13 Abril 2023
Testemunhos inéditos e anedotas no novo livro de Giacomo Galeazzi, Ratzinger: Il Papa sceso dal trono (Ratzinger: o papa desceu do trono), um retrato de Bento XVI entre teologia, facções internas e viradas de época.
A reportagem é de Domenico Agasso, publicada por La Stampa, 11-04-2023. A tradução é de Luisa Rabolini.
Livro Ratzinger: Il papa sceso dal trono.
Em 19-04-2005, poucas semanas depois de denunciar a "sujeira na Igreja", no Coliseu durante a última Via Sacra de João Paulo II, o cardeal Joseph Ratzinger saiu vestido de branco da bancada central da Basílica de São Pedro, apresentando-se ao mundo com o nome de Bento XVI, e definindo-se um "simples e humilde trabalhador da vinha do Senhor". Menos de oito anos depois, o bispo alemão de Roma surpreende o planeta e traumatiza os fiéis: deixa o trono pontifício.
Ele ficará entre os muros sagrados como Papa Emérito, em coabitação com seu sucessor Francisco. De um dia para o outro. Ao se despedir, especifica que na sua eleição como papa havia algo que permanecerá “para sempre”: e de fato até o fim ele usará o hábito branco, assinará como “Benedictus XVI Papa emérito", ele fará chamar "Santidade" e "Santo Padre". Mas desde aquele dia fatídico, Ratzinger também se tornou para a história O papa que desceu do trono (Rubbettino, 2023), como intitulou o seu novo livro Giacomo Galeazzi, vaticanista de longa data de La Stampa e ensaísta, agora assinando páginas do exterior.
No prefácio do volume, Andrea Malaguti, vice-diretor substituto do nosso jornal, coloca preto no branco questionamentos de toda a humanidade, crente, não crente e diversamente crente: “Na minha cabeça explodiram milhões de perguntas. Muitas até infantis. Tipo: mas se um papa renunciar, significa que Deus escolheu mal ou é mais simplesmente a confirmação de que não é Deus quem escolhe?
Ou a resposta é, como quase sempre neste labirinto milenar supostamente espiritual, “não há resposta, estamos diante de um mistério”.
O "mistério" da renúncia de Bento só pode ser compreendido embrenhando-se nos meandros de seu pontificado inédito. O autor o acompanha amarrando pensamentos, gestos, ações e intervenções de um intelectual de projeção internacional, um gigante da teologia, guardião da Doutrina da Fé, eleito Pontífice poucas horas depois dos 27 anos do Papa Wojtyla.
Galeazzi analisa, também graças a testemunhos de renome, a originalidade da trajetória de Ratzinger, entre academia, Concílio Vaticano II e princípios não negociáveis. Até a espantosa renúncia e depois aos anos como emérito e à sua morte em 31 de dezembro do ano passado. Descreve os bastidores e conta anedotas, como aquele do ex-presidente da República Italiana, Francesco Cossiga, que “citava muitas vezes suas conversas com Bento XVI - escreve o jornalista - a quem o ligavam o amor pela literatura e também a paixão pelos doces. Aos domingos, o ex-chefe de Estado mandava entregar no Vaticano uma cassata ou uma bandeja de doces”.
Pelas suas ideias sobre economia e finanças, Bento XVI, além de “exercer um fascínio em alguns intelectuais leigos como Marcello Pera ou Massimo Cacciari ou num ‘ateu devoto’ como Giuliano Ferrara, tornou-se também um ponto de referência para aqueles a quem foi aplicada a definição de ‘marxistas ratzingerianos’".
A presença fraterna nos muros de Pedro de dois sucessores de São Pedro às vezes pesa sobre as Salas Sagradas, postas em dificuldade por manipulações que contrapõem “os dois Papas” e correm o risco de causar confusão e rachaduras. Em todo caso, Ratzinger garante reiteradamente que a sua amizade com Bergoglio é inoxidável. Ele diz que se sente "protegido por sua bondade". E enquanto Francisco - que o considera "o avô sábio" - está sob ataque de opositores internos, lembra aos novos cardeais "o valor da fidelidade ao Pontífice".
Claro, algumas tensões abriram no Vaticano a questão da ausência de uma regulamentação do instituto do papa emérito, como aponta no posfácio D. Michele Pennisi, arcebispo emérito de Monreale: “É importante iniciar uma reflexão do ponto de vista teológico e do direito canônico sobre a condição de um Pontífice Romano que renuncia ao exercício do ministério petrino”.
Em todo o caso, segundo Malaguti, Ratzinger, “talvez involuntariamente, escancarou a porta de uma Cidadela Sagrada acostumada a guardar seus segredos e suas vergonhas do lado de dentro. O olhar de todo o planeta sobre a Igreja mudou. Se isso foi bom ou ruim, suponho que logo o descobriremos".
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Ratzinger, que desceu do trono e lançou uma luz sobre os segredos do Vaticano - Instituto Humanitas Unisinos - IHU