08 Março 2018
O Papa Francisco abriu caminho para o arcebispo salvadorenho Oscar Romero, que foi assassinado, tornar-se santo ainda este ano ou no início do próximo. O Vaticano anunciou no dia 7 de março que o pontífice aprovou a declaração de atribuição de um milagre com a intercessão do religioso falecido.
A reportagem é de Joshua J. McElwee, publicada por National Catholic Reporter, 07-03-2018. A tradução é de Luísa Flores Somavilla.
A ação, que era aguardada nos últimos meses, representa a culminação de uma das reviravoltas mais claras dos quase cinco anos de papado de Francisco. O caso de Romero, baleado ao celebrar uma missa em 1980, ficou parado por décadas nos papados de João Paulo II e Bento XVI.
Mas menos de dois anos após sua eleição para pontífice, Francisco colocou Romero no caminho da canonização com firmeza, decretando formalmente que o arcebispo foi assassinado como mártir da fé católica em fevereiro de 2015. Em seguida, autorizou sua beatificação, a última etapa antes da canonização, em maio do mesmo ano.
Agora, Francisco decretou que Romero contribuiu com a cura de Cecilia Maribel Flores, que estava enfrentando a morte iminente no final de uma gravidez difícil antes de rezar pela intercessão do falecido arcebispo.
Francisco também aprovou um milagre do papa Paulo VI, abrindo o caminho para a canonização do pontífice que conduziu as reformas do Concílio Vaticano II, criou o sistema do Sínodo dos Bispos e também confirmou a proibição da Igreja do controle de natalidade em sua encíclica de 1968, Humanae Vitae.
O anúncio das canonizações de Romero e Paulo VI são uma questão de formalidade: o Papa precisa apenas convocar um consistório, ou reunião, dos cardeais, em Roma, para definir uma data para a cerimônia ou as cerimônias.
Boatos recentes sugeriam que Francisco estava pensando em realizar uma cerimônia de canonização conjunta: realizada em outubro, em Roma, durante a próxima reunião do Sínodo dos Bispos sobre os jovens.
Romero tornou-se arcebispo de San Salvador em fevereiro de 1977, quando seu país estava em crise devido a eleições presidenciais marcadas pela intimidação por parte de forças paramilitares patrocinadas pelo governo.
Como a situação piorou nos anos seguintes, o prelado tornou-se cada vez mais ativo em suas denúncias dos assassinatos e raptos cometidos pelo governo, que culminariam em 12 anos de guerra civil sangrenta em El Salvador.
Em pontos em que João Paulo e Bento XVI haviam expressado preocupação com denúncias de Romero, temendo a influência da teologia da libertação em seus escritos e homilias, Francisco, natural da Argentina, elogia seu modelo de bispo que cuida do seu povo.
Em uma carta lida em voz alta na cerimônia de beatificação de Romero, em 2015, o Papa disse que o prelado "sabia conduzir, defender e proteger seu rebanho".
O arcebispo italiano Vincenzo Paglia, postulador ou promotor oficial da causa de Romero, considerou o arcebispo "um mártir da Igreja do Concílio Vaticano II". Em uma palestra de fevereiro de 2015, ele declarou que Romero "escolheu viver com os pobres para defendê-los da opressão".
Teólogos e especialistas que conheceram Romero ou estudaram profundamente sua vida disseram que, ao agilizar a canonização do prelado, Francisco está propondo um modelo de bispado.
Julian Filochowski, presidente da organização inglesa Archbishop Romero Trust, disse que o Papa está criando um ícone que pode ser uma referência para outros bispos para determinar como conduzir o ministério.
"Criar um ícone é torná-lo uma referência", disse Filochowski, que conheceu Romero e o ajudou a chamar a atenção global para a situação em El Salvador quando o prelado era vivo. "É alguém que desperta afeição, admiração, orgulho, é alguém que as pessoas querem seguir".
"Ele praticava o que pregava", disse o diretor da organização sobre Romero. "Isso é algo muito difícil de encontrar nos bispos hoje. Romero é um ícone nesse ponto."
O padre jesuíta Martin Maier, um teólogo da libertação que morou em El Salvador nos anos 80 e agora trabalha no Centro Social Jesuíta Europeu em Bruxelas, disse que Romero era, enquanto bispo, um modelo do estilo de Francisco.
"Ele é um bispo que vai para as periferias, que estende a mão aos pobres e marginalizados", disse Maier, Secretário de Assuntos Europeus no centro. "Era um bispo que deu a vida por seu povo."
Antes de se tornar arcebispo, Romero foi Secretário da Conferência Episcopal de El Salvador, como bispo auxiliar de San Salvador e bispo de Santiago de María, uma pequena diocese a leste da capital.
Ele tomou posse como arcebispo em 23 de fevereiro de 1977, três dias depois da controversa eleição do general Carlos Humberto Romero para presidente. No dia 28 de fevereiro, manifestantes que protestavam contra o presidente eleito no centro de San Salvador foram alvejados pelas forças de segurança, levando à morte de centenas de pessoas.
Em 12 de março, o padre jesuíta Rutilio Grande, que Romero conhecia por cerca de uma década, foi assassinado. Grande, dois leigos e três filhos mais novos estavam viajando de carro quando grupos de homens rodearam o veículo e atiraram, matando o padre, Manuel Solorzano, e Nelson Lemusas, que tentava proteger as crianças.
Quando ficou sabendo, Romero saiu de San Salvador e foi até a área rural onde o assassinato havia ocorrido. Ele depois falou ao provincial jesuíta de Grande, o padre Cesar Jerez, que ao olhar para o padre morto ele pensou: "se eles o mataram pelo que ele fez, eu também devo trilhar o mesmo caminho".
Jaime Alfredo Miranda, atual vice-ministro das relações exteriores de El Salvador, disse numa conferência em Roma, em fevereiro, ao avaliar o testemunho de Grande, que a morte do padre foi um "fator determinante" na vida de Romero.
Jaime Miranda, criado na mesma região do país que Grande, disse que conhecia o padre "bastante bem" e observou após a morte do jesuíta Romero decidiu deixar de participar de atos "para protestar contra a barbárie" dos assassinatos.
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Francisco abre caminho para Romero ser canonizado ainda este ano - Instituto Humanitas Unisinos - IHU