Eternidade e tempo

Foto: Pixabay

11 Junho 2022

 

Complexidade e contaminação entre os saberes, limite e abertura, relação e liberdade: entre estas – e muitas outras – dimensões, desenvolveu-se o pensamento gerado pelo tema “Eternidade entre espaço e tempo: da consciência ao cosmos”, no congresso promovido pelo Master in Death Studies and the End of Life da Universidade de Pádua, com a colaboração da Faculdade Teológica do Triveneto, na Itália.

 

A reportagem é de Paola Zampieri, publicada por Settimana News, 03-06-2022. A tradução é de Moisés Sbardelotto.

 

Três dias repletos de intervenções e debates sobre o tema da eternidade, multifacetada nas diversas leituras da Física, Filosofia, Psicologia, Teologia: o congresso foi uma preciosa oportunidade de contaminação entre os saberes, durante os dias 19 a 21 de maio 2022, em Pádua, dirigido por Ines Testoni.

 

A Faculdade Teológica do Triveneto colaborou com a contribuição do decano, Andrea Toniolo, na direção científica – junto com Ines Testoni e Fabio Scardigli – e em particular organizando o terceiro dia dos trabalhos.

 

A eternidade é um tempo anacrônico

 

Eternidade e tempo entre filosofia e teologia” e “O anúncio divino da eternidade” foram as duas seções em que se articulou o aprofundamento do dia 21 de maio, que contou com a contribuição de seis vozes de teólogos e filósofos.

 

“A Bíblia desenvolve um conceito alternativo de tempo, que já é evidente no primeiro relato da criação. O sétimo dia, que no cristianismo se estende até o oitavo, não faz parte do tempo cronológico, mas é o acréscimo festivo que transcende o tempo e expressa o seu propósito festivo”, começou Kurt Appel (Universidade de Viena).

 

Em sua fala, com incursões na monadologia de Leibniz e na dialética hegeliana, ele mostrou que uma concepção cronológica do tempo é reducionista e que o sentido festivo do tempo está ligado ao tempo do Outro, que encontra sua voz no texto bíblico. “A Eternidade – concluiu – é a Voz do Outro que nos chama. Não é um tempo que pode ser representado, mas um tempo entre os tempos que se dá sempre de novo na abertura ao Outro, um tempo anacrônico ao qual corresponde a abertura infinita”.

 

Kierkegaard, Heidegger e Ricoeur foram as referências de Roberto Tommasi (Faculdade Teológica do Triveneto), que demarcou alguns sinais na relação entre tempo e eterno, uma problemática bastante complexa e decisiva que percorre a história do pensamento ocidental.

 

O percurso delineado levou à aporética do tempo, em que o pensamento experimenta aquela incessante inquietação em que somente ele pensa. “A oscilação entre concepção existencial e cosmológica do tempo, que emerge do confronto e às vezes da confusão entre elementos filosóficos, teológicos, científicos e narrativos, manifesta o seu caráter aporético que introduz o pensamento a algumas categorias do eterno. Estas – concluiu Tommasi – se, por um lado, manifestam complexidade e ambivalência, por outro, alimentam a inquietação vital que caracteriza constantemente o voltar-se renovador do pensamento à questão do tempo e do eterno”.

 

Mediante a metafísica clássica de Platão e Aristóteles e passando pela crítica de Bergson e de Severino à concepção grega do tempo referida ao Eterno, Leonardo Messinese (Pontifícia Universidade Lateranense) propôs a tese segundo a qual o Eterno, o ser imutável, constitui o sentido original do tempo e, analogamente, da história.

 

“O pensamento metafísico – observou – conserva o seu valor também em referência à teologia revelada, que confere à metafísica um conteúdo que, no horizonte do saber racional, não pode aparecer constitutivamente, mas só é possível aos olhos da razão. A metafísica, como obra da razão que é comum a todos os humanos, confere à teologia revelada o terreno mais próximo para se dispor a dialogar com as outras formas do saber, a começar pelo saber científico, e para articular a sua própria configuração específica da relação entre o tempo e o Eterno”.

 

 

O tempo revela ou nega o eterno?

 

Giuseppe Barzaghi (Escola de Anagogia – Studio Filosófico Dominicano) desenvolveu o tema “Mistério-Desígnio eterno: a simultaneidade da inspeção”. “O olhar eterno de Deus é tão imutável assim como a instantaneidade”, afirmou. “Conhecendo sua própria essência, Deus conhece todas as realizações semelhantes da sua essência, desde sempre e para sempre, que são chamadas de criaturas: Deus diz toda a sua essência, mas não totalmente, em cada uma de suas determinações. A criaturalidade, portanto, contém em si Deus todo, mas não totalmente”.

 

O nunc, o agora, nós o chamamos de tempo, mas é também uma degustação de eternidade: “Habitando o tempo, temos uma inspeção do eterno”.

 

A pergunta sobre se o tempo é revelação ou negação do eterno foi abordada por Andrea Toniolo (Faculdade Teológica do Triveneto) a partir da metáfora da “morte de Deus” retomada pelo teólogo evangélico protestante E. Jungel, que marcou o pensamento moderno, e da expressão “sexta-feira santa especulativa” cunhada por Hegel.

 

“A morte, precisamente por ter se tornado morte de Deus, é compreendida de novo, determinada de novo, não por ser deixada para trás, mas porque permanece como o evento da vida”, explicou. “A morte não é mais alheia ou alienante; é uma fronteira (Grenze) que limita mas também põe em relação, em comunicação: é o fim de um tempo e de um espaço de vida, mas não o fim do tempo e do espaço”.

 

 

O fato de o ser humano ser constituído pela relação é a eterna limitação, sem a qual o ser humano não seria mais humano. Tempo e espaço são a condição da sua existência, da sua história, do seu progresso. “Esta história mundana – concluiu – é a ‘parábola silenciosa da eternidade’, em que ocorre a unidade incindível e indistinguível entre tempo e espaço”.

 

Uma leitura do tempo e da eternidade na sua relação dentro do contexto do pensamento dialógico foi proposta por Leopoldo Sandonà (Faculdade Teológica do Triveneto). Uma viagem pelo mundo judaico e cristão, do pensamento filosófico e teológico, que se debruçou sobre o pensamento cristão de Romano Guardini (1885-1968) e sobre o pensamento judaico de Franz Rosenzweig (1886-1929).

 

“Em ambos os casos, embora com ênfases diferentes, a eternidade é abertura nas relações (divinas e humanas), é espaço aberto que não é redutível ao tempo, mas não é indiferente ou alternativo ao tempo”, sublinhou Sandonà, que, por fim, evocou algumas analogias com o pensador japonês Nishida Kitaro (1870-1945).

 

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