03 Dezembro 2025
"Mulheres que nos falam de El Fasher, o epicentro da mais recente catástrofe no Sudão, relatam fome, deslocamento, estupro e bombardeios."
A reportagem é de Beatriz Guarrera, publicada por Global Sisters Report, 01-12-2025.
Com essas palavras, Ginevra Anna Mutavati, diretora regional para a África Oriental e Austral da ONU Mulheres, sediada em Nairóbi, Quênia, descreveu recentemente a jornalistas a situação na capital de Darfur do Norte. Após mais de 500 dias de cerco pelas Forças de Apoio Rápido, foram documentados abusos generalizados, incluindo execuções sumárias e violência sexual.
Ela observou que as mulheres continuam a suportar o fardo mais pesado. Mesmo em fuga, permanecem expostas a graves perigos. A ameaça, no entanto, não se limita a contextos de guerra. Em todo o mundo, a ONU estima que 840 milhões de mulheres — quase 1 em cada 3 — sofreram violência física ou sexual por parte de um parceiro, violência sexual por parte de um não parceiro, ou ambas, pelo menos uma vez na vida.
Os dados reforçam a importância do Dia Internacional para a Eliminação da Violência contra as Mulheres, celebrado em 25 de novembro. A data também marcou o início da campanha Unite, com duração de 16 dias, que termina em 10 de dezembro, Dia Internacional dos Direitos Humanos.
Esta campanha de 2025 tem como tema "Acabar com a violência digital contra mulheres e meninas" e apela aos governos para que acabem com a impunidade através de leis que a penalizem, e às empresas de tecnologia para que garantam a segurança das plataformas e removam conteúdos nocivos. A campanha também incentiva "os indivíduos a denunciarem, apoiarem as sobreviventes e desafiarem normas online prejudiciais".
Um novo relatório da ONU destaca uma das realidades mais trágicas: a cada 10 minutos, uma mulher é assassinada em algum lugar do mundo. No último ano, aproximadamente 50 mil mulheres foram vítimas de feminicídio, 60% das quais foram mortas por parceiros ou parentes. Em comparação, apenas 11% dos homens vítimas de homicídio foram mortos por familiares. A desigualdade de gênero e a misoginia continuam sendo os principais fatores.
Em média, 137 mulheres são assassinadas por dia. Embora ligeiramente inferior ao de 2023, esse número é influenciado pela falta de padronização dos dados entre os países. Nenhuma região ficou imune, e a África, mais uma vez, registrou o maior número de vítimas, com cerca de 22.000 no ano passado.
A ONU observa que o desenvolvimento tecnológico também contribuiu para novas formas de violência. Estas incluem o compartilhamento não consensual de imagens e informações, a divulgação de informações pessoais (doxxing) e vídeos deepfake criados com inteligência artificial. O assédio automatizado e as campanhas de ódio coordenadas têm como alvo mulheres de todas as idades.
Estima-se que mais de 38% das mulheres já sofreram violência online, enquanto 85% testemunharam abusos direcionados a outras mulheres em plataformas digitais.
"É muito importante para nós conscientizar as pessoas", disse a Irmã Abby Avelino, da Ordem de Maryknoll, coordenadora internacional da Talitha Kum, rede global liderada por irmãs que luta contra o tráfico de pessoas, com sede em Roma.
Ela explicou que a violência digital está cada vez mais disseminada e que o mundo online se tornou um importante local de exploração.
A Irmã Abby observou que os membros da rede se reuniram online em 25 de novembro para refletir sobre o impacto da guerra e dos conflitos na violência de gênero. "Nos concentramos de maneira particular em mulheres e meninas vulneráveis, onde quer que estejam — na Ucrânia, no Sul Global, em países africanos e também na Ásia", disse ela.
Ela acrescentou que a Europa continua a receber muitas mulheres vítimas do tráfico, especialmente aquelas forçadas a deslocar-se por redes de tráfico.
Entre as histórias recentes, a Irmã Abby relembrou o caso de uma jovem do Sudão do Sul que havia buscado ajuda. "Não sabíamos onde ela estava, mas nossa rede conseguiu localizá-la", explicou. A jovem havia sido levada para o Chade; por meio da cooperação com parceiros na Itália, ela conseguiu reencontrar sua mãe — também sobrevivente do tráfico humano — e elas se reuniram.
Segundo o último relatório de Talitha Kum, a rede acompanhou 47.000 vítimas e sobreviventes em 2024.
"Meus pensamentos hoje", concluiu a Irmã Abby, "estão com as mulheres e meninas afetadas pelo tráfico humano. Como Talitha Kum, renovamos nosso compromisso de permanecer perto daquelas que sofrem, oferecendo escuta, proteção e ternura, para que cada menina possa redescobrir a esperança, a segurança e a força para recomeçar. Juntas: 'Talitha Kum' — 'Menina, levanta-te'."
Leia mais
- Mulheres do Chade denunciam práticas machistas
- Sudão: mulheres na guerra e a guerra contra as mulheres. Artigo de Raga Makawi
- Estupros e violência sexual usados como armas de guerra. Artigo de Lucetta Scaraffia
- Quando julgamos a vítima do estupro, agimos como o estuprador
- “O problema da violência sexual é político, não moral”. Entrevista com Rita Segato
- “Violência sexual como arma na guerra. Por que tanta crueldade?”, pergunta o arcebispo greco-católico de Kiev
- O que revelam os estupros de guerra. Artigo de Dacia Maraini
- “A guerra é sempre sobre o corpo das mulheres.” Entrevista com Marta Sanz
- Bucha: As mulheres
- Mais perigoso ser mulher que soldado
- Combater o estupro e defender a vida
- Sudão. Estupros de Guerra
- Mulheres enfrentam estupro como arma de guerra enquanto conflito no Congo desloca milhões
- 86 milhões de mulheres devem sofrer mutilação genital até 2030, alerta ONU