21 Janeiro 2025
"Também é evidente que quanto mais fracas as motivações a favor da democracia liberal se tornam, mais os discursos políticos inspirados na fé adquirem valor e significado", escreve Sebastiano Maffettone, filósofo italiano e professor de Filosofia Política na Universidade LUISS Guido Carli, em artigo publicado por Il Sole 24 Ore, 19-01-2025. A tradução é de Luisa Rabolini.
Há três boas razões para ler Liberdade com Religiões [Libertà con le religioni] de Valentina Gentile. Além, é claro, do fato de ser um livro sério e bem escrito sobre filosofia política, a matéria que Gentile leciona no Luiss. A primeira diz respeito à fragilidade das democracias liberais em nossos tempos.
Essa fragilidade é evidente se observarmos a percepção que os cidadãos têm das próprias democracias liberais. Poucos entre eles, de fato, acham que os regimes democráticos liberais são eficazes e moralmente uma meta a ser alcançada. Sentimentos desse tipo explicam a falta generalizada de apoio a Israel e à Ucrânia, que - com todos os defeitos do mundo - foram caracterizados por regimes democráticos liberais, ao contrário do Hamas, do Irã e da Rússia. O segundo motivo para buscar o livro de Gentile consiste no que o arabista francês Gilles Kepel chamou de “vingança de Deus”, e que nós - mais sobriamente - podemos conceber como o retorno do valor político das religiões. Porque, se pensarmos bem, a tão proclamada secularização, se vista do ponto de vista da consciência das pessoas, nunca ocorreu. A maioria das pessoas, de fato, continua a praticar religiões mesmo após o advento das chamadas modernizações. Em vez disso, houve uma certa secularização das instituições, uma secularização que, sem dúvida, é bem-vinda se pensarmos na liberdade de religião e na possibilidade de escolher livremente em qual religião crer (opções que, a propósito, estão ligadas ao nascimento e ao desenvolvimento das democracias liberais). Também é evidente que quanto mais fracas as motivações a favor da democracia liberal se tornam, mais os discursos políticos inspirados na fé adquirem valor e significado.
O que foi dito até aqui esclarece a importância da terceira razão para a leitura desse livro, um motivo que, em última análise, corresponde à contribuição específica que Gentile pretende fazer para o desenvolvimento do pensamento político-filosófico. Trata-se da relação entre religião e política, conforme tratada pelo mais importante pensador político do século passado, John Rawls. O próprio Rawls, em seu livro O Liberalismo Político, discutiu com maestria a maneira pela qual diferentes “doutrinas inclusivas” poderiam coexistir em um regime constitucional democrático liberal. A maneira em questão baseia-se no que - como os estudiosos bem sabem - é chamado de consenso sobreposto ou interseção. As doutrinas inclusivas de que estamos falando são aquelas que, dentro dos limites de uma visão total da moral e da política, podem buscar inspiração nas religiões, mas também nas visões seculares (como o marxismo). Para poder coexistir com a democracia liberal, essas doutrinas devem ser “razoáveis”, o que significa, grosso modo, que devem levar em consideração as reivindicações legítimas dos outros que a pensam de forma diferente. Também devem respeitar os critérios impostos pela razão pública, que é aquela que fundamenta os ditames das constituições democráticas liberais. O problema é que a razão pública impõe vínculos e limites às posições religiosas.
Isso acontece porque existe uma tensão entre a abertura política para as religiões, por um lado, e os riscos associados ao papel político das religiões, como, por exemplo, o tratamento discriminatório que algumas religiões reservam para as pessoas LGBT. Em outras palavras, a liberdade de religião entra em conflito com o desejo de liberdade da religião. Gentile argumenta, de forma totalmente compartilhável, que é preciso encontrar um equilíbrio entre essas duas aspirações. Esse equilíbrio é afetado pela posição geral adotada sobre a relação entre religião e política. Por um lado, grande parte da literatura filosófico-política de matriz rawlsiana propõe uma exclusão qualificada das razões religiosas do âmbito da justificação pública. Por outro lado, há aqueles que adotam uma visão decididamente mais inclusiva da justificação pública, sempre a partir da perspectiva das razões religiosas. Gentile chama a primeira versão de “separatismo igualitário” e a segunda de “pluralismo inclusivo”. E, compreensivelmente, opta por uma posição intermediária entre as duas.
Ao fazer isso, no entanto, apresenta uma taxonomia sofisticada das diferentes posições filosóficas sobre o tema em questão, uma taxonomia que - tenho certeza - será de grande utilidade para o leitor especializado. Por se tratar de um livro acadêmico, nem sempre é de fácil acesso, mas trata de aspectos da vida social que dizem respeito a todos, como demonstram os casos que têm obtido grande atenção polêmica, como o recente da escola Pioltello ou o mais antigo do crucifixo na sala de aula.