26 Julho 2024
"A inclinação socialista de Weil é gradualmente corroída por um profundo pessimismo, que pode parecer razoável nos anos da ascensão de Hitler e das purgas de Stalin. Num famoso artigo, a filósofa se pergunta: 'Estamos indo para a revolução proletária?' E responde: não", escreve Raffaele Alberto Ventura, filósofo e escritor italiano, em artigo publicado por Domani, 18-07-2024. A tradução é de Luisa Rabolini.
Simone Weil é uma filósofa que tem tudo para nos seduzir. Falecida aos 34 anos, em 1943, contornou as rochas das ideologias dominantes para chegar a uma síntese entre socialismo e pensamento libertário, empenho político e inspiração espiritual. No final, o espiritual prevaleceu sobre o político, mas ninguém pode dizer como teria ainda evoluído se não tivesse sido prematuramente atingida pela tuberculose.
Dessa sua síntese são testemunho os últimos escritos recolhidos por Marco Dotti em Attenzione e preghiera [Atenção e oração], recentemente publicados pela Meltemi, incluindo uma breve "Autobiografia Espiritual". De fato, para compreender o seu pensamento, vale a pena fazer uma retrospectiva de toda a sua vida.
Na introdução do livro, Chiara Giaccardi evoca a "radicalidade" da filósofa. No entanto, nos anos da Guerra Fria, os comunistas olhavam-na com desconfiança, porque a sua filosofia, muito sedutora, se parece quase como uma escapatória, um refluxo. Giaccardi escreve: "Não há um projeto, um plano, um heroísmo sacrificial, mas um esvaziamento de si para dar lugar à verdade". Não é por acaso que o seu maior promotor, no período do pós-guerra, foi o mais sedutor dos anticomunistas, Albert Camus. Nos anos do sobressalto antissoviético de uma parte da intelectualidade francesa, o autor de O Estrangeiro publica os grandes livros de Simone Weil e organiza uma antologia dos seus escritos de juventude, com o sugestivo título Oppression et liberté. Outra Simone, de Beauvoir, denunciará a recuperação do seu pensamento pela direita.
Nem todos sabem, no entanto, que Weil foi, na juventude, uma fervorosa militante sindical revolucionária, interessada pelas posições de Lev Trotsky - que conheceu e com quem brigou no seu apartamento parisiense - antes de perceber o seu oportunismo. No fragmento autobiográfico presente em Atenção e Oração, Weil conta como a caridade cristã - que para ela coincide com a justiça - a tinha levado a trabalhar na fábrica e como aquela experiência a transformou. "Ali recebi, para sempre, a marca da escravidão, como a marca que os romanos punham na testa dos seus escravos mais desprezados. Desde então, sempre me considerei uma escrava".
A filósofa apercebeu-se logo que também havia escravos na União Soviética. Expatriada para a Alemanha em 1932-1933, Weil segue os debates que acompanham a queda dos partidos operários face à ascensão dos nazistas e aproxima-se das posições da extrema-esquerda, segundo as quais a URSS seria tudo menos um Estado operário. Nas suas reflexões que publica em jornais radicais como La Révolution prolétarienne, la Critique Sociale e L'école émancipée, a filósofa denuncia um partido comunista ao serviço de uma burocracia estatal estrangeira, que defende os seus próprios interesses e não certamente aqueles dos trabalhadores. Mas como a alternativa ao comunismo são os reformistas socialdemocratas ou - pior - os nacional-socialistas, nenhum partido representa realmente a classe operária. O que fazer, então?
A inclinação socialista de Weil é gradualmente corroída por um profundo pessimismo, que pode parecer razoável nos anos da ascensão de Hitler e das purgas de Stalin. Num famoso artigo, a filósofa se pergunta: "Estamos indo para a revolução proletária?". E responde: não. Os bolcheviques instauraram uma burocracia permanente e irresponsável, recrutada por cooptação, que, através da concentração de todas as funções econômicas e políticas, desfruta de um poder sem precedentes na história. Simples "deformação" de um Estado operário, "anomalia", "doença" ou "transição", como afirma Trotsky?
Não, a URSS é um sistema que obedece às suas próprias leis, "nem capitalista nem operário". Por conseguinte, o papel dos partidos comunistas não é mais do que sufocar a luta revolucionária do proletariado. Juntamente com os anarquistas e os dissidentes do trotskismo, a filosofia denuncia uma convergência entre os regimes stalinista, fascista e liberal, adotando como chave de leitura o tema da burocratização do mundo. Essas ideias, na época minoritárias, ganharão maior notoriedade no pós-guerra, quando se falará de antitotalitarismo.
Como muitos outros autores bem mais célebres defenderão mais tarde, os três regimes são formas diferentes da mesma ditadura econômica exercida pelos técnicos, uma nova forma de opressão exercida não em nome da propriedade privada, mas da função. Essa função, dita administrativa ou burocrática, é aquela que consiste em coordenar o trabalho dos outros.
Por conseguinte, o erro de Marx foi, segundo Weil, não se questionar sobre a nova classe opressiva dos tecnocratas da direção que poderia ter nascido dessa função. Mas essa função é permanente e independente das formas legais de propriedade, uma vez que impõe - pela máquina - um modo de produção baseado na subordinação daqueles que executam aos que coordenam. Weil não será nem a primeira nem a última nas fileiras dos desiludidos do comunismo a acabar por concordar com os teóricos conservadores do elitismo.
O que é então o totalitarismo para Weil?
Na sua autobiografia espiritual, ela reconduz tudo para "o uso destas duas pequenas palavras: anátema sit”. Forjadas no seio da Igreja, nos tempos da Inquisição, elas são reencontradas, segundo a filósofa, na ideologia de todos os regimes totalitários, desde o império romano até o seu tempo. Em suma, o dogmatismo, o domínio de quem sabe sobre quem não sabe.
Marx tinha razão, na sua opinião, quando denunciava a divisão degradante entre trabalho manual e intelectual como o pior defeito do capitalismo. No entanto, tratava-se de uma contradição intrínseca à industrialização e à racionalização. De fato, na fábrica racionalizada, mesmo soviética, o trabalhador é privado de toda a iniciativa, inteligência, conhecimento, método. A consequência trágica é a destruição de todas as condições de bem-estar material e moral do indivíduo, de todas as condições de desenvolvimento intelectual e cultural - "uma questão de vida ou de morte".
Na opinião da filósofa, a URSS não está no caminho da emancipação, mas é simplesmente um instrumento nas mãos de outra classe. Em nenhum país, escreve, as massas trabalhadoras são mais miseráveis, mais oprimidas, mais aviltadas do que na Rússia: "Lenin, depois de ter esboçado nos seus escritos o esquema de um Estado sem exército, polícia ou burocracia distintas da população, começou a construir a mais pesada máquina burocrática, militar e policialesca que jamais esmagou um pobre povo e infeliz".
Ela observa uma tendência transversal "para a subserviência a uma forma totalitária do Estado". O problema central a resolver é, portanto, encontrar uma forma para formar uma organização que não gere burocracia. E é isso que, em última análise, a leva a rejeitar o marxismo e a promover um retorno ao socialismo pré-científico, o que lhe valerá a acusação de ser reacionária e pequeno-burguesa: "Não acredito que o movimento operário possa voltar a ser algo de vivo no nosso país enquanto não procurar, não digo doutrinas, mas uma fonte de inspiração naquilo que Marx e os marxistas combateram e desprezaram loucamente: em Proudhon, nos agregados operários de 1848, na tradição sindical, no espírito anárquico".
Um caminho que será percorrido três décadas mais tarde por boa parte da geração 1968, seduzida pela ideia de autogestão, antes de voltar às fileiras seguindo a "terceira via". O famoso refluxo.
Refluxo que Weil tinha, como já foi sugerido, antecipado. Menos de dez anos depois, desiludida com todas as opções disponíveis no tabuleiro político, Weil já abandonou as suas aspirações revolucionárias para se dedicar à oração. A filósofa já pensa na sua morte, um instante que constitui "a norma e o objetivo da vida", no qual "por uma fração infinitesimal de tempo, a verdade pura, nua, certa e eterna entra na alma". Comentando o Pai-Nosso num texto agora reunido em Atenção e Oração, escreve: "Devemos desejar que tudo o que aconteceu tenha acontecido, e nada mais".
A parábola de Simone Weil, vista por esse ponto de vista, antecipa em algumas décadas aquela de uma outra geração de intelectuais, que passou das barricadas à resignação por falta de alternativas viáveis.
Mas nessa fuga da política ainda há política. Porque "a ação sobre si mesmo, a ação sobre os outros, tem a ver com a transformação dos significados". Ou, dito de outra forma: "A guerra, a política, a eloquência, a arte, o ensino, toda a ação sobre os outros consiste essencialmente em mudar o que os homens leem".
Evidentemente não foi suficiente.