25 Janeiro 2024
Não é apenas a África do Sul que se coloca contra Israel. A ação ajuizada junto à Corte Internacional de justiça (CIJ) no final do ano passado contra o Estado judeu acusado de genocídio está produzindo um efeito cascata entre os países e as opiniões públicas no continente e desencadeando posicionamentos cada vez mais claros.
A reportagem é de Luca Attanasio, publicada por Domani, 24-01-2024. A tradução é de Luisa Rabolini.
O primeiro país a se colocar ao lado de Pretória foi a Namíbia. O presidente Hage Geingob imediatamente pronunciou-se em apoio da causa para depois virar-se ferozmente contra a Alemanha, que correu em defesa de Israel. “A Alemanha”, disse ele, “não pode expressar moralmente o compromisso com a Convenção das Nações Unidas contra o genocídio e, ao mesmo tempo, apoiar o equivalente a um holocausto em Gaza".
Por trás dessa afirmação não há apenas irritação pela falta de alinhamento, mas também a raiva por um passado colonial indelével. De fato, a Alemanha, ex-colonizadora da Namíbia, cometeu ali o primeiro genocídio do século XX (1904-1908), cerca de 80 por cento do povo Herero e 50 por cento dos Namas do então Sudoeste Africano Alemão morreram depois de serem empurrados para o deserto pelos soldados alemães que anteriormente haviam selado os poços de água. Dezenas de milhares de namibianos foram massacrados ou submetidos a experimentos hediondos para demonstrar a inferioridade racial. Naquelas que os historiadores descrevem como os dramáticos testes gerais para o extermínio dos judeus de algumas décadas mais tarde, cerca de 75 mil pessoas morreram. Segundo o Presidente Geingob, a posição da Alemanha demonstra “a incapacidade de tirar lições de sua horrível história”.
“Como indivíduos, organizações e movimentos sociais da sociedade civil”, reza um apelo de alguns dias atrás, que traz fortes assinaturas do mundo político, cultural e social de Moçambique, “expressamos o nosso pleno e incondicional apoio a essa iniciativa de África do Sul e pedimos ao Governo de Moçambique para que tome uma posição pública e inequívoca em apoio desta causa na Corte Internacional de Justiça. Pedimos também ao nosso governo que interrompa qualquer relação com o Estado de Israel e à SADC (Comunidade de desenvolvimento da África Austral) e à União Africana para tomar as medidas necessárias para fazer com que um maior número de estados africanos se ative para condenar os atos perpetrados por Israel”.
A Tunísia anuncia que não pretende apoiar qualquer ação legal contra Israel, não porque não a compartilhe, mas porque seu presidente Saied quer evitar “qualquer ação que reconheça, mesmo que indiretamente, a existência legal do estado judeu”.
No entanto, juntamente com Egito, Líbia e Marrocos, faz parte da Organização de Cooperação Islâmica, o segundo maior bloco multinacional do mundo, que entrou imediatamente em campo ao lado da África do Sul.
Há uma longa tradição que liga a África do Sul à Palestina e, ao mesmo tempo, caracteriza a país da África Austral pelas suas posições anti-Israel. Após a sua libertação da prisão, Nelson Mandela firmou uma relação com a Organização para a Libertação da Palestina de Yasser Arafat, que havia apoiado a luta da ANC contra o apartheid, enquanto Israel apoiava o regime de minoria branca.
Além disso, em fevereiro passado, por ocasião da abertura da cúpula da União Africana, uma delegação de observadores israelenses liderada pela Embaixadora Sharon Bar-Li foi dramaticamente expulsa do plenário. Naquela ocasião, o Ministério do Exterior de Telavive havia declarado: “É triste ver que a União Africana seja mantida refém por um pequeno número de países extremistas como a Argélia e a África do Sul”.
No geral, a África, devido ao seu passado de subjugação ao poder colonial e por sua dolorosa história de libertação da opressão das potências ocupantes e colonizadoras, continua em massa a identificar-se com os palestinos e com a sua luta por uma pátria independente e livre.
Quando, em dezembro, a Assembleia Geral das Nações Unidas aprovou uma resolução pedindo um cessar-fogo humanitário em Gaza, a maioria dos países africanos manifestou-se a favor da moção. A clara maioria dos países africanos (52 de 55, ndr), reconheceu também a Palestina como Estado soberano.
Mas não é só Israel, como escreve Nesrine Malik no The Guardian, que está sob julgamento. A África do Sul coloca-se à frente do Sul Global e coloca à prova a pretensão de superioridade moral do Ocidente. Isso é repetido no New York Times por David Monyae, diretor do Centro de Estudos África-China da Universidade de Johanesburgo, para quem “ao intentar uma causa por genocídio contra Israel, a África do Sul não se limitou a chamar a juízo o governo israelense, mas também desafiou a ordem global do segundo pós-guerra liderada pelo principal aliado de Israel, os Estados Unidos. O caso demonstrou que uma nação africana pode manifestar-se para denunciar o que alguns consideram o duplo padrão dos países ocidentais em matéria de direitos humanos”.
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África do Sul arrasta o continente na causa contra Israel - Instituto Humanitas Unisinos - IHU