09 Junho 2022
"Pentecostes é o Espírito que age, não só no coração de alguns mestres privilegiados, mas é o Espírito, a Palavra que chega a cada um na sua maneira de ser, de pensar, de agir. É um apelo para nós, crentes em Jesus, para deixarmos que a Palavra alcance a linguagem do outro, o modo de compreensão do outro, dos outros, em suas diferenças e originalidade. Cabe a nós aceitar que eles a recebam, sintam e a expressem à sua maneira: o importante não somos nós. São eles, é a Palavra recebida, é o mundo", escreve Jean-Luc Lecat, em artigo publicado por Saint-Merry Hors-les-Murs e reproduzido por Fine Settimana, 07-06-2022. A tradução é de Luisa Rabolini.
Jesus os havia advertido: eu estou indo embora. Já lhe disse muitas coisas, certo. Mas não tudo! E "o Espírito Santo que o Pai enviará em meu nome, ele vos ensinará tudo e vos fará lembrar de tudo o que vos tenho dito".
E eis que, logo após sua partida, seus amigos, até aquele momento um pouco apavorados e indecisos, saem do silêncio e começam a falar daquele Jesus em todas as direções e a todos aqueles que o querem ouvir. Jesus, até então uma experiência local, torna-se uma aventura oferecida ao mundo judaico, claro, mas também aos pagãos, gregos, partos, medos ou elamitas, e muitos outros... Para todos os habitantes da terra! Habitados pela compreensão de sua Palavra, os companheiros de Jesus se lançam em algo radicalmente novo, fortalecidos pelo Espírito que Jesus lhes prometeu.
Parece-me que este evento de Pentecostes seja o anúncio de que todo o futuro de Jesus, todo "o após-Jesus", será feito de novidades, descobertas, expressões da Palavra viva e ruminada no coração de cada discípulo. Não uma triste repetição de verdades estereotipadas a acreditar e coisas a fazer ou não fazer, mas o ressoar das palavras de Jesus na profundidade de cada um, de cada uma.
Aquelas línguas de fogo e aquela compreensão universal, eu as entendo neste dia de Pentecostes como o advento de um mundo rico em invenções possíveis e de diversidade. A Palavra oferecida a qualquer um e possivelmente compreendida por toda pessoa, independentemente de sua cultura e de suas tradições, sua idade e sexo, sua educação, seu meio social...
Isso só pode gerar imensa riqueza e diversidade, um triunfo de vida.
Mas um Pentecostes como este não é um suicídio para a ordem estabelecida? Como não imaginar que, diante de tal surgimento de vida, alguns se sintam tentados a querer impor barragens e fronteiras? Quem não o considera um perigo? Percebam, existe o risco de desordens e derivas incontroláveis. Se cada um se coloca à escuta da Palavra, e a escuta "na sua própria língua", isto é, à sua maneira, onde vamos parar?
Então pode reaparecer na cabeça das pessoas que se consideram responsáveis o antigo sonho de construir algo como uma torre de Babel: todos falamos a mesma linguagem, uma só língua, uma só maneira de se expressar e de entender, e então tudo será melhor, serviremos melhor os seres humanos, a Palavra não correrá o risco de ser deformada, e a voz da verdade será ouvida por todos.
Será para o bem de todos!
Mas esse é o sonho do Espírito?
Lembremos que Deus se levantou contra o projeto de Babel, interveio para bloquear tudo e dispersou aqueles que também pareciam ser artífices da unidade e do bem-estar dos seres humanos.
Diante de Babel, Deus se manifesta como defensor absoluto da diversidade e de sua riqueza, mesmo que isso corra o risco de criar inúmeras dificuldades. "'Vamos descer, portanto, e confundir a sua língua, para que eles não entendam mais a língua um do outro'. O Senhor os espalhou dali sobre a face de toda a terra" (Gn 11, 7-8).
O Pentecostes não é a mesma expressão da paixão de Deus pela diversidade reconhecida e respeitada por toda a terra?
É na linguagem de cada um que a Palavra é chamada a ser vida. O evento que "bagunça", revolucionário, daquele dia de Pentecostes, não é um dom particular dado aos apóstolos, é o fato que os presentes, em toda a sua diversidade, ouvem e compreendem cada um na sua própria língua.
Pentecostes é o Espírito que age, não só no coração de alguns mestres privilegiados, mas é o Espírito, a Palavra que chega a cada um na sua maneira de ser, de pensar, de agir.
É um apelo para nós, crentes em Jesus, para deixarmos que a Palavra alcance a linguagem do outro, o modo de compreensão do outro, dos outros, em suas diferenças e originalidade. Cabe a nós aceitar que eles a recebam, sintam e a expressem à sua maneira: o importante não somos nós. São eles, é a Palavra recebida, é o mundo.
E a Palavra de Pentecostes, esse Espírito que cada um recebe em sua própria língua, já não é vivo, fora de qualquer referência cristã explícita, no coração de tantos engajados em ONGs ou no cuidado, de tantos educadores e professores? Essa Palavra, transmitida há mais de vinte séculos através de instituições, culturas, modos de vida, não anima o espírito, o coração também de tantas pessoas que não fazem referência a Jesus?
Pentecostes, festa de todos, palavra em todos e para todos, abundância às vezes confusa e inquietante de palavras e atos de vida, liberdade que o Espírito concedeu a todos, além de todas as regras e poderes. Grande confusão aos olhos dos sábios e racionais, mas uma promessa indelével de vida para o nosso mundo!
“O Pai vos enviará o meu Espírito que vos fará compreender tudo”.
Viva o povo crente em Jesus.
Que cada um ouse acreditar no seu valor único e procure se colocar na escuta dessa pequena voz no segredo do coração quando deixa ressoar a Palavra.
Que cada um ouse deixar-se transportar também por caminhos desconhecidos e novos, alimentado e corroborado da partilha com outros apaixonados por Jesus.
E que a Palavra, fonte de liberdade e confiança de cada pessoa humana, seja oferecida sem restrições e sem exclusividade aos contemporâneos.
Que seja Pentecostes para todos!
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Pentecostes, uma festa que “bagunça” - Instituto Humanitas Unisinos - IHU