07 Fevereiro 2024
"Mesmo no primeiro milênio, quando reinava uma unidade precária entre o Oriente e o Ocidente, as duas Igrejas mostravam-se diferentes apesar de manter a mesma confissão de fé no único Deus e na Trinidade divina revelada por Jesus Cristo", escreve o monge e teólogo italiano Enzo Bianchi, prior e fundador da Comunidade de Bose, em artigo publicado por Repubblica, 05-02-2024. A tradução é de Luisa Rabolini.
Nos dois mil anos de história do cristianismo houve muitas formas de viver a fé, pensá-la e transmiti-la, e a diversidade foi atestada no desenrolar da história. Desde o início houve vários cristianismos, não apenas um, e a fé que viviam os pais da Igreja greco-bizantina era diferente da fé da Igreja latina.
Mesmo no primeiro milênio, quando reinava uma unidade precária entre o Oriente e o Ocidente, as duas Igrejas mostravam-se diferentes apesar de manter a mesma confissão de fé no único Deus e na Trinidade divina revelada por Jesus Cristo. É verdade que a Igreja Católica romana conheceu uma certa uniformidade garantida pelo Romano Pontífice, princípio e fundamento da unidade da Igreja, e por isso única era a liturgia em Roma, como no Congo e na China, únicas a lei e a moral com as suas prescrições.
Mas hoje não é mais assim e aquele “mundo mais ideal que real” se estilhaçou. É fácil constatar isso observando os conflitos entre episcopados e entre episcopados e Santa Sé, mas sobretudo parece evidente a diversidade no viver o cristianismo dentro da mesma comunidade cristã.
Essa diferenciação é recente e é enfatizada pelas mídias sociais.
As situações são diferentes nas regiões onde a Igreja Católica está presente; mas na Itália podemos ler essas tendências sem fechá-las como se estivessem numa gaveta. Frequentemente estão presentes católicos incertos, oscilantes e, portanto, não seria correto ler essas tendências de diversidade não permeáveis entre si. Vamos dizer a verdade: alguns católicos ainda estão ligados à tradição, ao que viveram antes do Concílio. Sobre eles ainda está presente o legado pós-tridentino onde a fé era vivida sob a hegemonia do dogma e o jugo da lei. Para eles o cristianismo continua sendo uma obediência e uma observância de leis e preceitos, e Deus é principalmente um Deus de justiça que só pode ser misericordioso quando vê o arrependimento daqueles que cometem erros. Primeiro a verdade deve ser afirmada, depois o amor.
Note-se bem que se na Itália essa presença, que só pratica a liturgia pré-conciliar, é minoritária e envolve poucos jovens, na França e nos EUA é uma minoria que chega a 30-40% com muitos jovens.
Além disso, existe, mesmo que desgastada e inerte, uma parcela de católicos decepcionados pelo pós-Concílio que tem dificuldade de acreditar na novidade do Papa Francisco. São aqueles católicos engajados no voluntariado, no sinal de caridade. Mais ex-militantes do que militantes. Mas frequentam a Igreja, estão presentes na liturgia e mantêm viva a identidade católica.
E finalmente existem as pessoas, o povo de Deus, cristãos comuns que não falam de Igreja ou de religião, mas são crentes, praticam o bem sem rótulos nem ostentação, são pais, mães e filhos de famílias que lutam para viver o sensus fidei, são a multidão que Jesus amava porque o seguia tendo esperança apenas nele. São a maioria do povo de Deus, amam o Papa Francisco e o veem como um profeta que torna o Evangelho uma boa notícia para os pobres, para aqueles que não contam nada.