"Na liturgia da Igreja, a manifestação do Espírito Santo é comemorada não no mesmo dia da Ressurreição, mas na Solenidade de Pentecostes. Nisso, o calendário cristão segue o relato de Lucas, que relata a vinda o Espírito Santo cinquenta dias depois da ressurreição. Tradicionalmente, tal opção lucana é interpretada à luz do calendário judaico: Páscoa e Pentecostes são festas agrárias, ligadas, respectivamente, à semeadura e à colheita dos primeiros frutos. Ao escolher Pentecostes como o dia da manifestação do Espírito, Lucas quer que leitor compreenda que o Espírito Santo é o primeiro fruto que a comunidade colhe da ressurreição do Senhor.
Logo se vê que a opção teológica de João é bem outra. Para ele, a Ressurreição de Jesus é uma nova criação e, por isso, na tarde do primeiro dia da semana, é necessário que o Espírito venha e fecunde a comunidade, que está vazia e sem esperança."
Subsídio elaborado pelo grupo de biblistas da Escola Superior de Teologia e Espiritualidade Franciscana - ESTEF:
Dr. Bruno Glaab
Me. Carlos Rodrigo Dutra
Dr. Humberto Maiztegui
Me. Rita de Cácia Ló
Edição: Prof. Dr. Vanildo Luiz Zugno
Primeira Leitura: At 2,1-11
Salmo: 103, 1ab e 24ac.29bc-30.31.34
Segunda Leitura: 1Cor 12, 3b-7.12-13 ou Rm 8,8-17
Evangelho: Jo 20,19-23
O evangelho deste domingo se encontra nos relatos pascais do capítulo 20 de João. Segundo Jo 20,19-23, Jesus dá o Espírito Santo no mesmo domingo da ressurreição.
Literalmente, o v.19 diz: quando já tinha anoitecido, desse mesmo dia, o primeiro da semana, pondo-se no meio deles. A referência ao horário – quando já tinha anoitecido – é uma referência a Ex 12,42: “Aquela foi a noite durante a qual o Senhor velou para os fazer sair do Egito.” A ênfase ao primeiro dia da semana indica que a ressurreição de Jesus é uma nova criação. O ressuscitado cumpre o que fora prometido em 14,18: não vos deixarei desamparados. Há de se notar que Jesus caminha desde a porta: ele simplesmente aparece no meio. Não é tanto uma presença física, e sim espiritual: Jesus está presente quando a comunidade está reunida.
O Senhor Ressuscitado vem para ficar com os seus e trazer-lhe a paz: “Paz a vós!” (v. 19). É esta saudação que provoca o reconhecimento: Jesus está presente no meio deles (14,27-28) e sua vitória (16,33) elimina o medo e a incerteza citados no início do texto hoje lido.
No v. 20, Jesus mostra “as mãos e o lado”, isto é, os ferimentos. Deste modo, os discípulos podem comprovar que o ressuscitado é o mesmo que fora crucificado. Os sinais da cruz permanecem: isso indica que o amor que levou Jesus à cruz também permanece. A mesma missão de Jesus agora é dos discípulos: como o Pai me enviou também eu vos envio (v. 21). E eles devem cumpri-la do mesmo modo como Jesus a cumpriu, com o amor até o fim, isto é, até as últimas consequências.
O v. 22 – Soprou sobre eles... recebam o Espírito Santo –, o verbo usado pelo evangelista é o mesmo de Gn 2,7, quando Deus criou o homem. Lembremo-nos: a ressurreição de Jesus é uma nova criação. Por isso, ao contrário do Jesus de Lucas, que faz o Espírito esperar cinquenta dias até Pentecostes, o Jesus do Quarto Evangelho sopra o Espírito no mesmo dia da ressurreição: não pode haver criação sem o Espírito de Deus (Gn 1,2; 2,7).
O arremate do v. 23 – aqueles a quem perdoardes, serão perdoados... – leva a perguntar: A quem Jesus dá essa missão? Alguns afirmam que se trata dos apóstolos (e seus sucessores): um grupo reduzido e privilegiado. Mas devemos notar que o Quarto Evangelho fala de “discípulos”, sem especificar o grupo dos Doze. Em todo caso, a missão de perdoar, isto é, de transmitir a todos a misericórdia de Deus, é agora estendido à comunidade cristã. Somos, portanto, a comunidade da salvação, que denuncia e se opõe ao pecado. No Quarto Evangelho, pecar equivale a negar a Luz e, portanto, não aderir à verdade e ao amor.
Na liturgia da Igreja, a manifestação do Espírito Santo é comemorada não no mesmo dia da Ressurreição, mas na Solenidade de Pentecostes. Nisso, o calendário cristão segue o relato de Lucas, que relata a vinda o Espírito Santo cinquenta dias depois da ressurreição. Tradicionalmente, tal opção lucana é interpretada à luz do calendário judaico: Páscoa e Pentecostes são festas agrárias, ligadas, respectivamente, à semeadura e à colheita dos primeiros frutos. Ao escolher Pentecostes como o dia da manifestação do Espírito, Lucas quer que leitor compreenda que o Espírito Santo é o primeiro fruto que a comunidade colhe da ressurreição do Senhor.
Logo se vê que a opção teológica de João é bem outra. Para ele, a Ressurreição de Jesus é uma nova criação e, por isso, na tarde do primeiro dia da semana, é necessário que o Espírito venha e fecunde a comunidade, que está vazia e sem esperança.
Esta diferença de teologias nos faz compreender que cada evangelista responde às necessidades de sua comunidade, mas o Espírito é o mesmo, com seus muitos dons de vida, força e luz.