11 Janeiro 2025
O capítulo inicial de A cultura na Alemanha nazista abrange as tentativas de Adolf Hitler e seus seguidores de desmantelar os frutos da explosão e liberdade artística anteriores; o segundo aborda a cultura nazista no período pré-guerra; o terceiro examina o antissemitismo na arte do Terceiro Reich; o quarto adentra a relação entre propaganda e cultura, e os efeitos da guerra mundial; o quinto analisa o destino dos emigrantes; e o sexto, as tentativas de reviver o panorama criativo após 1945, em uma Alemanha que buscava se despojar de seu passado nazista (um processo que se estenderia até a década de 1970). Nas conclusões, o autor se afasta do desenvolvimento principal do texto para realizar uma comparação entre as possibilidades culturais nos regimes nazista, fascista e stalinista.
O artigo é de Jazmín Bazán, publicado por Nueva Sociedad, 10-01-2025.
Jazmín Bazán é licenciada em História pela Universidade de Buenos Aires. No exercício do jornalismo, colaborou com diversos meios, entre os quais se destacam elDiario, Revista Gallo e Vía País. É coautora de Andrea D’Atri, Celeste Murillo e Ana Sánchez de Luchadoras: histórias de mulheres que fizeram história (CEIP, 2017).
No livro A cultura na Alemanha nazista, o historiador Michael Kater desvenda como o nacional-socialismo tentou instrumentalizar as artes para isolar progressivamente a população judia e controlar as massas. Além disso, investiga os diversos modos pelos quais o regime do Terceiro Reich se voltou contra todos os materiais literários e artísticos associados ao modernismo e à cultura de esquerda.
Como parte da coleção Fazer História – sob a direção de Lila Caimari e Roy Hora – a editora Siglo XXI publicou pela primeira vez em espanhol A cultura na Alemanha nazista, de Michael H. Kater. Nesta obra, o professor emérito da Universidade de York e especialista em história alemã do século XX analisa como o regime do Terceiro Reich montou uma máquina de propaganda apoiada nas artes (pintura, arquitetura, literatura, música e cinema) e nos meios de comunicação (principalmente rádio e imprensa escrita) para perseguir a comunidade judaica, controlar a população em geral e projetar os fundamentos do nacional-socialismo na Europa e no resto do mundo.
Enquanto explora o avanço das medidas segregacionistas, as cumplicidades implícitas e explícitas de figuras da cultura, as resistências ao novo regime (ponto, talvez, insuficientemente explorado), as contradições internas do regime e seus funcionários, e o impacto da guerra no plano ideológico nazista, a obra levanta uma pergunta crucial: é possível a expansão da criatividade, mesmo com fins abjetos, no contexto de uma tirania?
O autor não apenas pretende rastrear a cena cultural na Alemanha nazista, mas propõe analisar o período entre 1933 e 1945 através da lente da cultura. Trata-se de um projeto ambicioso, respaldado por uma vasta bibliografia – das 447 páginas do livro, 69 correspondem a citações – e uma longa trajetória acadêmica: Kater escreveu sete livros sobre o nazismo e um sobre a história da cidade de Weimar, com ênfase nos atores culturais, nas profissões liberais e na intelectualidade.
O livro está organizado em sete blocos que funcionam como peças de uma análise acumulativa; vão desde as tentativas de abolir os resquícios da estética predominante até as estratégias de propaganda nos primeiros anos do regime nazista e abrangem tanto as dificuldades surgidas durante a guerra quanto as sequelas culturais do totalitarismo.
Kater começa formulando a tese que desenvolverá ao longo da obra. Segundo sua análise, para que uma marca artística autêntica pudesse se consolidar, era necessário eliminar a vanguarda que havia ganhado força durante a República de Weimar. Para isso, o regime nazista atacou indiscriminadamente criadores judeus, de esquerda e modernistas. E, nesse processo, atacou até personagens politicamente neutros (como o escultor e escritor Ernst Barlach), mas também conservadores ou simpatizantes da extrema-direita ou até filonazistas – como o poeta Gottfried Benn e o pintor Emil Nolde, cuja obra foi incluída na lista de "arte degenerada".
O capítulo inicial de A cultura na Alemanha nazista abrange as tentativas de Adolf Hitler e seus seguidores de desmantelar os frutos da explosão e liberdade artística anteriores; o segundo aborda a cultura nazista no período pré-guerra; o terceiro examina o antissemitismo na arte do Terceiro Reich; o quarto adentra a relação entre propaganda e cultura, e os efeitos da guerra mundial; o quinto analisa o destino dos emigrantes; e o sexto, as tentativas de reviver o panorama criativo após 1945, em uma Alemanha que buscava se despojar de seu passado nazista (um processo que se estenderia até a década de 1970). Nas conclusões, o autor se afasta do desenvolvimento principal do texto para realizar uma comparação entre as possibilidades culturais nos regimes nazista, fascista e stalinista.
Seguindo a linha do historiador e ensaísta Saul Friedländer, Kater se pergunta por que o ambiente cultural foi o primeiro a ser expurgado dos judeus alemães, traçando uma conexão entre sua destacada participação no modernismo e seu progressivo cerco. Segundo o autor, a criação de listas negras de pintores, atores, músicos, jornalistas e literatos judeus não era casual, mas representava um objetivo profundo, enraizado na concepção política do Terceiro Reich.
Consultado para este artigo, Kater explicou: "Os judeus, por meio de sua cultura, expressavam valores como democracia, liberdade individual e, às vezes, os direitos das mulheres. Em resumo, refletiam elementos da democracia parlamentar que Hitler e seus seguidores aborreciam. Esses princípios foram fundamentais no auge do modernismo na Alemanha, como em outras partes da Europa, antes da Primeira Guerra Mundial".
O trecho é interessante porque não associa o assédio aos judeus na arte apenas a questões religiosas, étnicas ou "raciais", mas à dissidência intelectual e às ideias radicais que preocupavam tanto o nacional-socialismo. A capa da edição em espanhol do livro é ilustrativa nesse sentido: mostra a famosa foto de um soldado nazista pisando pilhas de artigos enquanto folheia um exemplar da biblioteca do Instituto de Estudo da Sexualidade em Berlim (aberto entre 1919 e 1933), pouco antes da destruição do local e da queima de mais de 10.000 livros. O centro, dirigido pelo filólogo e médico judeu Magnus Hirschfeld, defendia a legalização do aborto, advogava pela educação sexual e lutava pela descriminalização da homossexualidade, criminalizada no artigo 175 do Código Penal desde 1872.
A escolha dessa imagem não é casual: mostra o vínculo precoce entre a opressão cultural como forma de ostracismo ao povo judeu e as ações de repressão física. Embora, tanto pela escolha de seu objeto de estudo quanto pela decisão historiográfica, o autor coloque um maior peso sobre a questão cultural (pelo menos até a Noite dos Cristais, em 1938, que ele considera como um marco), ele não minimiza a coação das forças de ordem. No entanto, considera que o isolamento dos ambientes de socialização foi uma condição prévia que facilitou a violência aberta.
"A 'guetização cultural' dos judeus na Alemanha nazista após 1933 pavimentou o caminho para a Solução Final, ao concentrar os judeus culturalmente ativos. Durante a guerra, isso facilitou sua identificação, reunião e envio para a morte", afirma Kater. Ele se refere à Liga Cultural Judaica, estabelecida por Angriff Hans Hinkel, nomeado por Hermann Göring e Joseph Goebbels para a "desjudaização" da cultura alemã. Ali, artistas judeus foram forçados a se reunir, o que facilitou seu confinamento e vigilância. Tanto Kurt Singer (primeiro diretor artístico da Kulturbund) quanto Werner Levie (último diretor relevante) foram eventualmente capturados pelos nazistas.
Nem todos os vanguardistas tinham tendências de esquerda (nem os tradicionalistas aderiam necessariamente ao nazismo, nem mesmo à direita). Muitos não eram de famílias judias. Mas, em meio a decisões caprichosas e unilaterais de líderes nazistas e um clima de intolerância, proliferaram, por meio de diversos mecanismos legais e paralegais de silenciamento, as demissões e o boicote massivo aos artistas. Já em Minha Luta, Hitler afirmava que o cubismo e o dadaísmo – indistintamente – eram parte do "bolchevismo na arte"; e, em 1933 e 1937, se referiu da mesma maneira ao impressionismo e ao expressionismo. O nazismo buscava mostrar que os judeus e outros artistas haviam caído na armadilha do "anarquismo" estético e tentavam introduzir a "luta de classes" no campo artístico.
Nesse contexto, os filmes de Fritz Lang foram proibidos por serem considerados "demasiado expressionistas" pelas autoridades, enquanto Lang foi rotulado como "meio judeu" (em 1937, Goebbels oficializou a prática comum de "limpar" as instituições culturais de judeus, "meio judeus" e pessoas com um quarto de sangue judeu, as quais foram qualificadas como "mestiços de segunda classe"). Em 1932, Max Liebermann, famoso pintor impressionista judeu alemão, renunciou à Academia de Artes da Prússia após mais de uma década, devido à discriminação que enfrentava. Passou seus últimos anos de vida afastado, até sua morte em 1934, momento em que o governo nazista confiscou suas obras. Anos depois, Hertha Thiele, que atuou em Quem é o dono do mundo? (obra clássica do expressionismo esquerdista coescrita por Bertolt Brecht e levada ao cinema em 1932), recusou-se a interpretar o papel de uma noiva de um "herói nazista" e perdeu sua licença de atriz. Em 1937, os nazistas inauguraram a mostra "Arte degenerada", que reunia pinturas modernistas (penduradas de cabeça para baixo, sem molduras, mal iluminadas e categorizadas, com citações de Hitler e Goebbels nas paredes), com o objetivo de ridicularizá-las e gerar repúdio por parte do público massivo que as assistiu.
No campo da imprensa, muitos jornais foram rapidamente adquiridos pelo Partido Nazista por preços irrisórios. Grande parte dos funcionários foi despedida por ter "ascendência não ariana" ou "tendências que poderiam atrapalhar a orientação espiritual do público". Mas o ataque aos judeus foi acompanhado por um ataque aos direitos sindicais e políticos de todos os trabalhadores, por meio de uma série de normas. A mais contundente, sancionada em abril de 1933, foi a Lei de Restauração do Serviço Civil Profissional. Ela autorizava a demissão de pessoas com "orientação política duvidosa". Além disso, era possível dispensar funcionários públicos sem "inclinações corretas". A lei retirava os direitos dos empregados civis, incluindo as aposentadorias, e marginalizava os "suspeitos". Disposições futuras (como as leis raciais de Nuremberg, de 1935) aprofundaram o impacto da legislação existente, com um claro viés racista.
Diversas questões que ocupam os especialistas no Terceiro Reich também são abordadas, embora de forma tácita, por Kater, sempre sob a ótica cultural. Por exemplo, qual era a extensão do antissemitismo na Alemanha antes de 1933? Quão maleável era a população alemã à propaganda antissemita do regime? Qual papel Hitler, como indivíduo, desempenhou no desenrolar histórico?
Da Universidade de York, o autor amplia: "Os artistas judeus na República de Weimar estavam ao lado dos não judeus. Suas obras eram valorizadas em todos os níveis culturais como contribuições significativas para a sociedade. Nos níveis mais baixos, podiam atuar como palhaços ou músicos no Wintergarten ou na Scala de Berlim; nos níveis mais altos, eram atores de cinema ou teatro, como Elisabeth Bergner. As expressões de antissemitismo vinham exclusivamente da direita política, em sua maioria dos nacional-socialistas."
Seguindo os estudos de pesquisadores como Richard Evans, Kater desmistifica a ideia de que os alemães sempre foram antissemitas. Pelo contrário, afirma que "dois segmentos da população alemã foram os mais influenciados pela propaganda contra a população judaica: os antissemitas preexistentes, cujas crenças foram reforçadas, e os membros da Juventude Hitlerista, que foram sistematicamente doutrinados e lutaram pelos valores nazistas (e contra os judeus)". Uma falha do texto é não detalhar como eram compostos esses segmentos permeáveis à ideologia chauvinista e demagógica oficial: seriam as classes média e alta, os "desclassificados" ou uma minoria operária não organizada, como sugeria o estudioso Ernest Mandel? Que peso tiveram o terror e a falta de alternativas políticas para evitar que uma oposição mais aberta se expressasse?
Muitos trabalhos sobre o nazismo giram em torno de eixos comuns: foi a liderança de Hitler determinante? Quais foram seus motivos? Era um gênio, um ser irracional ou ambas as coisas? Kater se arrisca a esboçar uma resposta sob a perspectiva cultural. Embora atribua ao Führer uma inteligência superior à média, com conhecimentos profundos em temas como a teoria militar, esclarece que os saberes acadêmicos e artísticos mais refinados o excediam. Embora o cinema o fascinasse (e tenha marcado sua impressão na direção que o regime tomou nesse aspecto, proibindo pessoalmente filmes), ele tinha pouco interesse e formação musical. Além disso, suas duas tentativas frustradas de ingressar na Academia de Belas Artes de Viena marcaram seu caráter amador e seu ódio pelos professores universitários. "Até que ponto seu gosto medíocre influenciou a cultura do Terceiro Reich como um todo?", pergunta o autor no livro.
Kater afirma que "o fracasso de Hitler como artista não teve uma influência direta no desenvolvimento cultural nazista, além de algumas opiniões que expressou. A maioria de seus aliados (exceto Göring e Goebbels, com melhor educação) compartilhava um gosto semelhante, de classe média baixa, próximo ao kitsch, o que coincidia com as preferências da maioria dos alemães após a eliminação de uma elite crítica".
Não é novidade que o nazismo cerceou o pluralismo com o objetivo de impor uma estética própria. No entanto, para Kater, essa estética teve traços iniciais e incompletos, o que constitui uma das principais contribuições da obra. Em seu livro, ele atribui o fracasso de uma criação cultural orgânica à falta de ideias originais, à escassez de talento, ao choque entre as normativas e as decisões erráticas dos dirigentes, além de uma burocracia excessiva. A isso somam-se circunstâncias que excedem o plano artístico: a guerra como catalisadora de contradições e seus efeitos sobre a economia – brevemente analisados – teriam marcado o fim do plano de Hitler e seu ministro da Propaganda, Goebbels.
Para o nazismo, a cultura tinha três fins propagandísticos: estender a cosmovisão nacional-socialista (com uma forte marca antissemita, evidenciada em filmes como O judeu eterno, de 1940, dirigido por Fritz Hippler), entreter ou distrair (como ocorreu no final da Segunda Guerra Mundial com o filme Münchhausen), e causar uma boa impressão em governos estrangeiros. No entanto, buscar um equilíbrio entre esses objetivos se mostrou uma tarefa difícil, e o regime fracassou em todos eles, embora em diferentes graus.
A propaganda, à qual foram destinados imensos recursos e disputas internas – como as disputas entre Goebbels e Alfred Rosenberg – acompanhou o regime durante o período inicial vitorioso da guerra. No entanto, não conseguiu apoiar os objetivos planejados nem na Alemanha nem nos territórios ocupados, e muito menos no resto da Europa. Incapaz de gerar algo novo, o nazismo produziu produtos estéticos de baixo nível que apelavam a tradições antigas, combinadas com mensagens sobre a força da pátria, a "pureza" ariana e o papel maternal das mulheres.
Neste ponto, surge uma nova pergunta que não encontra resposta no texto: Existiram intelectuais orgânicos dentro do nazismo que tentaram sistematizar uma teoria cultural coerente? "Fora do núcleo central, não podemos falar de uma teoria cultural nazista coerente. Embora os líderes nazistas estivessem de acordo em princípio, tinham concepções distintas sobre a cultura e seu uso propagandístico. Por exemplo, Heinrich Himmler acreditava que o sistema universitário existente poderia ser utilizado para a cultura nazista; Alfred Rosenberg, por outro lado, pensava que deveriam ser construídas novas universidades nazistas", sustenta o professor Kater.
A cultura na Alemanha nazista não apenas amplia a análise de um elemento-chave do período, mas, ao focar na arte e nos meios de comunicação, consegue dar conta de diversas dimensões sociais, legais, sindicais, políticas e bélicas do governo totalitário alemão. Entre suas múltiplas contribuições, o livro desenvolve teses inter-relacionadas que explicam, por exemplo, a vocação do Partido Nazista de liquidar a liberdade de expressão e qualquer forma artística associada à República de Weimar, com o objetivo de impor uma nova estética. Esse propósito, no entanto, naufragou, em grande parte, devido a fatores subjetivos – como as diretrizes caprichosas dos chefes e a mediocridade dos artistas próximos ao nazismo – e objetivos – a guerra e a economia –, que limitaram tanto a qualidade quanto a efetividade da propaganda e do entretenimento nazista.
Michael Kater, autor erudito e prolífico, não evita a ambiguidade nem as contradições. "Do ponto de vista da Gestapo, cercar, desde uma data tão precoce, os ‘judeus da cultura’ – Kulturjuden, como os chamavam de forma pejorativa os nazistas – fazia sentido tendo em vista a logística da aniquilação", escreve no livro. Em outro parágrafo, observa que "o destino dos judeus ligados à cultura não foi diferente do de outros judeus" – já que as medidas de discriminação e extermínio se aplicaram a todos –, embora ressalte que "houve diferenças de caráter". Esse ênfase cultural poderia ser considerada uma superestimação do peso da cultura no regime nazista, deixando em segundo plano outras questões fundamentais, como o uso sistemático do terror interno, a falta de alternativas organizativas, os interesses de classe e a perseguição a diversas dissidências (comunistas, social-democratas, homossexuais, ciganos). Ernest Mandel já apontava em 1986 (em O significado da Segunda Guerra Mundial) que, embora o antissemitismo germânico tenha existido por séculos, não foi uma condição suficiente para o genocídio e a guerra.
Por outro lado, Kater é claro ao identificar as intenções propagandísticas do Partido Nazista, mas não desenvolve completamente o impacto que essas tiveram sobre o público. Filmes como Os Rothschild, O Judeu Eterno ou O judeu Süss, projetados para retratar os judeus como uma "ameaça" para a "comunidade racial germânica", exemplificam essa estratégia. O professor sustenta que, através dessas obras, "Goebbels podia ficar tranquilo: de um jeito ou de outro (…) as lições do regime haviam calado fundo" e que "as comportas da solução final poderiam se abrir sem que muitos cidadãos se perguntassem por que os judeus estavam desaparecendo". Em diálogo para este artigo, o autor modera sua posição, reconhecendo que "filmes como O Judeu Süss puderam reforçar o desprezo já existente pelos judeus ou consolidar preconceitos como a ideia de que os judeus eram culpados por crimes sexuais". Apesar disso, a centralidade atribuída à maquinaria propagandística como ferramenta de doutrinação poderia ser considerada exagerada.
Esse enfoque pode ser contrastado com outros estudos-chave sobre o nazismo, como o clássico Aqueles homens cinzentos, de Christopher Browning, que analisa como um batalhão de "homens comuns" participou das massacres nazistas sob a influência do racismo, da guerra e da dissolução das responsabilidades individuais na burocracia. Também com a mencionada obra de Ernest Mandel, que, de forma oposta, enfatiza a capacidade do nazismo de aglutinar as classes médias e altas, os "desclassificados" e uma minoria operária não organizada, enquanto o resto da sociedade permanecia em silêncio devido ao terror e à falta de alternativas políticas. Ou até mesmo com Richard Evans, que, em sua conhecida trilogia sobre o nazismo, argumenta que foi a estabilidade econômica e social o que impediu que o descontentamento se transformasse em uma oposição ampla. Onde se posiciona Kater entre essas perspectivas? Embora sua análise cultural seja sólida, sua obra não parece adotar uma postura clara diante dessas dinâmicas.
Nas conclusões, Kater adentra um terreno diferente e apela para uma comparação entre a cultura nazista, a fascista e a soviética. Essa análise, embora promissora, carece do respaldo bibliográfico e argumentativo que caracteriza as seções anteriores. Por exemplo, observa que, ao contrário do nazismo, o regime fascista italiano exaltava a modernidade tecnológica. No entanto, compartilha com o nazismo seus fracassos literários e visuais, bem como sua exaltação da guerra e da degradação com bases "raciais" e com fins expansionistas (nesse caso, em relação à população africana). Sobre o regime soviético, Kater afirma que, culturalmente, teria sido o mais opressor dos três. Embora reconheça certos momentos de abertura durante o período da Nova Política Econômica (NEP), desenvolvida entre 1922 e 1928, coloca uma ênfase excessiva na censura e chega a igualar a função do comissário de Instrução Pública da Rússia Soviética à de Goebbels, ao mesmo tempo em que negligencia as conquistas artísticas e educacionais dos primeiros anos da Revolução Russa. Chega a estender a repressão cultural do stalinismo aos próprios origens da insurreição, como se isso tivesse sido um desenvolvimento inevitável do processo revolucionário.
Apesar desses pontos, em nossa opinião discutíveis, o historiador consegue provocar reflexão e debate. Considera a eliminação de judeus "excepcionalmente criativos" como um "problema civilizatório" que marcou um retrocesso não apenas para a Alemanha, mas para o mundo inteiro. Também analisa a transição cultural após a queda do nazismo: desde as justificativas de artistas como Veit Harlan, que afirmou ter filmado O judeu Süss sob pressão – uma espécie de "obediência devida" cultural – até o surgimento de novas figuras que renovaram o panorama artístico alemão.
Para entender melhor como a Alemanha superou esse legado, Kater oferece uma continuação imprescindível: After the Nazis: The Story of Culture in West Germany [Depois dos nazistas: a história da cultura na Alemanha Ocidental] (Yale, 2023), onde explora a emergência de jovens com mentalidade democrática, como Günter Grass e Joseph Beuys. Esse longo e difícil processo, que se estendeu de 1945 até bem entrada a década de 1970, marca um fechamento necessário para refletir sobre os desafios atuais, em um mundo marcado pela polarização e pelo avanço de discursos autoritários.
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A maquinaria cultural do nazismo. Artigo de Jazmín Bazán - Instituto Humanitas Unisinos - IHU