19 Janeiro 2021
"Quantos homens e mulheres dizem, de forma mais ou menos explícita: "Não aguentamos mais!" É possível que esse grito não seja ouvido?", questiona Enzo Bianchi, monge italiano e fundador da Comunidade de Bose, em artigo publicado por La Repubblica, 18-01-2021. A tradução é de Luisa Rabolini.
Eis o artigo.
Ao longo da minha vida, graças a uma educação severa recebida sobre os relacionamentos com os outros, sempre procurei dar primazia à escuta, porque tinha compreendido e sempre pude verificar que a escuta dos homens e das mulheres, a escuta da consciência através da qual, para um fiel, Deus fala e a escuta de todas as realidades, mesmo as mais humildes, dá razões para viver plenamente. “Cada coisa tem sua voz”, escreve Paulo de Tarso: às vezes uma voz suave, como uma brisa, um silêncio eloquente, mas audível quando se presta atenção não apenas com o ouvido, mas também com o coração. Certamente há muita escuta na cela solitária e silenciosa da própria solidão, quando os abismos e mesmo os infernos que nos habitam nas profundezas fazem ouvir seus gritos, ou quando os sentimentos de amor, harmonia e paz doam a todo o ser, alma e corpo, a quietude.
Nunca frequentei salões eclesiásticos, intelectuais e menos ainda políticos, mas principalmente na última década encontro muito tempo para passear no campo ou na cidade, para "perambular" pelos bosques, morros e campos, sem destino preciso, mas me enveredando por estradas e caminhos que surgem à minha frente e que escolho com liberdade.
Isso me permite os mais diversos encontros: idosos e jovens, gente que anda por aí, gente que trabalha, gente que não me conhece, assim como eu não os conheço. Eu escuto, falo pouco e procuro aprender. E o que aprendi neste ano de pandemia? Que as pessoas estão com medo e desorientadas.
Elas têm medo do contágio, receiam se encontrar e entrar em contato com outras pessoas. Elas têm medo da situação de pobreza em que acabaram se encontrando. Elas têm medo de que não seja mais possível voltar a viver livre desse pesadelo. O tempo presente, marcado a intervalos pelo enclausuramento e por outras medidas de contenção do contágio, marcado pela impossibilidade de encontros, viagens e relacionamentos, é sentido como um tempo inabitável, morto, situado entre um antes em que havia vida. E um amanhã em que talvez volte a ter novamente.
Mas hoje esses meses são como se tivessem sido tirados da vida, principalmente para quem é idoso e sente que seus últimos anos são preciosos. E assim o sentimento que mais aparece é o da desorientação: sim, falta de um oriente, de um horizonte. Não se consegue entender, e isso aumenta o medo, a sensação de impotência e também a raiva.
Desorientação devido à confusão sobre a dinâmica da pandemia; desorientação por parte dos políticos que, mesmo perante numerosas mortes todos os dias, continuam a mostrar-se arrogantes e irresponsáveis, sem vontade de perseguir o "bem comum", nem mesmo numa situação econômica e social tão dramática. As pessoas se sentem realmente desorientadas e falam isso com raiva, quase sonhando com uma insurreição que arraste esses empresários do nada e do desmantelamento da pólis.
Quantos homens e mulheres dizem, de forma mais ou menos explícita: "Não aguentamos mais!" É possível que esse grito não seja ouvido?
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Quem escuta o medo. Artigo de Enzo Bianchi - Instituto Humanitas Unisinos - IHU