24 Outubro 2017
"Por isso, convém ter presente que ao ato de “pedir, buscar e bater” em relação a Deus, corresponde uma atitude semelhante em relação às pessoas com quem vivemos e nos relacionamos. Correspondência infinitamente inferior, sem dúvida, mas que indica o horizonte a ser perseguido. Na base dos três verbos, o ser humano se reconhece como criatura diante da grandeza infinita do Criador. Reconhece, além disso, o dom da vida como o maior tesouro a ser cultivado!", escreve Alfredo J. Gonçalves, padre carlista, assessor das Pastorais Sociais.
“Pedi e vos será dado, buscai e encontrareis, batei e vos será aberto” (Mt 7,7). Três verbos que resumem uma forma de oração ou meditação: pedir, buscar e bater. Mas também exigem uma relação íntima e dinâmica com o Deus e Pai de Jesus Cristo. Um persistência diária de encontros e reencontros. Façamos um percurso de caráter espiritual, invertendo o sentido dos verbos.
Bater! Não importa o quanto nos sentimos distantes da Casa de Deus, não importa a sensação de vergonha pela longa ausência, não importa o medo oculto de uma possível punição... Não importam nossas quedas e fraquezas, nossas debilidades e pequenas formas de infidelidade... Não importam nem mesmo nossos erros, desvios e pecados... O Pai nunca fecha a porta ao filho que bate, nunca vira as costas a quem o invoca. Se o pode fazer às vezes o pai terreno, jamais o fará o Senhor do céu e da terra. Prova disso encontramos na surpreendente parábola do filho pródigo. Também chamada parábola dos dois filhos e, melhor ainda, parábola do Pai misericordioso (Lc 15, 11-32). Antes mesmo que o filho se aproxime e, contrito, tente esclarecer as coisas, o pai já tomou a iniciativa de correr ao seu encontro. Abraça-o, faz-lhe uma festa porque “estava morto e voltou à vida”. Perdão e misericórdia significam uma nova oportunidade para retomar o caminho. Vale o mesmo, porém, para os que batem à nossa porta: sabemos acolhê-los e hospedá-los no círculo de nossa amizade, de nossa família ou comunidade?
Buscar! Do berço ao túmulo, o ser humano se caracteriza pela busca irriquieta. Jamais se cansa de procurar por algo ou alguém. Mas, o que buscamos? Que espécie de coisas acumulamos em nossas simbólicas gavetas? Dinheiro, riqueza, poder, honra, glória, fama, influência, títulos, conhecimento... “Vaidade das vaidades”, diz Coélet, “vaidade das vaidades, tudo é vaidade” (Ecl 1,1)! Os bens materiais que, com suor e fadiga, procuramos conquistar, ganhar ou tomar são os mesmos que abandonamos ao partir. As riquezas deixam órfãos e deserdados os que partem. Aquilo que preenche o vazio de nossa existência são as relações que cultivamos. Aliás, passam a ser o nosso verdadeiro e único tesouro. Relações com Deus, relações com os demais, relações com a beleza da criação. Intimidade e abertura, silêncio e escuta, diálogo e transparência; prodigalidade no dar e receber. Buscar a Deus, passando pelo próximo; buscar o próximo, passando pela Casa de Deus. Eis o que realiza e torna feliz a alma humana. De outro lado, porém, que fazemos com quem bate à porta de nosso coração e de nossa casa?
Pedir! Volta a vergonha, volta o receio de uma recusa, volta o sentimento de que somos indignos de sua atenção. Como se o amor e a bondade de Deus se orientasse pelos nossos méritos! Não, o oceano de sua misericórdia encontra-se muito acima do que fazemos ou deixamos de fazer, do mal ou bem que praticamos. Então, por que fazer o bem? Porque só ele nos torna felizes, devolve a paz ao coração aflito e atormentado. Só ele está em sintonia com o projeto de Deus, impresso em nossas fibras mais íntimas. O Pai ama não porque fazemos isso ou aquilo, mas porque somos filhos e filhas. Seu amor é incondicional, vem antes de que possamos julgar se o merecemos ou não. “Deus demonstrou seu amor para conosco porque Cristo morreu por nós quando éramos ainda pecadores” (Rm 5, 8). Pedir requer humildade, tal como bater e buscar. Humildade para reconhecer a própria pequenez, para revelar a própria nudez. Mas a nudez, quando revestida pelo olhar de quem ama, em lugar de nos deixar expostos à curiosidade alheia, expressa em toda a sua plenitudade a dignidade da pessoa humana. Que dizemos a quem nos pede algo?
Por isso, convém ter presente que ao ato de “pedir, buscar e bater” em relação a Deus, corresponde uma atitude semelhante em relação às pessoas com quem vivemos e nos relacionamos. Correspondência infinitamente inferior, sem dúvida, mas que indica o horizonte a ser perseguido. Na base dos três verbos, o ser humano se reconhece como criatura diante da grandeza infinita do Criador. Reconhece, além disso, o dom da vida como o maior tesouro a ser cultivado!
FECHAR
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
Oração em três verbos - Instituto Humanitas Unisinos - IHU