29 Abril 2025
Dom Giovanni Ricchiuti, bispo emérito de Altamura e presidente nacional da Pax Christi, está deixando a Puglia rumo a Roma, onde no sábado concelebrará a missa fúnebre do Papa Francisco.
A entrevista é de Luca Kocci, publicada por Il manifesto, 25-04-2025. A tradução é de Luisa Rabolini.
Qual é o legado que Bergoglio deixa para a Igreja?
É a indicação de um caminho a seguir contida em seus principais documentos magisteriais: a necessidade da proclamação do Evangelho (Evangelium gaudium), o cuidado do planeta como “casa comum” de toda a humanidade (Laudato si'), a fraternidade universal como a única maneira de superar conflitos e alcançar a paz (Fratelli tutti) e, para fechar o círculo, o amor ao próximo como a mensagem central do Evangelho. Essa é a herança que recebe o novo pontífice e toda a comunidade cristã. Cabe aos crentes pegar o bastão que Francisco nos passa e continuar a corrida. Tomando cuidado para não o deixar cair, porque, como na corrida de revezamento, quem perde o bastão é desqualificado e perde.
Desarmamento, paz, direitos das pessoas migrantes, proteção do meio ambiente são os principais temas sociais do magistério de Francisco. Entrarão no Conclave que escolherá o sucessor?
Tenho fé na sabedoria dos 133 cardeais que terão a tarefa de eleger o novo papa. Eles sabem muito bem que não podem e não devem decepcionar as expectativas de uma Igreja-povo de Deus que Francisco colocou no caminho certo. Faço votos de que eles não nos decepcionem.
De acordo com alguns, Bergoglio negligenciou os chamados “valores não negociáveis” e se concentrou demais em questões sociais, na guerra...
Não concordo. Ontem mesmo a Rússia estava ameaçando usar armas nucleares, se necessário. Hoje a guerra é a questão central, diz respeito ao futuro e à sobrevivência de toda a humanidade. As questões éticas não devem ser negligenciadas, mas a Igreja deve ser capaz de olhar em profundidade as histórias das pessoas e não se limitar a enunciar o que a moral cristã prescreveria com base no direito canônico.
Nos últimos dias, estamos vendo a exaltação do Papa Francisco por políticos de todas as tendências, o que pensa a respeito?
Eles não o ouviram quando estava vivo, especialmente quando falava sobre certas questões incômodas, não entendo por que agora o estariam elogiando quando morto. Parecem palavras falsas. Afinal de contas, foi o próprio Bergoglio que censurou alguns políticos por hipocrisia: falam de paz e preparam a guerra, disse em várias ocasiões. No entanto, quem sabe, talvez amanhã aconteça um milagre em São Pedro e os aduladores dos últimos dias consigam finalmente se sentar em volta de uma mesa, ou ajudar os adversários a fazê-lo, para encontrar uma solução negociada e não continuar pensando em fazer a paz com as armas. Estou pensando principalmente nos políticos europeus: no mínimo, eles deveriam parar de evocar as raízes cristãs da Europa. Se geraram o que estamos vendo agora, talvez sejam raízes, mas certamente não são cristãs.
Ontem, um mural da artista de rua Laika apareceu perto de São Pedro, em que Bergoglio percorre a lista dos participantes de seu próprio funeral - Trump, Milei, Von Der Leyen, Salvini, Piantedosi - e se pergunta: mas quem os convidou?
De fato, eu também me pergunto com que coerência eles se apresentarão. Espero que os fiéis na Praça São Pedro permaneçam em oração, mas se algum sinal de desaprovação surgir, eu não ficaria surpreso.
Que papa o senhor espera que saia do Conclave?
Um papa que continue a estimular a participação de todo o povo de Deus na vida da Igreja, ou seja, o caminho sinodal iniciado por Francisco: disso poderiam resultar coisas boas - desde novas modalidades para escolher os bispos até o papel das mulheres - desde que seja um caminho cum Petro e não sub Petro. A forma geométrica da Igreja deve ser o círculo, não a pirâmide. E, além disso, um papa que coloque a paz em primeiro lugar, mesmo que seja criticado, porque a profecia deve vir antes da diplomacia.
Existe algum cardeal que poderia ser um papa assim?
Não vou citar nomes, mas acho que sim, tanto entre os italianos quanto entre os estrangeiros, por exemplo, olhando para o Oriente.
Hoje é 25 de abril. O que o senhor acha do apelo do governo para manifestações “sóbrias” em respeito ao luto pelo Papa Francisco?
Isso é ridículo. Hoje é um dia de comemoração, são os oitenta anos da libertação do nazi-fascismo e deve ser lembrado e comemorado como sempre. Não lembrar é esquecer. E nós não podemos esquecer do que aconteceu.