o automóvel e descuidou do transporte público municipal e metropolitano, assim como deixaram sucatear as ferrovias hoje tão necessárias para integrar os centros de produção e consumo aos grandes portos exportadores-importadores, como os de Rio Grande e de Porto Alegre. Também erraram ao permitir a construção de ambientes construídos sem a infraestrutura necessária para preservar a qualidade da água dos rios e dos arroios (esgoto e lixo) e sem um sistema de educação para o desenvolvimento de uma mentalidade cidadã e urbana capaz de superar a atual violência no trânsito e a prática de jogar lixo nos rios e espaços públicos.

A recente enchente dos rios das Antas e Taquari revelam que as cidades mais atingidas localizaram unidades industriais, cemitérios, e moradias em locais onde as águas podem chegar. O desmatamento e o uso do solo para a agricultura ao longo do trajeto desses rios (que se observa no Google Maps) deve ter contribuído para o assoreamento desses rios. Existem estudos das universidades sobre esses rios, que já indicavam o assoreamento e desmatamento na região, que precisam ser considerados pelos municípios e órgãos de planejamento. Neste caso, se deveria fazer um planejamento regional ao longo da bacia hidrográfica com diretrizes, recomendações e apontamentos sobre os pontos críticos em cada município. E instalar um sistema de alerta desenhado especificamente para a região que acione, em tempo real, todos os moradores, as escolas, os hospitais etc., que utilizam o celular e os computadores. Essa é uma oportunidade para o governo estadual e os governos municipais mudarem suas práticas de planejamento e gestão criando um fórum integrador da atividade de planejamento, com o objetivo comum de elaborar um plano regional de desenvolvimento e enfrentamento das mudanças climáticas, e buscar financiamento junto ao governo federal e às instituições internacionais.

Mudar a lógica da política

O grande desafio da sociedade é mudar a lógica da política, fazendo com que os agentes políticos que ocupam os cargos de poder coloquem em suas preocupações e nas agendas institucionais o interesse coletivo (como é o bem-estar urbano) e subordinem a ele as prioridades dos agentes econômicos que financiam suas campanhas eleitorais. O setor privado não tem o direito de construir a cidade das ilusões que vende maravilhosos sonhos de consumo a pessoas que só vão perceber depois de muito tempo o lado negativo e, às vezes, trágico de morar em prédios e lugares insalubres e de risco. Os governos precisam se transformar em gestores da coisa pública e promotores do bem-estar urbano e abandonar a prática clientelista da troca de favores com os financiadores de campanha. A mídia deve criar um espaço de debate público permanente que nos faça pensar a cidade que precisamos construir para melhorar a qualidade de vida de todos, e mudar a agenda de notícias que prioriza o lado violento e negativo da cidade.

E as organizações da sociedade civil e os movimentos sociais têm o desafio de construir agendas comuns que elejam prioridades que possam pressionar governos, o Ministério Público, os políticos, o mercado, e a mídia a se comprometerem com essas transformações necessárias para que concretizemos a cidade que garante o bem-estar de todos. Atualmente elas não conseguem expandir esse debate para fora da “bolha” dos militantes e especialistas (ambientalistas, arquitetos e urbanistas, profissionais do direito e da sociologia urbana).

A maior parte do eleitorado ainda aceita a ideia de que a política é o espaço de pessoas que só pensam em fazer sua carreira pessoal e que muitos deles são corruptos, e não consegue buscar o esclarecimento necessário para diferenciar os candidatos e os projetos dos partidos políticos. Essa qualidade ingênua da nossa esfera pública é reproduzida cotidianamente pela mídia que reforça um estereótipo que interessa aos grupos econômicos e políticos que precisam de um eleitorado desinformado e cheio de preconceitos em relação a política para se manterem no poder. Essa característica da esfera pública, que não consegue incorporar o debate verdadeiro sobre a cidade real e aquela que precisamos, faz com que a nossa cidade se comporte como uma criança ou um adolescente ingênuo que acredita em promessas milagrosas de transformação da realidade urbana. Em 251 de anos a cidade aprendeu a criar muitos parques e praças, organizar grandes eventos esportivos, inventar um sistema de participação social, criar belos espaços culturais, se integrar na economia global, mas não aprendeu ainda a criar um espaço social denso o suficiente para garantir que as boas experiências não sejam perdidas e que a criatividade e a inovação se tornem um dos motores da gestão pública e do planejamento urbano.

IHU – Deseja acrescentar algo?

Milton Cruz – A universidade poderia inovar criando espaços que desenvolvam tecnologias sociais aplicadas ao território urbano (a exemplo das incubadoras de startups), aproximando a instituição dos problemas enfrentados pelas cidades e contribuindo para que os órgãos municipais encontrem soluções para as quais as outras esferas de governo, estadual e federal, não conseguem contribuir. Os municípios não têm capacidade técnica para planejar e resolver grande parte dos problemas urbanos que exigem um pensamento crítico especializado.

Também poderia fazer uma parceria com a mídia para realizar debates sobre a realidade urbana e as soluções propostas pelos especialistas e as entidades e movimentos que representam os moradores da cidade. Hoje, os especialistas e a Agenda da ONU apresentam propostas inovadoras para os espaços públicos e a mobilidade. Estas impactam muito a qualidade de vida e são desconhecidas da sociedade.

Notas

[1] A proposta da UFRGS para a revitalização do Cais Mauá foi apresentada no Instituto dos Arquitetos do Brasil (IAB). Informações, aqui. (Nota do entrevistado)

[2] Confederação Nacional da Indústria. Mobilidade urbana no Brasil: marco institucional e propostas de modernização / Confederação Nacional da Indústria. – Brasília: CNI, 2023. (Nota do entrevistado)

[3] Este relatório consolida os resultados alcançados pelo Grupo de Trabalho criado para definição de indicadores de efetividade da Política Nacional de Mobilidade Urbana, instituído formalmente pela Portaria do Ministério das Cidades no 536, de 9 de outubro de 2015, com dados para 12 indicadores, bem como suas respectivas fichas e análise preliminar dos resultados. (Nota do entrevistado)

[4] Conferir "O tempo, o vento, o sol e as chuvas: 40 anos de desastres naturais no Rio Grande do Sul", disponível aqui. (Nota do entrevistado)

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