23 Mai 2019
Em ato durante a AgroBrasília, produtores rurais e representantes de 76 entidades do setor se vestiram de verde e amarelo para defender reformas da Previdência e tributária e pacote anticrime de Moro e “cobrar” lealdade dos parlamentares a projeto do governo.
A reportagem é de Ciro Barros, publicada por Agência Pública, 22-05-2019.
A senadora Soraya Thronicke (PSL-MS) foi direto ao ponto: “Eu peço pra vocês o apoio, principalmente sobre governabilidade. Eu tenho dado minha cara a tapa, às vezes eu falo mais do que eu deveria”, disse à plateia composta principalmente por representantes de entidades de classe do agronegócio. “Vocês têm que cobrar dia e noite”, reforçou.
O apelo da senadora do partido do governo para que o agronegócio pressione os parlamentares da bancada ruralista a trabalhar pela aprovação das reformas e do pacote anticrime do ministro Sergio Moro foi feito na cerimônia de lançamento do Movimento Brasil Verde Amarelo. Composto por 76 associações de produtores rurais de todas as regiões do país, o movimento foi anunciado na AgroBrasília – uma das maiores feiras agropecuárias do país. Entre os apoiadores estavam a Aprosoja (com diversas representações regionais), que reúne os maiores produtores de soja, diversos sindicatos patronais rurais e organizações como a Andaterra, Associação Nacional em Defesa dos Pecuaristas, Agricultores e Produtores Rurais, que “defende os interesses de classe perante três esferas do poder (legislativo, executivo e judiciário)”, segundo o site da entidade.
O movimento foi lançado no dia seguinte às manifestações pela educação, mas já estava sendo articulado por representantes dessas entidades em grupos de WhatsApp desde março. Em 25 de abril, a Andaterra, uma das coordenadoras do movimento, já divulgava em seu site o modelo de camiseta que os produtores deviam usar durante o ato.
Lideranças de 76 associações do agronegócio lançaram no último dia 16 de maio o Movimento Brasil Verde e Amarelo. (Foto: Divulgação/AgroBrasília)
Os representantes do agronegócio saíram na frente em defesa do governo por eles eleito, como lembraram diversos discursos na cerimônia de lançamento, à qual a Pública compareceu. No dia seguinte ao ato na AgroBrasília, o presidente Bolsonaro divulgaria um texto em grupos de WhatsApp em que se dizia impedido de governar por “corporações” que dominariam o país e o Parlamento. O texto atiçou a militância contra o Congresso e o STF – também citado – convocada pelo presidente para uma manifestação no próximo domingo, à qual as entidades se organizam para comparecer e dar apoio em suas regiões de influência. Além de mobilizações de rua, estão previstas manifestações em futuras feiras agropecuárias e eventos do setor, além do lançamento de um site que visa monitorar o posicionamento dos integrantes da Frente Parlamentar Agropecuária (FPA) em relação às reformas e ao pacote anticrime.
Os representantes do agronegócio já estavam preocupados há meses com a dificuldade de aprovar pautas do governo no Congresso. Uma situação que só se agravou, com o Legislativo emitindo sinais de independência. Nesta semana pode ser votado um projeto de reforma tributária próprio – já criticado por Guedes. Um texto de reforma da Previdência diferente da proposta do governo também está sendo cogitado, como anunciou na última sexta-feira o líder da Comissão Especial da Previdência, deputado Marcelo Ramos (PR-AM), que declarou que o país já vive um “semiparlamentarismo”.
“O nosso papel como produtores, como lideranças, é justamente deflagrar, dar início a um grande movimento nacional que tem hora e tem dia pra começar, que é agora, mas não tem hora pra acabar. Nós só vamos nos desmobilizar quando a última das três reformas quedar-se aprovada pelo Parlamento, sancionada pelo Executivo”, disse um dos articuladores do Movimento Verde Amarelo, Jeferson Rocha, da Andaterra, durante o ato.
A senadora do PSL, presidente da Comissão de Agricultura do Senado, apelou aos empresários para que se manifestassem junto aos partidos que apoiaram Bolsonaro na campanha e que não estão comprometidos com o governo, citando diretamente o DEM, legenda que abriga boa parte dos ruralistas. “Temos o PSL inteiro, temos o partido Novo dando apoio incondicional para a reforma [da Previdência], aí nós temos o DEM, que é da base do governo, tem três ministérios. Nós demos total apoio para eleger Rodrigo Maia e Davi Alcolumbre [para a presidência da Câmara e do Senado, respectivamente]. E o DEM votando contra [a reforma da Previdência], um ou outro parlamentar a favor. Cadê a articulação desse partido?”, questionou Soraya Thronicke.
"Deveríamos ter elegido mais candidatos do PSL, que estão com o governo incondicionalmente. Ajudamos a eleger pessoas de outros partidos e coligações, que se utilizaram da imagem do presidente Bolsonaro na hora que era interessante. Cadê esses parlamentares? Vocês estão aqui do Brasil inteiro, em cada estado vocês sabem quem se utilizou da imagem do Bolsonaro. Essa conta tem que ser feita e essa pessoa tem que ser cobrada. Isso é estelionato eleitoral. É mentir”, acusou a senadora.
O superintendente da Associação Brasileira dos Exportadores de Gado (Abeg), Gil Reis, lembrou a plateia de sua força política para chamar os produtores à ação. “Nós precisamos dar sustentação ao homem que nós elegemos. Se não houver reforma, os que têm dinheiro vão mudar daqui. Os que têm conhecimento vão para outro país, onde ganham melhor. Vão ficar os produtores sofrendo aqui. Alguns governantes aqui nós tiramos do poder. O processo é muito simples: um santinho com o nome do político escrito “inimigo do agro” e sai distribuindo. Fizemos isso em vários lugares. Será possível que vocês não entenderam que vocês têm o poder na mão? Pelo amor de Deus, vão às bases. Pegue o deputado que está votando contra a reforma e comece uma campanha contra ele nas bases.”
Apesar do peso econômico e político do setor, os convidados do governo não vieram – os ministros Moro e Guedes mandaram representantes e o secretário da Previdência, Rogério Marinho, que havia confirmado presença, não compareceu. Outros parlamentares foram chamados, mas, além da senadora Soraya, só havia o deputado Giovani Cherini, do Rio Grande do Sul.
Expulso do PDT por apoiar o impeachment de Dilma, hoje ele está em um dos partidos do Centrão, o PR. Estranhando a ausência dos colegas parlamentares, seu discurso foi na contramão dos demais ao atribuir ao governo a dificuldade de se articular com o Congresso: “Vieram dois, né? Porque ninguém quer se comprometer”. “Há poucos dias um ministro me disse assim: ‘Deputado, tu que é coordenador da bancada gaúcha, temos que aprovar a reforma da Previdência’. Eu falei: ‘Eu voto. Fui da CCJ [Comissão de Constituição e Justiça], votei a favor. Voto a favor agora na Comissão Especial, que eu sou membro. Só que esse discurso de vocês, dos técnicos, é um discurso lindo pra quem não entende de política’. Eu perguntei: ‘O senhor tem filhos?’. E ele disse: ‘Tenho’. E eu perguntei: ‘O que o senhor fazia pros seus filhos dormirem?’. Ele disse: ‘Eu cantava no ouvido deles’. E eu falei: ‘O governo tem que aprender a cantar no ouvido das pessoas’. Todo presidente da República precisa dialogar com o Parlamento. ‘Toma lá, dá cá’ é a coisa mais certa que existe na política no Brasil e no mundo, mas não o ‘toma lá, dá cá’ da corrupção”, disse. “Eu fiz 153 mil votos. Eu tenho que dar resposta para a minha Soledade, para a minha Não-Me-Toque, para São Borja, que eu fiz 6 mil votos, eu me elegi pra isso”, disse referindo-se a municípios do Rio Grande do Sul.
A mensagem de Cherini não agradou aos produtores ouvidos pela Pública. “Nós ouvimos aqui um parlamentar dizer que a grande solução é na base do toma lá, dá cá. Isso me deixou até um pouco constrangido em falar alguma coisa. Temos que nos mobilizar e cobrar que nossos representantes deem um pouco de si também, como nós estamos fazendo aqui, estamos deixando nossos afazeres e deslocando essa distância para dar um apoio às mobilizações”, afirmou Cícero José Teixeira, presidente do Sindicato de Produtores Rurais de Luís Eduardo Magalhães (BA).
Movimento do agronegócio promete mobilização permanente para pressionar o Congresso pela reforma da previdência, tributária e o pacote anticrime do ministro Sérgio Moro. (Foto: Divulgação/AgroBrasília)
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“Nós precisamos dar sustentação ao homem que elegemos” - Instituto Humanitas Unisinos - IHU