12 Junho 2025
O artigo é de José Manuel Vidal, doutor em Ciências da Informação e licenciado em Sociologia e Teologia e diretor do Religión Digital publicado por Religión Digital, 12-06-2025.
No tabuleiro Vaticano, onde cada movimento é observado com lupa e cada peça tem um peso específico no equilíbrio da Igreja, Leão XIV optou pelo roque. Um roque estratégico, quase de manual, em que mudar algumas peças, proteger o rei e assegurar o legado de Francisco se tornam a prioridade absoluta.
Porque no ambiente da Cúria Romana e nos diferentes dicastérios, a ameaça é latente: os ventos de restauração sopram forte e o novo Papa sabe disso. Por isso, antes de avançar, é preciso assegurar o que se tem e que a "pedreira" de Francisco continua aberta e ditando o rumo.
O roque, no xadrez, é a jogada defensiva por excelência: trocam-se peças, protege-se o rei, reforçam-se as posições próprias antes de lançar o ataque. E é isso que Leão XIV está fazendo nestes primeiros compassos de seu pontificado. Joga na defensiva, sim, mas com a vista no futuro, no avanço, no desenvolvimento de uma estratégia que permita consolidar e fazer avançar o legado de Francisco, especialmente o processo sinodal, que, como Bergoglio tinha previsto, poderia se concretizar e desembocar na grande assembleia sinodal de 2028.
A pedra angular deste roque é a equipe de confiança que eleger para a Cúria. Porque, em Roma, as pessoas são tudo. As estruturas contam, mas já estão funcionando com o estilo marcado por Francisco. O Papa Leão será julgado principalmente pelos nomes que escolher para sua equipe de confiança curial.
E, neste momento, a figura chave, o bispo que pode mudar o jogo, é o prefeito do Dicastério para a Doutrina da Fé, Víctor Manuel “Tucho” Fernández, que representa o coração ideológico e teológico do projeto reformista impulsionado por Francisco.
O teólogo argentino, íntimo colaborador de Francisco, revolucionou em apenas dois anos o dicastério mais sensível, apresentando documentos sobre bênçãos, dignidade humana e temas candentes que geraram tanto entusiasmo quanto polêmica por parte dos setores mais integristas.
Prevost sabe disso e, por isso, recebeu o cardeal Fernández duas vezes durante os primeiros dez dias de seu pontificado. E hoje, o recebeu pela terceira vez. Segundo nossas fontes, nas diversas audiências o purpurado argentino respondia que sim à pergunta do Papa sobre se ele podia contar com ele e Leão XIV o confirmava à frente da Doutrina da Fé.
E é que a continuidade ou a substituição de 'Tucho' marcará o tom da nova etapa: se Leão XIV o mantiver, será um sinal inequívoco de continuidade e proteção do legado bergogliano; se o substituir, os setores mais conservadores verão aberta a porta para uma restauração.
E se, dentro de alguns meses, ele o mudar, seria para mandá-lo para Bispos ou para outra Congregação Vaticana de igual porte. Qualquer outra mudança seria fazê-lo pagar o 'custo político' de ter sido o amigo fiel de Francisco e de sua primavera doutrinal. Mas, por enquanto, ele continua na Doutrina da Fé. E com plenos poderes.
Manter Fernández em seu posto é, portanto, uma forma de proteger o legado de Francisco frente aos setores mais conservadores que buscam um retrocesso nas reformas.
Nesse contexto de “roque”, a figura de Fernández atua como peça angular para assegurar o flanco doutrinal, resistir a pressões restauracionistas e ganhar tempo para que Leão XIV possa consolidar sua própria equipe e estratégia. Seu perfil de teólogo dialogante e sua proximidade com o Papa anterior o convertem em um escudo frente a possíveis tentativas de involução e em um garante de continuidade no essencial.
Em segundo lugar, está a incógnita da prefeita de Vida Consagrada, a freira Brambilla. Sua permanência ou saída será chave para o futuro da vida religiosa feminina e a aplicação das reformas nos institutos e congregações. Parece que Leão XIV tem previsto mantê-la em seu posto. Em contrapartida, no movimento do roque, o proprefeito deste mesmo dicastério, o espanhol Ángel Fernández Artime, poderia sair em direção a outra congregação.
Em terceiro lugar, a escolha do prefeito do dicastério de Bispos (cargo de máxima confiança papal, que ocupou o próprio cardeal Prevost) determinará a política de nomeações episcopais, o termômetro mais fiel da orientação pastoral do pontificado.
Não menos importante será a continuidade ou a substituição do atual responsável pelo Clero, o cardeal coreano Lazzaro You, especialmente em um momento em que o Opus Dei e outras realidades eclesiais estão na mira, e a gestão desses casos pode marcar a relação com setores influentes da Igreja.
Por último, a grande pergunta: por quanto tempo Leão XIV manterá em seus postos o Secretário de Estado, cardeal Parolin, e o substituto Peña Parra? Por um lado, parece que, no conclave, quando Parolin viu que seus votos haviam atingido o teto, ele os somou imediatamente à candidatura de Prevost. Em troca de sua permanência na Secretaria de Estado?
Por outro lado, é evidente que o cardeal Prevost teve que sofrer (sem defesa oficial do aparato) uma ofensiva midiática que começou já alguns meses antes do conclave, na qual o Sodalício e, mais tarde, Infovaticana e os terminais USA do MAGA o acusaram de encobrimento de abusos.
Leão XIV, como bom enxadrista, sabe que o roque não é uma jogada de fraqueza, mas de inteligência. Assegura o flanco, protege o rei e prepara o terreno para, chegado o momento, passar ao ataque. Mas, enquanto isso, a mensagem é clara: assegurar o que se tem, porque está ameaçado. E, em Roma, a melhor defesa sempre foi uma boa escolha de pessoas. Porque, no final, são as peças – e não apenas as estratégias – que decidem a partida.