09 Setembro 2022
"O grito desses excluídos, que não conta nada para os distraídos, provoca uma necessidade de transcendência, de saída de si para os outros, para o Outro. Uma lição de vida, aquela da Irmã Maria De Coppi que se justamente reclamava da falta de atenção da imprensa local em relação ao conflito que se trava desde outubro de 2017 no Norte de Moçambique", escreve Giulio Albanese, missionário comboniano fundador da Agência Misna, em artigo publicado por Avvenire, 08-09-2022. A tradução é de Luisa Rabolini.
Não é lícito ficar calados diante da morte de uma mulher consagrada que deu sua vida pela África, seguindo o exemplo de seu fundados, Daniel Comboni.
A Irmã Maria De Coppi foi morta terça-feira à noite em Moçambique, na sua missão em Chipene.
O que aconteceu deveria abalar as nossas consciências, no mínimo porque nunca como hoje existe uma necessidade urgente de testemunhas capazes de tornar inteligível a mensagem evangélica. Irmã Maria, em Moçambique desde 1963, sempre foi coerente em suas escolhas, interpretando fielmente o que o Papa Francisco esperava: estar permanentemente na periferia, ao lado dos pobres. Em todos esses anos, junto com suas coirmãs e coirmãos, arriscou a vida várias vezes, especialmente durante a sangrenta guerra civil que cobriu de sangue o país de 1975 a 1992. E se por um lado é verdade que só quem provaram o choque da precariedade ou a angústia das trágicas ambiguidades impressas pela história podem aproximar-se mais do que outros ao mistério de Deus, é evidente que o seu martírio representa uma oportunidade para operar um saudável discernimento.
Paulo VI na Evangelii nuntiandi escreve: "O homem contemporâneo escuta com melhor boa vontade as testemunhas do que os mestres" (n. 41). O cristianismo, de fato, é uma religião que não se limita a enunciar os valores, mas exige que sejam autenticamente testemunhados, não admitindo a separação e a dicotomia entre a enunciação dos princípios e a encarnação dos mesmos. A morte da Irmã Maria, a última de uma longa série de 'sentinela da manhã' que todos os anos caem no campo em terras remotas, desafia-nos porque essa mulher comboniana deu a vida pela causa do Reino, defendendo os direitos dos oprimidos em uma terra esquecida por tudo e por todos. Uma escolha sob a bandeira da autenticidade e da gratuidade, também porque a Martyria, de que falam os Padres da Igreja, não se refere apenas aos momentos finais, aqueles que marcaram o sacrifício extremo da própria vida. Ela é sobretudo testemunho cotidiano do Evangelho. A Irmã Maria - é preciso dizer - realmente ajudou os africanos "na casa deles" - reconhecendo o rosto do Deus Vivo nos pobres. O que ela vivenciou em quase sessenta anos de missão em tempo integral foi o serviço às vítimas da miséria e das injustiças que continuam a ser perpetradas até hoje na ex-colônia portuguesa. "Porque para encontrar os mártires - como disse o Papa Francisco - não é necessário ir às catacumbas ou ao Coliseu: os mártires estão vivos agora, em muitos países".
E o grito desses excluídos, que não conta nada para os distraídos, provoca uma necessidade de transcendência, de saída de si para os outros, para o Outro.
Uma lição de vida, aquela da Irmã Maria que se justamente reclamava da falta de atenção da imprensa local em relação ao conflito que se trava desde outubro de 2017 no Norte de Moçambique.
Parece certo que o ataque perpetrado em Chipene seja de matriz jihadista, pelas mãos de islamistas da região norte de Cabo Delgado. Não seria de todo uma surpresa, considerando que recentemente essas formações chegaram até mesmo à zona de Nampula. É uma das muitas 'guerras esquecidas', aquelas que geralmente não são notícia na Itália, mas que custam a vida de um número incontável de civis. O paradoxo de que a Irmã Maria foi testemunha nestes anos pode ser traçado na contraposição entre os extremos: riqueza e pobreza. O Moçambique é rico em gás, sem falar em ouro, grafite, titânio e bauxita. Um país, portanto, refém de potentados estrangeiros de todos os tipos cuja intenção é alcançar a maximização do lucro ou a desestabilização da região como fazem os islamistas. É por isso que o sacrifício dessa missionária é uma profecia para dar voz a quem não tem voz.
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