22 Agosto 2020
“A crise climática e ecológica nunca foi tratada como uma crise. A distância entre o que temos que fazer e o que realmente está sendo feito cresce a cada minuto. De fato, a passividade política nos levou a perder mais dois anos”, escrevem Greta Thunberg, Luisa Neubauer, Anuna de Wever e Adélaïde Charlier, jovens ativistas na luta contra a mudança climática, em artigo publicado por El Diario, 20-08-2020. A tradução é do Cepat.
Nesta quinta-feira, 20 de agosto, completou-se o segundo aniversário da primeira greve estudantil contra a mudança climática. Em retrospecto, muitas coisas aconteceram. Milhões de pessoas foram às ruas para se unir a uma luta pelo clima e a justiça ambiental, que começou há décadas. E no dia 28 de novembro de 2019, o Parlamento Europeu declarou uma “emergência climática e ambiental”.
Apesar destes avanços, a verdade é que nestes dois anos o mundo emitiu mais de 80 gigatoneladas de CO2. Por todo o mundo, ocorreram contínuos desastres naturais: incêndios, ondas de calor, inundações, furacões, tormentas, desaparecimento do permafrost e colapso de geleiras e ecossistemas inteiros. Perderam-se muitas vidas e meios de subsistência. E isto é apenas o começo.
Na atualidade, os líderes de todo o mundo falam de uma “crise existencial”. A emergência climática é discutida em inumeráveis fóruns de debates e cúpulas. Chegam-se a compromissos, grandes discursos são pronunciados. No entanto, quando se trata de agir, ainda estamos em uma fase de negação. A crise climática e ecológica nunca foi tratada como uma crise. A distância entre o que temos que fazer e o que realmente está sendo feito cresce a cada minuto. De fato, a passividade política nos levou a perder mais dois anos.
No mês passado, justamente antes da cúpula do Conselho Europeu, publicamos uma carta aberta com pedidos concretos aos líderes da União Europeia e do resto do mundo. Desde então, mais de 125.000 pessoas assinaram esta carta.
A Europa tem a responsabilidade de agir. A União Europeia e o Reino Unido são responsáveis por 22% das emissões mundiais históricas acumuladas, um número só superado pelos Estados Unidos. É imoral que os países que menos fizeram para causar o problema sejam os primeiros a sofrer as piores consequências. A União Europeia deve agir agora, já que este é o compromisso que assumiu no Acordo de Paris.
Entre as nossas reivindicações, está a de frear todos os investimentos e subvenções ao setor dos combustíveis fósseis, bem como se desfazer dos mesmos, fazer do ecocídio um crime internacional, traçar políticas que protejam os trabalhadores e os mais vulneráveis, salvaguardar a democracia e estabelecer cotas de emissões de carbono anuais obrigatórias, com base na melhor informação científica disponível.
Entendemos que o mundo é complicado e que o que pedimos pode não ser fácil ou pode parecer pouco realista. Mas, na verdade, está ainda menos conectado com a realidade acreditar que nossas sociedades serão capazes de sobreviver ao aquecimento global para o qual nos dirigimos, bem como a outras consequências ecológicas desastrosas. Inevitavelmente, teremos que mudar de forma fundamental, de um jeito ou de outro. A pergunta é quem imporá as condições dessas mudanças: a natureza ou nós.
No Acordo de Paris, os líderes mundiais se comprometeram a manter o aumento da temperatura média mundial abaixo dos 2 graus e almejavam não ultrapassar 1,5 grau. Nossas reivindicações são uma constatação do que significa assumir este compromisso. No entanto, trata-se de um acordo mínimo, caso queiramos cumprir os compromissos assumidos.
Sendo assim, se os líderes não estão dispostos a atender nossas reivindicações, terão que começar a explicar por que estão virando as costas ao Acordo de Paris, às suas promessas e às pessoas que vivem nas regiões mais afetadas pela emergência climática. Terão que explicar por que estão virando as costas à possibilidade de oferecer um futuro seguro a seus filhos. Renunciam, sem nem mesmo tentar.
A ciência não diz a ninguém o que é preciso fazer, simplesmente reúne e apresenta informação verificada. Depende de nós analisar esta informação e tirar conclusões. Ao se ler o relatório SR1.5 do IPCC (Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas) e o relatório sobre a brecha das emissões do PNUMA (Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente), assim como o que os líderes assinaram no Acordo de Paris, nota-se que a crise climática e ecológica já não pode ser abordada a partir do marco atual. Até mesmo uma criança consegue perceber que as políticas não se encaixam com a evidência científica disponível.
Temos que colocar fim à atual destruição e exploração de nossos sistemas de suporte vital e avançar para uma economia livre de carbono, que esteja centrada no bem-estar de todas as pessoas, na promoção da democracia e na defesa do mundo natural.
Se desejamos ter a oportunidade de manter o aumento da temperatura abaixo de 1,5 grau, nossas emissões devem começar a diminuir rapidamente para zero e, em seguida, a números negativos. É uma realidade. E como não temos todas as soluções técnicas que necessitamos para isso, temos que trabalhar com o que está ao nosso alcance. E isto precisa incluir deixar de fazer certas coisas. Isto também é uma realidade. No entanto, é um fato que a maioria das pessoas se nega a aceitar. Só de pensar em estar em uma crise na qual não podemos comprar, construir ou encontrar uma maneira de contornar o problema cria algum tipo de curto-circuito mental coletivo.
Esta mistura de ignorância, negação e falta de consciência é a essência do problema. Diante desta realidade, podemos organizar muitas reuniões e conferências sobre a mudança climática, do modo que quisermos. Não conduzirão a uma mudança significativa, porque não se vislumbra a vontade de agir e a tomada de consciência coletiva necessária. O futuro ainda está em nossas mãos, mas o tempo se desliza com rapidez e escapa delas. Ainda podemos evitar as piores consequências, mas para fazer isso precisamos enfrentar a emergência climática e mudar nossa forma de agir. E essa é a incômoda verdade da qual não podemos fugir.
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Há dois anos, começamos as greves estudantis pelo clima, mas o mundo segue em seu negacionismo - Instituto Humanitas Unisinos - IHU