02 Outubro 2020
Ela chegou antes de Greta ganhar as manchetes. Foi ela quem popularizou a famosa mochila transparente com uma planta em seu interior capaz de absorver carbono e produzir oxigênio para “respirar” graças a um tubo conectado a uma máscara de plástico.
A reportagem é de Raimondo Bultrini, publicada por La Repubblica, 01-10-2020. A tradução é de Luisa Rabolini.
“Prezada mídia. Parem de me chamar de "Greta da Índia!" Às vésperas de seu nono aniversário (2 de outubro), Licypriya Kangujam insiste em reivindicar sua condição de precursora do movimento internacional de crianças e adolescentes, que antes da famosa ativista sueca abalou as instituições dos adultos em questões ambientais.
Licypriya Kangujam, no TEDxGateway - 2020. (Foto: TEDxGateway | Flickr CC)
“Se vocês me chamam de Greta, não escrevem uma história – disse ela – mas apagam uma história”. Na verdade, o fenômeno Licypriya começou quando essa pequena estudante do ensino fundamental do estado de Manipur, no nordeste do país, tinha apenas 7 anos de idade. A "iluminá-la" sobre os perigos da mudança climática e da poluição com todos os riscos para o desenvolvimento das crianças foram os palestrantes em uma conferência da ONU de ministros do meio ambiente na Mongólia, para onde seu pai a levou no início de 2018. Antes de Greta subir no palco e que as duas meninas se encontrassem na cúpula sobre o clima em Madrid em dezembro passado, Lycypriya já havia "convertido" aos seus ideais um grupo de colegas e até crianças mais velhas quando lhes relatou com uma riqueza de detalhes alarmantes os discursos dos cientistas e conferencistas. Simplesmente o chamou de "Movimento das Crianças" e liderou uma pequena manifestação com slogans e cartazes escritos em caneta hidrográfica pelas ruas de Delhi, coberta por pesadas camadas de poluição que a tornam há anos uma das cidades mais poluídas do mundo.
Lycypriya ainda era muito jovem, 4 anos, quando em 2015 seu pai a levou consigo para distribuir ajuda humanitária após o terremoto no Nepal que matou mais de 9.000 pessoas, deixando 600.000 pobres desabrigados. O impacto emocional foi tal que a fez queimar todas as etapas do aprendizado das questões ambientais ao custo de sacrificar outros estudos. "Abandonei a escola – escreveu em um tweet viral – desde fevereiro de 2019 (antes do exame final da 1ª série), quando tinha apenas 7 anos de idade, por causa dos meus protestos todas as semanas em frente ao Parlamento indiano. Já sacrifiquei tanto da minha vida nesta tenra idade – acrescentou – que não continuo meu ativismo para me parecer com Greta Thunberg. Sim, ela é uma das nossas inspirações e uma grande influenciadora. Temos um objetivo comum, mas tenho a minha identidade, a minha história”, insistia.
Licypriya com Secretário Geral da ONU, António Guterres. (Foto: Wikimedia Commons)
Foi ela quem tornou popular dentro e fora de seu país a famosa mochila transparente com uma planta dentro capaz de absorver carbono e produzir oxigênio para "respirar" graças a um tubo conectado a uma máscara de plástico similar aquelas hoje difundidas para proteção contra a Covid. As imagens de Lycipryia nas ruas de Delhi com a invenção nas costas – sugerida por um médico seu admirador – circularam pelas mídias nacionais. Jornais, TV e redes sociais já a haviam tornado famosa ao noticiar em julho de 2018 seu protesto diante do Parlamento com um cartaz convidando o primeiro-ministro Narendra Modi e os deputados a "aprovar imediatamente a lei sobre as mudanças climáticas". Na mesma ocasião, ela pediu aos políticos que incluíssem matérias ambientais no currículo escolar, e foi graças a ela que o Rajasthan e o Gujarat, dois grandes estados, já lançaram um programa específico para o ensino fundamental e médio.
Licypriya Kangujam usando a mochila transparente com uma planta dentro capaz de absorver carbono e produzir oxigênio para "respirar" graças a um tubo conectado a uma máscara de plástico. (Foto: Reprodução Facebook, foto pública)
Em dezembro passado, Licypriya foi a Madri para a Conferência Mundial das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente, conhecida como COP25, onde conheceu Greta, de quem imediatamente se tornou amiga. Sua mãe participou da arrecadação para pagar sua passagem penhorando um colar de ouro, mas depois não foi preciso porque a pequena ativista indomável foi convidada oficialmente pelo governo espanhol. Também a fizeram proferir um discurso em que não poupou nenhum dos participantes. “Quando nasci – disse ela – os líderes mundiais já tinham se reunido 16 vezes e já sabiam dos efeitos negativos das mudanças climáticas. Eles ainda se reúnem aqui todos os anos e não fazem nada de concreto para o nosso futuro”.
Licypriya discursando no Fórum dos Parceiros da UNESCO 2019 (Bienal de Luanda) em Angola em 20 de setembro de 2019. (Foto: Wikimedia Commons)
Suas palavras e o tom contundente das acusações renderam-lhe vários elogios e o “Prêmio mundial das crianças pela paz”, além de um convite para participar da videoconferência junto com o Papa Francisco e outras personalidades mundiais no Dia da Terra celebrado este ano em Washington.
Mas antes de Madri ela já havia viajado por 21 países, obtido vários reconhecimentos e falado em dezenas de eventos, incluindo inúmeras palestras TED. Aos repórteres que foram procurá-la em vista de seu próximo aniversário na casa cheia de troféus, taças e medalhas recebidas em reconhecimento pelo seu ativismo, ela disse que suas faltas na escola não a farão desistir de um sonho que ela cultiva há algum tempo. Quer se tornar uma "cientista espacial" para salvar a terra dos seres humanos. "Eu irei à lua – disse ela – e procurarei formas de obter oxigênio, água potável para beber e como cultivar alimentos". De uma coisa Lycypriya se considera certa: "Nosso planeta está morrendo rapidamente".
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Fenômeno Licypriya, a menina indiana de 9 anos que desafia os poderosos sobre o clima - Instituto Humanitas Unisinos - IHU