23 Janeiro 2025
Observa-MT calculou que, se fosse sancionada, a proposta possibilitaria o desmate de 5,5 milhões de hectares de florestas, uma área equivalente ao território da Paraíba.
A reportagem foi publicada por ClimaInfo, 23-01-2025.
Bom senso ou medo de uma judicialização certa. Seja lá por qual motivo, o fato é que o governador do Mato Grosso, Mauro Mendes (União Brasil), vetou o Projeto de Lei Complementar 18/2024, aprovado pela Assembleia Legislativa do estado (ALMT), que mudava o código ambiental estadual para atualizar as definições vegetais da Amazônia e do Cerrado.
Na prática, a proposta aprovada pelos deputados mato-grossenses permitia que áreas de vegetação amazônica fossem “transformadas” em Cerrado. Com isso, o percentual de conservação em propriedades rurais seria reduzido drasticamente, de 80% (Amazônia) para 35% (Cerrado), como definido pelo Código Florestal para Reservas Legais, a partir de uma “requalificação” da vegetação nativa. E a partir de um único critério: a altura das árvores. Mais “passar a boiada” impossível.
Na noite de 2ª feira (20/1), Mendes adiantou que vetaria integralmente o PL após ouvir parecer técnico e os setores envolvidos, relatam Folha, Carta Capital, O Globo, g1 e Agência Cenarium. Mas acrescentou que um novo projeto será apresentado. “Vamos constituir um grupo de trabalho nos próximos dias e, em até 90 dias, apresentaremos um novo projeto de lei, consistente, técnico, que respeite as legislações ambientais do país e traga mais segurança jurídica na interpretação e aprovação do Cadastro Ambiental Rural no estado”, afirmou.
Não será surpresa se o “conserto” do governador for pior que o enguiço. Afinal, o apreço de Mendes pelo agronegócio é explícito. O exemplo mais recente disso foi a promulgação de uma lei cortando incentivos fiscais para empresas que participam da Moratória da Soja, acordo celebrado entre representantes das grandes indústrias e tradings para que não seja comercializado o grão produzido em áreas da Amazônia desmatadas após 2008.
Coordenadora de políticas públicas do Observatório do Clima, Suely Araújo classificou a lei aprovada pelo parlamento de Mato Grosso como inconstitucional, por entrar em conflito com os estatutos federais. Ela também disse que a lei poderia ser contestada judicialmente.
O Observatório Socioambiental de Mato Grosso (Observa-MT) calculou que a proposta, se fosse sancionada pelo governador, possibilitaria o desmate de 5,5 milhões de hectares de florestas. Uma área equivalente ao território da Paraíba, ou 15 vezes o tamanho de Cuiabá, capital do estado, “que estariam suscetíveis a uma interpretação errônea de Cerrado”, destacou.
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